A galinha da vizinha…

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Gazeta das Caldas

Entre Óbidos e Caldas da Rainha se desenham muitos dos nossos passos. Hoje trago pedaços de poemas onde se escrevem pedaços de ambas.

De João Miguel Fernandes Jorge, Termo de Óbidos.

O Café Central
Voltei ao café onde me levavam
quando rapaz. E onde entrei algumas vezes quando
ia às Caldas. Na parede
o unicórnio, o cavalo alado, um terceiro espécime mais pequeno
que certa aura ilumina
bailado em ouro de gentileza
sobre azul que fora turquesa e o restauro tornou azul
ganga a sala abre sobre
a praça. (…)
(aqui fica em jeito de homenagem a Júlio Pomar).

Um passo dentro da Vila
Nenhum dos vivos escapará à pedra de toque que
é a morte. Mas primeiro passou pelo limite do deserto – a dor e as areias crescem ao seu redor. Por entre as casas da aldeia
jamais são portadoras de um acaso feliz
sobem a rua direita de grande laje
da porta da muralha à igreja mais cimeira. Em Óbidos
ouve-se melhor o de profundis, há um registo daquilo que se perdeu. (…).

Junto à Misericórdia de Óbidos
Porta, janelas fechadas. Vem nos postais: rua típica com
casa e alpendre florido. Vivia nessa casa um amigo do meu
pai. Também o estimava e no agosto das férias visitava-o,
ele sabia que não era por sua causa
a minha presença quase diária.
(…)
Quando vou a caminho dos correios, quando desço de uma
visita às cenas da paixão que Reinoso pintou para a
Misericórdia
por detrás dos vidros, nos bancos de pedra, eles estão face a
face, embaciado espelho de espelho namoradeiro, emoldu
rada, íntima sensualidade.

Cristina Rodrigues
gouvarinho@hotmail.com