Milhares de pessoas fizeram um cordão humano espontâneo ininterrupto que atravessou toda a cidade para ver passar La Vuelta e apoiar João Almeida, num cenário que emocionou o ciclista caldense

Foi um alinhamento de estrelas perfeito, daqueles que acontecem uma vez na vida. A Volta a Espanha, que apenas pela quinta vez partiu além das fronteiras do país vizinho, atravessou à segunda etapa as Caldas da Rainha, num percurso de cerca de quatro quilómetros, e uma mole humana saiu à rua para ver passar os ciclistas, mas um muito em especial, nesta oportunidade única para ver o filho pródigo da terra, João Almeida, em plena competição. Foi uma “loucura” poucas vezes vista – se alguma -, com um cordão humano praticamente contínuo com, seguramente, mais de 10 mil pessoas desde a entrada sul, junto à ESE, até à saída norte, rumo a Alcobaça, de gargantas afinadas a gritar “Vai João!”.

Antecipava-se, a um domingo de sol, que os caldenses fossem à estrada ver e transmitir apoio a João Almeida, mas dificilmente se imaginava que a multidão tivesse sido tão grande. Havia duas zonas onde se esperava maior afluência, uma junto à estátua da Rainha D. Leonor, local por excelência para comemorações das efemérides desportivas – onde a equipa do Museu de Ciclismo e o CicloLandal se mobilizaram para apoiar o ciclista com alguns cartazes -, e a outra foi criada junto ao Cencal – com uma fan zone dinamizada pela Caldas EcoSprint/ E. Leclerc, a equipa e escola de ciclismo onde o próprio João Almeida começou a “dar nas vistas”. Mas a realidade foi outra, porque poucos foram os metros em que a berma da estrada ficou deserta, de uma ponta à outra da cidade.

Na fan zone, a festa começou cedo, ainda antes do meio dia. No espaço havia um ecrã gigante sintonizado na transmissão televisiva da etapa, para os presentes acompanharem a aproximação dos ciclistas que partiram de Cascais. Havia insufláveis, aos quais os mais novos não deram descanso, duas roulottes de comes e bebes, uma gincana para os ciclistas, miúdos e graúdos, se aventurarem nas suas bicicletas. Foram ainda distribuídos balões e t-shirts com duas mensagens simples e que, hoje, toda a gente entende: “Vai João!”; “Bota lume”!

“Foi uma iniciativa nossa, juntamente com a Câmara Municipal, que apoiou a nossa ideia, e fizemo-lo para criar algum dinamismo à passagem do João Almeida. Não sendo uma coisa extraordinária, foi o que pudemos fazer e acho que foi sucesso, conseguimos chegar ao público”, disse à Gazeta das Caldas José Pedro Fernandes, fundador, dinamizador e treinador da escola de ciclismo caldense, acrescentando que esta era uma oportunidade que Caldas da Rainha não podia perder. “É só uma passagem, uma coisa muito rápida, mas é a primeira vez que acontece e muito possivelmente será a última”, sublinhou.

Apesar de ser um momento muito rápido, José Pedro Fernandes, que foi o primeiro treinador de ciclismo de João Almeida, não duvida que tocou o coração do seu antigo pupilo, hoje um amigo. “Está aqui uma massa humana muito grande, ele vai arrepiar-se ao passar por aqui”, disse, instantes antes do pelotão passar.

O bom arranque da Vuelta e a forma que o ciclista caldense atravessa fazem José Pedro Fernandes acreditar num grande resultado. “É candidato, pelo menos, ao top 3, todos acreditamos que estará entre primeiro e terceiro, esperemos que as coisas corram bem”, vaticinou.

Se por volta das 13 horas, quando a pequena caravana publicitária passou pelo local, o enquadramento humano da Avenida Eng. Luís Paiva e Sousa já estava bem composto, até à passagem dos ciclistas, quase duas horas e meia depois, formou-se um contínuo de pessoas até à rotunda da Fonte Luminosa, nos dois lados da faixa.

Anabela Pereira, caldense que reside naquela zona da cidade, desceu à rua empunhando uma bandeira nacional. “Vim apoiar os ciclistas, mas principalmente o João, que é daqui da região”, atirou. Do ciclismo, vê as grandes voltas, incluindo a nossa, e agora com mais interesse. “Espero que ele ganhe, mas se for segundo ou terceiro já é bom. Na França foi quarto”, disse, acrescentando que os caldenses darem apoio ao seu conterrâneo foi bonito de se ver. “Não contava que estivesse tanta gente”, disse.

Também caldenses, Carla Pereira e o filho Gabriel Louro, jovem ciclista do Caldas Ecosprint, também quiseram prestar apoio a João Almeida. E foram de bicicleta. “Fomos dar uma voltinha de BTT de manhã, depois o Gabriel quis ir buscar a bicicleta de estrada, porque a prova é de estrada”, contou Carla. Gabriel ganhou o “bichinho” do ciclismo através dos pais e já compete. João Almeida é uma referência. “Está a ter um desempenho excelente, temos que apoiar os nossos e dar-lhes valor”, diz Carla Pereira, que acredita num João Almeida capaz de mais um grande resultado. “Que ele faça o melhor que conseguir, mas temos esperança que fique lá no topo”, sintetizou.

Desportista e professor de educação física, Ricardo Pimenta não duvida que João Almeida é “um exemplo” e “uma motivação” para os jovens praticarem desporto. O que o ciclista tem conseguido tem repercussões na região. “Eu acho que isto é excelente para as Caldas, para a região e para o país, porque neste momento é o nosso melhor ciclista”, considera.

Mas esta não foi só uma festa de caldenses. Muitos vieram de longe para ver os ciclistas… e João Almeida. André Batista veio com a família, um grupo de oito pessoas, de Fazendas de Almeirim, “de propósito para ver passar a Vuelta e também porque o João participa. É uma oportunidade de o ver aqui em Portugal”, disse. Inicialmente a ideia era ficar junto à Rainha, mas aperceberam-se da fan zone e até acabaram por vestir as camisolas de apoio ao caldense.

De Santarém, veio também João Madeira. “Sou praticante de ciclismo e vibro com o João Almeida, era uma oportunidade única de o ver e aos ciclistas melhores do mundo”, considerou.

A passar férias na Foz do Arelho, Isabel Durão e a família, de Lisboa, souberam da passagem dos ciclistas e também quiseram prestar o seu apoio. “Nunca tinha visto uma volta a passar, acho muito interessante, um desporto bom, muito salutar, e tendo um desportista daqui também é fantástico. Estamos cá para apoiá-lo e esperemos que ganhe!”, exclamou.

De Guimarães veio uma excursão com o propósito de visitar o Museu de Ciclismo e apoiar João Almeida.

Para Vítor Marques, presidente da Câmara das Caldas, ter João Almeida a correr nas ruas da cidade é uma “é uma honra muito grande para os caldenses, que tiveram a oportunidade de poderem reconhecer e apoiá-lo na sua cidade natal”. Para o autarca, acolher e apoiar a ideia da Ecosprint de montar uma fan zone foi a escolha certa, até para dar visibilidade a um projeto já com 15 anos. “Faz com que percebamos que isto está a acontecer porque há uma equipa, liderada pelo José Pedro, que dá tudo o que tem em prol do ciclismo e dos jovens”, sublinhou Vítor Marques, que acredita que haverá mais motivos para festejar, no final da Vuelta. “Todos acreditamos, caldenses e portugueses”, concluiu.

Na passagem pelas Caldas, João Almeida acenou, retribuindo o apoio, e no final do dia fez um novo agradecimento. “Nunca pensei que seria possível ouvir tantos “Vai João”. Um misto de emoções inexplicável durante quase 200km, muitas memórias revividas, outras criadas”, escreveu, acrescentando que, “independentemente de resultados, já me sinto um vencedor por ter todo o vosso apoio!”.