Termas da Galiza inspiram modelo para as Caldas da Rainha

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|O hotel, Palácio da Água e Fonte da Gandara, no Baleneário de Montariz

Uma comitiva caldense esteve, nos dias 28 e 29 de Novembro, nas termas de Ourense e Mondariz, na Galiza, numa visita foi organizada pela Assembleia Municipal com o  objectivo conhecer dois bons exemplos de aproveitamento termal, que poderão inspirar a realidade caldense.
O exemplo de Ourense poderá ser aproveitado pela autarquia para o Hospital Termal, em que é assegurada a utilização pública, e em alguns casos gratuita, das termas. Já para os Pavilhões do Parque e antigo casino, o autarca admite uma solução semelhante à adoptada em Mondariz, cuja estância termal é gerida por privados.

Entre o verde dos montes e vales da Galiza e seguindo o Rio Minho é possível encontrar Ourense, a cidade a que os romanos, há quase dois mil anos, apelidaram de águas de ouro. A sua história está intimamente ligada ao termalismo e quem se dirige a esta cidade pode usufruir de um banho quente ao ar livre ou frequentar uma das várias estâncias termais que existem próximas do centro e de onde brota água a temperaturas superiores a 60º centigrados.
As termas públicas da cidade, apelidadas de burgas, situam-se no centro histórico e são utilizadas diariamente por 70 a 80 pessoas. A fonte mais popular é a Burga de Baixo, símbolo da cidade e de onde, referem os locais, brotam 300 litros por minuto.
Perto delas, um espaço museológico dá conta da história da cidade e da sua estreita ligação às águas minero-medicinais, através de documentos, objectos e vestígios relacionados com o tema.
As águas termais adquirem as suas propriedades minerais em contacto com o substrato granítico do subsolo e chegam à superfície através de inúmeras nascentes. As termas nas margens do rio Minho são, as Fontes do Tinteiro e de Reza, as de O Muíno e as de Outariz e Burgas de Canedo, todas elas gratuitas. Junto existem também as estâncias termais de Outariz e da Chavasqueira, ambas de inspiração japonesa, que são pagas e que além das piscinas naturais, possuem tratamentos de relaxamento, massagem e estética, assim como zonas de restauração e de cafetaria. Aqui se pode, fazer sauna termal, choque térmico, jacuzzi, tratamentos com algas, chocolatoterapia, sauna zen, etc.
As indicações terapêuticas destas águas respeitam a doenças do foro hepático, digestivo dermatológico, reumatismal e respiratório.
A autarquia local tem feito uma grande aposta no termalismo para promover a cidade a nível turístico, associando-o também à cultura, gastronomia e comércio. Os próprios cidadãos fazem uso delas e recomendam-nas aos turistas.
Durante a visita a Ourense, a comitiva caldense foi recebida pelo alcaide Agustín Fernandez, que se referiu à sua cidade como a “capital termal da Galiza”. Das nascentes ali existentes jorram, “no mínimo, três milhões de litros de água minero-medicinal por dia”, o que faz dela a segunda cidade em riqueza termal da Europa, depois de Budapeste.
O autarca destacou ainda que as águas termais são uma “mina inesgotável”, ao contrário das minas de ouro ou volfrâmio e que pretendem continuar a apostar nelas, estando prevista a criação de um grande balneário termal no antigo alcácere, há muito tempo encerrado e em ruínas. Agustín Fernandez esteve também recentemente em Turim (Itália) numa reunião para a criação de uma rede de cidades termais romanas. “Creio que é um foco de riqueza e de criação de emprego”, disse, oferecendo e, simultaneamente, pedindo a ajuda dos caldenses para a concretização do projeto termal.
Nita Torres, responsável pelas termas do município de Ourense, disse à Gazeta das Caldas que as termas pagas recebem anualmente cerca de 100 mil pessoas e estima que esse número triplique nas públicas.
De acordo com a responsável, o facto de também pertencerem à Rede Europeia de Cidades Termais ajudou bastante na promoção, mas também suscitou muita curiosidade por parte dos outros membros, que quiseram conhecer “o modelo que atinge todas as camadas da população”. Nita Torres destaca ainda que se trata de um modelo muito “sustentável ambientalmente, com um respeito absoluto pelos recursos e que não está associado à doença, mas à prevenção e à qualidade de vida”.
Na sua opinião estar nesta rede é importante para partilhar conhecimento e ver o que se faz nos outros locais em termos de boas práticas. Ourense apadrinha a candidatura caldense e Nita Torres considera que esta “cumpre” todos os requisitos. Para breve está prevista uma visita às Caldas por parte de representantes desta cidade da Galiza e de representantes da Rede Europeia e do Instituto Europeu dos Itinerários Culturais, no âmbito do Conselho da Europa.

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|As termas de Outariz, junto ao Rio Minho

Mondariz visitado anualmente por 20 mil aquistas

A pouco mais de 70 quilómetros de Ourense fica localizado o Balneário de Mondariz, numa região coberta de vegetação. Situado numa região balneária por excelência, o balneário foi inaugurado em 1873 e, uma década depois já dispunha de 60 habitações, piscina e espaços de lazer.
Em Mondariz os minerais predominantes são o gás carbónico, bicarbonato, cálcio, sódio e ferro, que conferem características únicas aquelas águas, para o alívio de problemas digestivos, respiratórios, de reumatismo e diabetes. Já mais recentemente, os benefícios das águas são utilizados em tratamentos de beleza, emagrecimento e anti-tabaco.
A grande afluência de aquistas levou à construção do grande hotel, que viria a ser destruído por um incêndio em 1973. Nas duas décadas seguintes a actividade balneária esteve reduzida a uma antiga casa de banhos, até que o novo hotel foi recuperado em 1994 e, cinco anos depois, reabilitado o palácio de granito que funcionou inicialmente como sanatório.

A este complexo juntou-se também o edifício denominado Palácio da Água, que integra um spa, e a criação de um hotel, um centro de congressos, ginásios, um campo de golfe de 18 buracos e jardins, estes últimos abertos à população local. Com uma oferta de 195 habitações nos três edifícios, o complexo dá trabalho a 125 famílias.
De acordo com a médica Laura San Miguel no balneário trabalha uma equipa multidisciplinar, formada por médicos, fisioterapeutas, recuperadores físicos e auxiliares termais. Existe uma parte tradicional de balneário com programas termais, nomeadamente reumatológicos, respiratórios, anti-stress, a que se junta a vertente lúdica de ginásio e a desportiva.
Pelo spa, que em Abril assinala uma década, passam anualmente 60 mil pessoas, algumas delas residentes em Ourense ou na Galiza e outras estrangeiras.
Actualmente a estância, gerida na totalidade por privados, recebe cerca de 20 mil aquistas. No entanto, há 25 anos, quando quiseram recuperar o património ninguém se predispôs a ajudar pois não acreditavam no projeto termal. “Fomos os pioneiros da recuperação do termalismo do século XXI”, disse a directora de comunicação da estância, Amália Gallego, acrescentando que este é um caso único no mundo, em que um ayuntamento [Câmara] nasceu pela importância do balneário, criando-se o Mondariz Balneário, junto a Mondariz.
“Nós vivemos dos nossos clientes directos, das pessoas que se alojam no hotel, utilizam os serviços do balneário, golfe, mas também das pessoas que vêm fazer as suas refeições no restaurante”, explicou a responsável.
Apesar das várias vertentes que já abrange este ainda é um projeto inacabado. De acordo com Amália Gallego estão a apostar numa linha de cosméticos, a recuperar edifícios que irão albergar a fundação e prevêem construir um Museu da Água.

Ver como o termalismo se desenvolveu noutras terras

Após conhecer os dois exemplos na Galiza, o presidente da Câmara, Tinta Ferreira, disse que nas Caldas gostaria de ver implementado partes dos dois modelos. O exemplo de Ourense poderá ser aproveitado pela autarquia para o Hospital Termal, em que é assegurada a utilização pública, e em alguns casos gratuita, das termas.
O autarca defende para aquele equipamento uma intervenção mais assistencialista e o seu funcionamento como hospital, no sentido em que há uma prescrição clínica e acompanhamento médico no uso da água. “Se o conseguirmos através de uma instituição particular de solidariedade social será perfeito, até porque essa instituição tem como obrigação os tratamentos a um preço mais acessível”, disse, acrescentando que se não o conseguirem terá que ser o município a assumir essa responsabilidade, socorrendo-se de clínicos com competência nesta área.
O autarca referiu também na altura que ainda não foi oficializada a cedência do património termal, pelo que considera “prematuro” avançar com as negociações, mas acredita que será possível conseguirem uma instituição interessada na gestão do hospital.
Já no que respeita aos pavilhões do parque e ex-casino/Casa da Cultura, Tinta Ferreira vê com bons olhos a sua requalificação por parte de privados e a sua transformação em algo “muito parecido com o que vimos em Mondariz”. Na sua opinião ali poderia ser construído um hotel, com ligação às termas, e um spa, no entanto deixa a definição do projeto para quem o for gerir.
Um dos estudos prévios encomendados pela autarquia apontava para a possibilidade de fazer nos pavilhões desenhados por Rodrigo Berquó um hotel com 150 quartos e 30 apartamentos. De acordo com o autarca esta requalificação implicará um investimento na casa dos 25 milhões de euros, pelo que estão a tentar encontrar investidores.
Mas porque não se afigura fácil encontrar alguém com disponibilidade imediata para este aproveitamento dos edifícios, a Câmara já encomendou um estudo para avaliar o investimento que é necessário fazer para segurar os pavilhões de pé.
Tinta Ferreira disse ainda que Ourense faz parte da Rede Europeia das Cidades Termais e que era importante cimentar essa relação. “Ao mesmo tempo as pessoas que acompanharam a visita tiveram a possibilidade de ver um contexto diferente, em que a intervenção pública é mais evidente”, concluiu.
O presidente da Assembleia Municipal, Luís Ribeiro, destacou a importância de conhecer realidades diferentes, que funcionam bem. “Não se trata de ir ver para copiar mas ver os modelos usados, quer em Orense quer em Mondariz, para ter alguma noção e ideias para o futuro das nossas termas”, salientou.
Referindo-se a Mondariz, o autarca revelou que quando estavam a olhar para a recuperação daqueles edifícios históricos, podiam imaginar como recuperar também os pavilhões caldenses.
“A visita de estudo foi um sucesso, foi muito positivo verificar como outras terras, com outros estilos e formas de ver o termalismo se desenvolveram”, disse, acrescentando que as Caldas tem um potencial igual ou mesmo maior, pois está perto de uma capital (Lisboa) e tem para oferecer um conjunto de actividades que as termas galegas não têm.
Luís Ribeiro chama a atenção para a necessidade do hospital termal continuar a proporcionar tratamentos termais, mas também com as suas águas associadas a outras utilizações, como o desenvolvimento de produtos de cosmética, tal como acontece em Mondariz.
Preferencialmente o autarca gostaria que a gestão do termal fosse feita por uma IPSS mas se tiver que ser a Câmara não vê “nenhum problema”. Importante, na sua opinião, é que este reabra o mais rapidamente possível.
Já para os pavilhões do parque defende que seja uma entidade privada a garantir a sua gestão e, de preferência, com um projeto integrado com o restante património.

Testemunhos

Pacheco“As termas são uma mais-valia, um activo que as Caldas tem”

comitiva
|A comitiva de cerca de 30 caldenses que visitou as termas galegas

Ana Maria Pacheco
Presidente da AIRO
“Acho que foi uma visita bastante positiva porque as termas são uma mais-valia, um activo que as Caldas tem e que há muitos anos não tem sido desenvolvido como deve de ser.
Julgo que o que vimos nomeadamente em Mondariz parece ser bastante mais o nosso modelo.
Conheço algumas termas como Bath ou Baden Baden, e tenho feito termas, e acho que temos que apoiar o nosso governo local. Temos umas águas com umas capacidades medicinais fantásticas, um património histórico e termal lindo, pode-se fazer uma conjugação muito interessante.
Seria uma forma de desenvolvimento para toda a região, especialmente se as pessoas souberem ver as coisas de maneira integrada. Existe um polo de desporto muito activo, mas ainda não suficientemente divulgado, em Rio Maior, mais a oferta desportiva, nomeadamente equestre, nas Caldas da Rainha, Óbidos e Alcobaça, aliado ao facto de estarmos perto da capital e do aeroporto ainda aumenta mais esse potencial”

Narzilia “Uma visita muito proveitosa”
Narzília Félix
Médica hidrologista no Hospital Termal
“Achei a visita muito proveitosa, contactei com realidades que não conhecia até aqui, totalmente diferentes na maneira de abordar o termalismo. Acho que em perspectivas do que se pode, ou não, fazer a visita foi muito útil.
Julgo que o exemplo de Mondariz poderá ser o mais parecido com as Caldas, quer em termos de património, quer de história. Embora sejam realidades, países e culturas diferentes agradou-me o que vi.
Este tipo de visitas são importantes, para mim, que trabalho no Hospital Termal desde 1987, valeu a pena”.