Obra que retrata figuras caldenses das décadas de 60 e 70 já esgotou a primeira edição, numerada
“O que o meu pai procurou fazer foi quase um historial das Caldas, de uma época, através das caricaturas e poemas que mostravam a maneira de ser de cada um [dos caricaturados], com graça”. Foi desta forma que Zita Sotto Mayor, filha de Leonel Cardoso, se referiu ao conjunto de desenhos publicados na Gazeta das Caldas, nas décadas de 60 e 70, e que agora foram reunidos no livro “100 perfis”. A obra, numerada e inicialmente limitada a 100 exemplares (que já esgotou e contará agora com uma segunda edição de mais 30 exemplares) foi apresentada no CCC no passado dia 9 de novembro, depois de uma primeira apresentação em Óbidos, durante o festival Folio.
Perante uma plateia cheia, com muitos amigos da família, Zita Sotto Mayor lembrou que o pai retratou em verso muitos dos amigos e lembrou as “amizades, que juntavam as famílias, o que hoje em dia já não é tão fomentado”. Mas Leonel Cardoso caricaturou também alguns “personagens” de então, como o engraxador que, “acabada a graxa ia vender jogo” ou o Mané, “que tinha sempre uma história para contar”.
O diretor da Gazeta das Caldas, José Luís Almeida Silva, lembrou que, para a primeira série de perfis, o jornal lançou uma caderneta e deu prémios a quem adivinhasse quem era caricaturado, destacando que a iniciativa “chamou muito a atenção das pessoas, na época”. Leonel Cardoso (1898-1987) nasceu nas Caldas e profissionalmente foi funcionário superior das Alfândegas, mas sempre teve uma atividade cultural e artística muito forte. Por exemplo, nos Encontros Internacionais de Arte, que decorreram na cidade em 1977, Leonel Cardoso estava “na primeira fila a ver e participar”, partilhou José Luís Almeida Silva, acrescentando que, além da Gazeta das Caldas, também fez desenhos para a Fábrica Bordalo Pinheiro, Vista Alegre e Louças de Sacavém.
O testemunho dos caricaturados
Cinquenta e cinco anos depois de ter visto o seu perfil ser publicado na Gazeta das Caldas, João Jales partilhou o seu testemunho. A caricatura, feita em 1971, tinha então 17 anos, acabado o liceu e preparado para ir para Lisboa, ao mesmo tempo que pendia sobre eles a ameaça de uma guerra. João Jales, que conhecia todos os caricaturados, lembrou “todo aquele universo” das Caldas, em que no Parque havia o casino, onde iam durante a tarde.
Referindo-se à década de 60 do século passado, considerou tratar-se de um período muito importante para as Caldas, “de apogeu da vivência caldense, que se perdeu”, lamentando ainda o facto de não estarem mais pessoas, dos retratados no livro, para partilharem mais histórias.
Também Paulo Caiado, o mais jovem retratado (com dois anos) conheceu quase todas as pessoas que integram o livro e de quase todas tem uma história. Também ele lembrou as Caldas da altura, em que as pessoas estavam mais perto umas das outras. Só havia um canal de televisão, a preto e branco, não havia internet, vídeos, smartphones, redes sociais, aplicações, e as pessoas saiam para a rua para se encontrar com os amigos. E havia três núcleos: o ténis, o casino e a Zaira, concretizou.
Para Paulo Caiado o livro também traz recordações de família, pois tem caricaturas do seu pai e do avô materno. “Este livro é muito importante porque retrata uma época em que as pessoas tinham mais tempo para conviver”, concluiu.
Nesta cerimónia partilharam também a sua opinião Jorge Sales, que partilhou as memórias do Ferro Velho, a discoteca caldense dos anos 60 de que era proprietário. Também Maria da Conceição Pereira lembrou a sua vivência de então, nomeadamente as vindas da família, que residia em Lisboa, às Caldas da Rainha e as férias que era costume passarem em S. Martinho do Porto, entre outras memórias partilhadas entre os presentes. ■