A maioria das artistas ainda precisa de ver a sua obra resgatada. Há várias peças de mulheres no Museu Malhoa
Decorreu a 23 de janeiro, no Museu Malhoa, mais uma visita guiada do “Depois, Malhoa” o programa que traz especialistas que coordenam visitas guiadas neste espaço museológico caldense.
Desta vez a convidada foi Sandra Leandro, a diretora do Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, em Évora. A convidada, que é também investigadora, tem-se dedicado ao estudo das mulheres artistas em Portugal e começou a sua visita guiada explicando que hoje continua a ser necessário “fazer um esforço para conhecer as obras das mulheres artistas”. A autora considera que é preciso o reforço positivo de realizar exposições sobre mulheres mas o objetivo é que haja maior paridade na história de arte portuguesa. Da visita fez parte a análise à lupa dos trabalhos de várias mulheres artistas tais como um leque feito em artes aplicadas, mais especificamente em renda de bilros de Maria Augusta Bordalo Pinheiro.
A irmã de Rafael e de Columbano aprendeu artes em casa e teve uma educação esmerada. Só aos 40 anos é que passa a expor os seus trabalhos artísticos de pintura e de cerâmica.
Maria Augusta Bordalo Pinheiro torna-se na primeira diretora de uma Escola de Desenho Industrial em 1887 e terá ainda o papel de renovar as rendas de bilros de Peniche através do desenho. Inclusivamente vai expor em vários certames internacionais como a Exposição Universal de Paris. De qualquer modo não teve igual presença no mundo das artes como a dos seus irmãos. “Ando há muito tempo a pedir à TAP para dar o nome desta artista pintora a um avião”, disse Sandra Leandro pois Rafael e Columbano já têm o seu nome inscrito em veículos aéreos. Maria Augusta Bordalo Pinheiro fez pintura, rendas e cerâmica e depois de Peniche abriu um espaço onde ensina as artes em Lisboa. “Sempre teve preocupações sociais como o seu irmão Rafael”, afirmou a investigadora. Tal como as irmãs Roque Gameiro – que têm algumas obras no museu caldense – também Maria Augusta vendeu bastante e “viviam do seu trabalho artístico”.
Sandra Leandro deteve-se também junto a obras da húngara Hansi Stael que trabalhou no século XX como diretora artística da Secla entre 1950 e 1959.

Segundo a convidada, esta autora já tinha formação dita escolar pois frequentou na escola de artes e ofícios em Viena e depois Belas Artes em Budapeste. Com este conhecimento “ela deixará uma marca distintiva na cerâmica portuguesa”, disse a convidada. Sandra Leandro que deu a conhecer, com detalhe, obras de pintura de artistas como Maria Emília dos Santos Braga, uma das mais fortes discípulas de José Malhoa, e que viria depois a ter a sua própria escola que foi frequentada por Helena Vieira da Silva. Também foram vistas à lupa as obras de Virgínia Santos Avelãs, de Alda Santos e também de Eduarda Lapa
A convidada ainda chamou a atenção para um detalhe: “Em várias das tabelas das obras é notório que há muitas doações das autoras”. Tratou-se pois de uma estratégia das próprias artistas que desta forma “asseguravam a presença das suas obras nos museus”.
História de autoras nos periódicos
Sandra Leandro partilhou ainda que iniciou a sua investigação sobre mulheres artistas pesquisando nos periódicos e, partindo daí, começou a saber mais sobre as suas carreiras e as suas apostas no mundo artístico. “A minha ambição era ter estudos de arte com mulheres e homens lado a lado”, disse a defensora da paridade nas artes que considera que, para já, o “trabalho artístico das mulheres ainda tem que ter discriminação positiva” e ainda “há muito trabalho por fazer relacionada com as mulheres artistas”. A investigadora diz que o Museu de José Malhoa é um dos seus favoritos pois é o primeiro, em Portugal, construído de raiz para a função museológica. Partilhou com os presentes que guarda memórias de infância de vir com os pais às Caldas. “Vínhamos sempre cá, quando íamos a caminho da Nazaré”, disse a investigadora que se lembra bem de ver as figuras de cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro que estavam então colocadas na cave do museu. Além do museu era também obrigatória a ida à Praça da Fruta. ■