Comandante dos bombeiros diz que as limpezas florestais não resolvem tudo

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Nelson Cruz, comandante dos Bombeiros das Caldas, não está convencido de que as limpezas dos terrenos florestais que já se verificou este ano seja a solução para todos os males que conduzem aos incêndios rurais na região e no país.
Este tem sido um ano relativamente calmo a este nível. Nas Caldas arderam apenas 13 hectares de floresta, mas também se tratou de um ano chuvoso, com índices de severidade dos fogos baixo, pelo que não se pode baixar a guarda no futuro. Mesmo assim continuam a existir comportamentos de risco e parte das saídas dos bombeiros aconteceram devido a queimadas não autorizadas que se descontrolaram.

“Felizmente foi um ano mais calmo do que 2017”, diz o comandante da corporação de bombeiros caldense à Gazeta das Caldas, em balanço do dispositivo que terminou no final de Outubro.
Este ano a legislação obrigou à limpeza dos terrenos florestais junto a vias de comunicação e habitações. Mas apesar de muito desse trabalho ter já sido feito, Nelson Cruz sublinha que há ainda muito por fazer e também não arrisca dizer que esse foi o grande factor que contribuiu para menor número de ignições de incêndios e menor área ardida.
As tragédias vividas em 2017 ainda bem presentes na memória dos portugueses fizeram as pessoas alterarem comportamentos, mas trouxeram também nova legislação e uma intervenção mais constante e incisiva da GNR em relação à limpeza dos terrenos.
“Acredito que as coisas possam estar a melhorar, mas não vamos pensar que esta questão das limpezas resolve tudo, porque não resolve”, afirma. O comandante dos Bombeiros das Caldas diz que ainda há muita gente a descurar a limpeza dos terrenos, ou que só está a limpar perto das habitações. “No centro puro da floresta, fora da zona urbana, a limpeza não foi feita e de ano para ano vamos aumentando o material combustível e havendo ignições haverá incêndios de maiores dimensões”, alerta.
Por outro lado, num ano como o que estamos a viver, em que há alternância de chuva e bom tempo, quando se limpa no início do ano, ao chegar à época de incêndios o mato já voltou a crescer, o que obriga a atenção redobrada das autoridades.
Passando aos números, no concelho das Caldas foram registados 97 incêndios durante o dispositivo de combate a incêndios – entre 15 de Maio e alargado até 31 de Outubro -, que resultaram numa área ardida de 13 hectares. O número de alertas sobe para 125 contabilizando desde 1 de Janeiro. O ataque musculado da corporação caldense, com saídas sempre em triangulação com mais duas de concelhos vizinhos, permitiu que não houvesse incêndios de grandes proporções.
Nelson Cruz realça que 13 dos 97 alertas durante o dispositivo resultaram de queimadas não autorizadas que se descontrolaram, acabando os autores autuados pelas autoridades.
Uma razão que também contribuiu para um ano calmo foi o baixo índice de severidade, pela queda de precipitação nos meses anteriores ao dispositivo. “Ajudou a que os fogos tivessem um comportamento menos agressivo quando comparados aos do ano passado, em que se viveu seca extrema”, justifica.

TRINTA E TRÊS SAÍDAS DO CONCELHO

Os Bombeiros das Caldas tiveram ainda 33 saídas do concelho, a maior parte referentes ao sistema de triangulação do dispositivo de incêndios. Este sistema baseia-se num princípio de ataque inicial musculado, em que respondem ao alerta uma equipa do concelho onde se dá o acendimento e outras duas de concelhos vizinhos.
No entanto, os soldados da paz caldenses também estiveram em alguns dos incêndios mais mediatizados da estação quente nacional. A corporação esteve presente durante 10 dias no incêndio na Serra de Monchique, com um veículo de combate, um veículo tanque e um veículo de comando. Além disso, durante esses 10 dias, foi o autocarro da corporação que garantiu o transporte de rendição de quase todas as corporações de bombeiros do distrito, por solicitação da Autoridade Nacional de Protecção Civil. “Foi a primeira intervenção deste género do nosso autocarro, obrigou a um esforço dos nossos motoristas, mas foi uma medida interessante, que garantiu maior conforto e uma tranquilidade na viagem muito maior para os bombeiros”, explica Nelson Cruz.
Os Bombeiros das Caldas estiveram ainda no incêndio do Ameixoal, nos concelhos de Loulé e Faro, no incêndio de Braga já em Outubro, e também na Serra de Sintra.

INCÊNDIOS SÃO SÓ 1,2% DA INTERVENÇÃO

Os incêndios podem ser a face mais visível da intervenção dos bombeiros junto da sua comunidade. No entanto, são apenas uma pequena parte da sua acção.
Na verdade, correspondem a 1,2% de todas as saídas. Se desde o início do ano os bombeiros caldenses foram chamados a 125 incêndios rurais, no total as saídas para ocorrências eram 10.328.
Destas, há duas claramente a destacar e também foram incêndios, mas industriais no mês de Setembro. O primeiro deu-se nuns armazém da antiga fábrica do Caiado. A grande dificuldade encontrada neste incêndio foi o material bastante inflamável, cerca de 1800 paletes de material para uma loja chinesa, entre os quais plásticos, papel, bonecos, lápis, ceras, tintas, entre outros.
A estratégia foi defender os edifícios adjacentes, especialmente o call centre, localizado a escassos metros. “Quando chegámos o incêndio já tinha uma intensidade enorme”, recorda. O objectivo foi conseguido “com muita dificuldade”, observa, acrescentando que foram gastos cerca de 1,5 milhões de litros de água para conter as chamas.
Pouco dias depois os bombeiros foram novamente chamados a um incêndio em armazéns de fruta, na Laranjeira (Alvorninha). “Eram armazéns de grandes dimensões e com fogos complexos ao nível do combate”, relembra o comandante. Também neste caso a estratégia passou por proteger o que não estava ardido, uma vez que dois dos três pavilhões estavam completamente tomados pelas chamas. “Também conseguimos cumprir a missão, dentro de um cenário que é mau e muito triste para as pessoas”, realça.
Estas foram duas situações mais fora do comum. Desde o início do ano foram ainda transportados mais de 18 mil doentes, dos quais 13 mil em serviço não urgente e 5184 em emergência pré-hospitalar. Números idênticos aos dos anos anteriores. De resto, também ao nível da quilometragem os números serão idênticos, com cerca de 600 mil quilómetros percorridos pelas viaturas da corporação.
Nelson Cruz diz-se “muito satisfeito e muito orgulhoso” pelo desempenho dos homens e mulheres que comanda.
E deixa um elogio também à forma como a direcção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha se envolve, inclusivamente com a parte operacional. “O presidente Abílio Camacho tem sido incansável no apoio logístico, como a alimentação para os bombeiros em incêndios com 10 a 20 horas de trabalho e que nos apoia sempre quando estamos a trabalhar no terreno”, sustenta.

 

Duas equipas permanentes em quatro anos

Nelson Cruz está há quatro anos e um mês como comandante dos Bombeiros das Caldas. Já entrou no último ano da sua comissão. Até agora o balanço que faz é muito positivo e realça a criação de duas equipas que permitem à corporação ter 10 bombeiros em permanência no quartel.
A primeira foi constituída logo nos primeiros meses da comissão de Nelson Cruz, em Dezembro de 2014 e trata-se de uma equipa de reforço operacional, em protocolo com a Câmara das Caldas. A esta juntou-se em Junho deste ano uma equipa de intervenção permanente, em parceria com o município caldense e com a Autoridade Nacional de Protecção Civil. “Ficamos com 10 bombeiros prontos para sair ao minuto em qualquer situação de socorro”, realça. A primeira equipa é mais vocacionada para a emergência pré-hospitalar, enquanto a mais recente se destina a ocorrências como incêndios urbanos, desencarceramento e outras que envolvem saída de meios pesados.
Estes bombeiros, mantêm serviço voluntário, mas passaram a ter contratos profissionais com a Associação Humanitária.
Nelson Cruz destaca que tem havido uma simbiose muito forte entre o comando, a direcção da associação e o município, o que tem permitido à corporação evoluir na sua capacidade de resposta às necessidades da população. Ligação forte da qual fazem parte ainda as juntas freguesias, os empresários locais e a própria população, como se tem comprovado nos recentes cortejos de oferendas, em que se têm atingido novos recordes de doações para a corporação. Esta é uma receita que Nelson Cruz considera fundamental, assim como a gestão dos recursos que é feita pelo elenco directivo.
Nos quatro anos que a sua comissão já leva, Nelson Cruz destaca a aquisição de 21 novos veículos, dos quais 16 vieram aumentar a frota dos bombeiros, e outros cinco substituíram viaturas em fim de vida. Doze desses novos veículos são ambulâncias, mas há a destacar também dois veículos para o comando, que melhoraram também a forma como os soldados da paz caldenses podem actuar no terreno.
Têm sido realizadas várias melhorias no quartel, como a remodelação das camaratas, incluindo ao nível do mobiliário e das condições de conforto, assim como a sala de bombeiros. Todo o quartel foi pintado, foi substituída a cobertura, que continha amianto, coberta a parada para manter todas as viaturas em parque fechado. Actualmente está em fase de finalização a construção de um auditório, com capacidade para cerca de 120 pessoas, e a substituição dos portões da frente do quartel.
Nelson Cruz diz que tem tido “muita sorte” nestes quatro anos à frente da corporação, embora “alguma sorte dê muito trabalho”, e não poupa elogios a toda a estrutura que comanda. “Nesta instituição há uma coesão forte, há um todo que sabe definir o que é correcto e o que não é, tomamos decisões em conjunto, avaliamos os problemas e caminhamos todos no mesmo sentido”, observa.
O comandante diz que ainda é cedo para saber se renovará ou não a sua comissão, que terminará em Setembro do próximo ano, altura em que a associação atinge o 124º aniversário.

 

Curso de bombeiros estagiários com 19 recrutas

No passado sábado, 27 de Outubro, os Bombeiros das Caldas deram início a um novo curso de bombeiros estagiários, que conta com 19 recrutas. Nos últimos quatro anos já entraram na corporação 30 novos bombeiros.
De há quatro anos a esta parte a corporação caldense tem realizado uma formação de novos bombeiros, à razão de uma por ano. Estes cursos têm sido ministrados em conjunto com outras corporações dos concelhos vizinhos, tendo em conta que o número de candidatos não tem justificado que cada faça faça o seu próprio curso de bombeiros estagiários.
No entanto, este ano a procura nos Bombeiros das Caldas foi maior que o habitual. À partida estavam inscritos 21 recrutas. No entanto, dois deles acabaram por não iniciar a formação que lhes permitirá, dentro de alguns meses, integrar a equipa de soldados da paz. Mesmo assim trata-se de um número “muito bom”, realça o comandante Nelson Cruz. “Sabemos que nem todos chegarão ao fim, mas de facto é algo que prova vitalidade desta instituição”, acrescenta. Nelson Cruz realça que há muito tempo não se verificava um número tão elevado de recrutas – no passado mês de Setembro, aquando do aniversário da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha, foram integrados sete novos bombeiros.
Estas novas fornadas são importantes para manter a vitalidade do corpo de bombeiros, até porque alguns vão também passando ao Quadro de Honra. “São pessoas com muitos anos de casa, alguns quase com 80 anos e continuam connosco, vão aos peditórios, vêm às reuniões e cerimónias, temos muito orgulho neles”, realça Nelson Cruz, acrescentando é um ciclo natural.