António Carvalho – o último fundador da Banda Comércio e Indústria tocou até aos 83 anos

0
2439

António Carvalho de Figueiredo foi o último fundador da Banda Comércio Indústria a pertencer à formação musical caldense. Retirou-se aos 83 anos, em 2012, depois de José Gil, outro dos fundadores, ter falecido. A saída da banda foi, acima de tudo, um cumprir da sua palavra. Isto porque os dois amigos tinham acordado que assim que um deles arrumasse o instrumento, o outro fazia o mesmo. Ambos receberam uma medalha de mérito da Câmara das Caldas em 2005.
Hoje, aos 87 anos, António diz que o melhor que lhe aconteceu na vida foi ter aprendido música. E fá-lo agradecendo ao seu tio e padrinho, também António Carvalho, quem lhe ensinou as primeiras notas, tinha ele nove anos. “O meu tio não tinha filhos, por isso criou-me como se fosse um. A minha família era pobre e numerosa: oito irmãos, um pai agricultor e uma mãe costureira”, conta o ex-músico, natural da Maiorga (Alcobaça), onde concluiu a 4ª classe.
Também foi o tio de António, que era sargento-músico, quem o trouxe para as Caldas e o levou pela primeira vez à Banda Comércio Indústria. Em 1947, tinha 18 anos, o jovem assistiu à primeira lição com o Capitão Armando Escoto e de lá saiu com um clarinete. Mas nem chegou a ensaiar com este instrumento pois na lição seguinte o maestro pediu-lhe para, afinal, tocar saxofone com a justificação de que havia falta destes instrumentistas. A partir desse ano, que foi também o ano da fundação da banda, António Carvalho não largou mais o saxofone. Mesmo hoje, embora já não faça parte da filarmónica, continua a tocar em casa com os dois saxofones que acabou por adquirir (um tenor e um alto).
António também tocou na banda da sua terra, Maiorga, e era frequentemente convidado para actuar com os grupos de Alvorninha e Santa Catarina, tendo igualmente colaborado com orquestras.
Contudo, “era a Banda Comércio e Indústria que estava sempre em primeiro lugar! Nunca faltei a um compromisso com esta banda para ir tocar com outras”, afirma. Na banda das Caldas actuou quase sempre sem receber dinheiro em troca, nos primeiros tempos sem farda e apenas acompanhado de homens pois antes do 25 de Abril não estava a autorizada a entrada de mulheres.
Actualmente elogia a qualidade dos músicos. “Alguns são quase profissionais porque estudam música”, diz, realçando que foi sempre amigo dos mais novos. “Afinal nós não somos eternos”.
Durante 65 anos como membro da banda, agora António Carvalho assiste aos concertos do lado da plateia e, confessa, sente-se emocionado.

“TONY SAXOFONE”

Lado a lado com a música sempre andou a marcenaria. Logo após terminar a escola primária, António Carvalho começou a trabalhar como marceneiro e foi nas Caldas que abriu a sua oficina – António Carvalho Figueiredo Marceneiro & Carpinteiro – inicialmente na Rua Formosa, depois no Bairro dos Arneiros, onde também construiu a sua casa. Chegou a ter sete empregados. Até que em Dezembro de 1971 recebeu a proposta de ir trabalhar para os Estados Unidos e aceitou. Por lá ficou até 1988, chegando a regressar a Portugal em 1985 para ser encarregado na empresa Alberto Horta & Irmãos. Acabaria por se despedir um ano e meio depois, embora ganhasse quatro vezes o ordenado mínimo nacional, porque nunca teve jeito nem perfil para mandar.
Enquanto esteve fora António Carvalho fez 48 viagens entre Portugal e Estados Unidos. “Assim que chegava às Caldas a primeira coisa que fazia era ir ter com a banda”, conta, salientando que o seu gosto pela música também era conhecido na fábrica onde trabalhava nos Estados Unidos. Chamavam-lhe o “Tony Saxofone”.

António Carvalho
Com 87 anos, o ex-safonista já não actua com a banda mas ainda toca em casa