Mobilidade

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Conceição Henriques

Certos assuntos entram na ordem do dia mediático em função da tepidez das notícias do momento, ou seja, quando não há assunto que exalte os ânimos, vai-se à gaveta das matérias que causam indignação, sacode-se-lhe a poeira acumulada durante semanas ou meses (às vezes anos) e lá salta o assunto para as primeiras páginas da nossa indignação.
É este o caso da infame linha do Oeste, que, fora de períodos de campanha eleitoral, sobretudo autárquica – momento em que conta com a apoio estrepitoso e incondicional de todas as forças políticas eleitas ou a almejar eleição, e dos momentos em que falta questão mais polémica, não merece das forças vivas da região, salvo algumas honrosas excepções entre as quais se conta a Gazeta das Caldas, mais do que umas tiradas momentâneas e sempre inconsequentes.
Penso que ninguém terá dúvidas de que o absoluto desprezo a que foram votados os caminhos de ferro em Portugal, e a linha do Oeste em particular, não decorre apenas de mero desleixo ou incúria por incompetência de gestão da CP e da correspondente tutela, mas também – talvez sobretudo – por decisões políticas erradas sobre mobilidade interurbana, centradas na construção de estradas, que gerou o ambiente propício a que as operadoras rodoviárias, contando com a infraestrutura paga pelo erário público (ancorado em fundos comunitários) e com aquisição de veículos usados a baixo preço, tenham singrado num ambiente sem concorrência, tudo isto, diga-se, perante a total inércia das populações e das autoridades locais.
É, assim, sem surpresa que vemos agora noticiado que a tão propalada modernização da linha do Oeste se encontra com dois anos de atraso e sem projecção fidedigna de data de início, situação comodamente enquadrada pela atribuição de culpas por parte da tutela às empresas de engenharia que têm a cargo o projecto, alijando assim responsabilidades próprias quanto a promessas pré-eleitorais não concretizadas.
Ocorre que o estado misérrimo em que se encontra a linha do Oeste, representa o mais severo obstáculo ao desenvolvimento sustentável da região Oeste e, em consequência, da cidade de Caldas da Rainha, além de constituir uma vergonhosa e inexplicável circunstância à luz do que deveriam ser as políticas públicas de transporte e de preservação do ambiente, sobretudo se atentarmos no valor em causa e que, de acordo com a reportagem da Gazeta das Caldas de 26 de Abril, ascende a uns meros 107 milhões de euros.
A vitalidade das cidades revela-se na capacidade dos seus habitantes e respectivas instituições para promoverem estratégias de desenvolvimento estrutural que promovam o crescimento económico, acautelando a qualidade de vida e a protecção do ambiente; no caso de Caldas da Rainha, nenhum outro projecto reunirá todas estas premissas como a modernização da linha do Oeste.
A pouco mais de dois anos das eleições autárquicas, seria bom que as forças políticas que se apresentarão a votos, estivessem na disposição de clarificar no imediato o que se propõem fazer em prol da resolução deste problema – seja de forma autónoma, seja em conjugação de esforços com os municípios limítrofes – a fim de dotar a população da informação necessária à formulação de uma escolha consciente.
Se optarem por não o fazer, de pouco valerá repetirem a gritaria em sede de campanha eleitoral a que já nos habituámos e que poucos ou nenhuns resultados logrou alcançar no passado.

Conceição Henriques
couto.henriques@gmail.com