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Gazeta das Caldas que tem como ponto de partida um interesse: «os habitantes daquele bairro num pequeno café / à noite / a beber cerveja logo a seguir ao jantar (…) Viam futebol num plasma enorme para o tamanho do café / parte dos olhos do magote projectados na pantalha / a outra parte dos olhos no Nada Absoluto.» O título do livro incorpora uma dupla inscrição: pode ser lido como uma estação do Metro de Lisboa (Anjos) ou um ser espiritual que se presume habitar no céu (anjos).
Na página 44 o autor apresenta-se: «(aqui há uns cem anos eu era capaz de escrever o mistério da lua em vez de o mistério da noite, já então expressão gasta. Mas desde que o satélite passou a ser um lugar comum, devassado, pálido e sem interesse, desromantizou-se o luar e os escritores tiveram de reinventar o céu.)» e conclui na página 34: «A minha literatura é amar a liberdade / rir-me das frases impotentes / é mijar quando me apetece sobre o poder intelectual do comércio.»
A organização do livro é explicada na página 12: «Os nomes das pessoas, as identidades, são fundamentais para se compreender o que se está a passar, como é o caso dos relatos ficcionais.» Um exemplo: na página 7 «Um utópico pediu-me que lhe pagasse um copo de branco» mas na página 13 já é «O gajo do copo com quem bebi vinho branco perto do Chile – Daniel Moreira Nunes – olhava de soslaio para Ermelinda Neves Afonso» e na página 15 surge de novo «aquele que bebeu um copo de branco comigo numa pastelaria perto do Chile» para mais tarde afirmar «As mãos são o grande enigma da Humanidade / são a parte visível da alma, a fonte máxima da criatividade.»
Tudo se resume afinal a um «diálogo surdo entre Eros e Tanatos» (o Amor e a Morte) como no poema da página 42, diálogo esse que «dura enquanto respiramos / perguntando sem dar por isso / porque se esconde Deus nos sacrários / onde se faz a cremação dos dias.»
(Artes finais: Pedro Serpa, Capa, fotografia e ilustração: António Ferra, Foto: Anjo-manequim, Florença 2006).

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