Escrito a Chumbo 29

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20 e 24 de julho

A constituição do novo governo é o tema em foco por esta semana na Gazeta das Caldas, num artigo assinado por António Avelãs. “Depois de uma longa expectativa, o País conhece finalmente o seu novo governo. O 2º governo provisório da II República. Esperemos confiantes que seja também o último governo provisório porque esse será o sinal de que o processo de democratização do país segue a passos seguros para a sua consolidação”, começa por referir a peça que prossegue: “o primeiro facto que me apraz registar é que, pela primeira vez, o nosso povo viveu intensamente a formação do seu governo. Através das constantes reportagens da Rádio e da TV o povo foi seguindo as tentativas, foi conhecendo as dificuldades e os progressos na formação do elenco governativo. Como parece longe a época do fascismo em que, de um momento para outro, sem que isso nos «dissesse» nada, desinteressadamente, ouvíamos na TV e na rádio anunciar que tinham saído «uns e iam entrar «outros». «Outros» exactamente iguais, regra geral, aos que saíam. Perante ambos, a indiferença de todo o país, ostensiva e deliberadamente afastado da vida política. Esse tempo passou: É PRECISO QUE NUNCA MAIS VOLTE!”.
Depois trazem-se as novidades no novo governo. “A primeira característica do novo elenco é a presença de oito militares, 4 dos quais (incluindo o primeiro-ministro) pertencem à Comissão Coordenadora do Movimento das Forças Armadas, estando os outros bastante ligados ao Movimento, com excepção do coronel de engenharia José Augusto Fernandes, na altura na situação de reserva. Trata-se portanto de um governo forte em que o M.F.A. domina a situação. O Chefe do Estado, ao anunciar o novo governo definiu-o como um governo de coligação mas de autoridade reforçada. E torna-se evidente que é a presença destes elementos do M.F.A. que confere ao governo esta «autoridade reforçada. Um governo deste tipo pode ter maiores possibilidades de por em prática o «Programa que neste momento de transição orienta a vida política nacional. E é por esse motivo que repito a afirmação já feita no último número da «Gazeta»: A CONSOLIDAÇÃO DO MOVIMENTO DAS FORÇAS ARMADAS ASSEGURA A VITÓRIA DA DEMOCRACIA. Um governo «de autoridade reforçada, como este, estará em boas condições para enfrentar os graves problemas que vão surgir com a actividade reaccionária dos fascistas e dos monopólios, e com as irresponsabilidades infantis de «esquerdismos» exacerbados”.
Entre outras, aponta-se que “o MDP não faz parte do Governo” e que “esta foi realmente a grande e inesperada «novidade» do novo elenco governativo. Embora o major Vitor Alves fosse peremptório em afirmar que não houve atitude deliberada no afastamento do MDP, o facto é que esse afastamento é uma realidade. Estarão na base desse afastamento pressões e objecções postas pelo Partido Popular Democrático ou pelo Partido Socialista, que publicamente tem contestado o M.D.P.? Embora não pareça provável, a questão pode e deve pôr-se”.

Outra é a primeira mulher no cargo de ministro. “Não será talvez um facto politicamente relevante, mas não deixa de merecer uma simpática referência o facto de pela primeira vez em Portugal uma mulher ocupar um cargo de ministro. É um bom sinal; ou melhor: poderá ser um incentivo a uma maior participação das mulheres na vida política” do nosso país”, conclui o artigo.

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Posições dos diferentes partidos

Esta edição traz-nos ainda as diferentes posições dos partidos face ao novo governo. “O Partido Comunista Português satisfeito com a entrada directa do Movimento das Forças Armadas e o afastamento dos elementos conservadores que tentaram entravar o processo de democratização”. Já “o Partido Popular Democrático nega responsabilidades na crise desencadeada e apoia o novo governo”. Enquanto que “O Movimento Democrático Português apoia o novo governo, embora considere negativa a sua exclusão” do mesmo. Relativamente ao Partido Socialista, “ainda não tornou público qualquer documento sobre o novo governo, mas não há qualquer dúvida sobre o seu apoio ao novo governo, no qual ocupa três pastas: a dos Negócios Estrangeiros (Mário Soares), a da Educação (Vitorino Magalhães Godinho) e Justiça (F. Salgado Zenha).

A situação na F. A. Caiado
“O capital não desarma”, afirma o jornal, que traz “considerações sobre a luta que se trava entre os trabalhadores da empresa F.A. Caiado e a administração, pela readmissão de um colega da Comissão de Trabalhadores”.
O jornal esclarece que “a actual luta é desenvolvida, como prova de manifesta solidariedade para com Dário Manso companheiro de trabalho nessa empresa, e membro da Comissão de Trabalhadores, o qual sem justa causa se viu despedido, quando acabadas que foram as suas férias, se aprestava para retomar a sua actividade. Estamos pois em face de mais um despedimento sem justa causa. Estamos perante mais uma violência. Estamos perante mais uma forma de repressão do patronato”.
A Gazeta traz as explicações da própria comissão que “apareceu dum movimento conjunto dos trabalhadores no sentido de ajudar a reconstruir a empresa. A escolha dos elementos que compõem a Comissão, foi feita em Assembleia Plenária realizada a 25 de Maio de 1974, através do voto de todos os trabalhadores, com representação de trabalhadores de todos os sectores da empresa.
É pois, a Comissão dos Trabalhadores, representativa dos vários sectores da empresa. Quanto à administração poderemos dizer que aceitou a constituição da Comissão com um certo entusiasmo”.
O artigo foi dividido em duas edições, “por absoluta falta de espaço e tempo de composição”.
Prossegue com a comissão a explicar que, “de momento ainda não se verificou mais nenhum despedimento se bem que seja do nosso conhecimento, a existência de uma lista de empregados a despedir, num total de doze elementos. Justificou a administração este despedimento, como o «início do saneamento». Já estabelecemos os devidos contactos com o respectivo Sindicato e com o Ministério do Trabalho, que nos dão todo o apoio. Com o Movimento das Forças Armadas apenas contactamos para actuarem como moderadores. Desde a primeira hora que os trabalhadores da empresa puseram de parte a greve, dado que era bastante prejudicial para eles próprios. Mantendo esse propósito os trabalhadores perante a não readmissão do companheiro despedido, limitaram-se a permanecer nas instalações da empresa montando piquetes de vigilância. Simultaneamente tentavam-se continuar os contactos com a administração. Aliás a permanência nas instalações só se veio a verificar porque a nada conduziram os contactos com a administração. Essa mesma administração, reagiu, perante a permanência nas instalações, de forma brusca e brutal por palavras e actos, sem que tivessem tido qualquer resposta idêntica da parte dos trabalhadores.
O jornal mostra-se esperançado de que “as considerações nossas e principalmente dos elementos da Comissão de Trabalhadores da empresa F.A. Caiado, SARL, com quem conversámos, vão permitir alertar e simultaneamente esclarecer os leitores, sobre um problema que dia a dia assume maior importância: a luta dos trabalhadores contra o capitalismo. Neste caso particular, esta luta, além da sua importância nacional assume para nós, pelo seu carácter regional, uma importância ainda maior, porque a nós trabalhadores caldenses, nos bate directamente à porta. Mantenhamo-nos, pois, atentos ao evoluir deste processo de luta, bem como a outros que porventura possam surgir, para assim denunciarmos as manobras dos patrões contra as classes trabalhadoras e começarmos também a tomar parte na construção de um Portugal que se pretende diferente, onde não haja lugar para a manutenção dessas mesmas manobras e desses mesmos exploradores”.
Só que entre a primeira e a segunda edição a situação evoluiu. “Na tentativa de trazer até aos leitores informações tanto quanto possíveis exactas sobre a situação no F. A. Caiado, «Gazeta das Caldas» contactou o Sindicato (único existente nesta cidade que, embora dizendo-se dos empregados de escritório e caixeiros, serve de facto todos os trabalhadores). Desse contacto resultaram as seguintes informações: Na 5.ª feira passada: encontro da Administração com a Comissão de Trabalhadores, na presença de um representante das Forças Armadas; nesse encontro, ficou decidido que: A Administração faria um processo sobre a posição do empregado Dario Manso na empresa (actualmente suspenso). Esse processo deveria ter sido entregue na Marinha Grande segunda-feira passada. Este processo será facultado ao sr. Dario Manso, que poderá circular livremente na empresa para adquirir elementos para a sua “defesa”; Haverá em seguida uma reunião no R. I. 5, com: Presença do delegado do Ministério do Trabalho; – Presença de representantes da Intersindical; Presença de representantes das Forças Armadas; -Presença de representantes sindicais; – Presença da Comissão de Trabalhadores; -Presença da Administração. Esta reunião destina-se a analisar a situação do sr. Dario, e para análise dos pontos do caderno reivindicativo”.

Impugnação no Bombarral
No Bombarral foi notícia, numa história muito comum naqueles tempos, a “improcedência da impugnação da eleição da Comissão Administrativa Municipal”, num texto assinado pelo correspondente Leopoldino Morais Vieira.
“Conforme a Imprensa oportunamente noticiou, foi eleita em comício público, no dia 23 de Junho passado, com a presença de um oficial do Regimento de Infantaria 5, em representação do Movimento das Forças Armadas, a Comissão Administrativa destinada a gerir o município do Bombarral até à realização de eleições gerais municipais”. Só que “decorridos alguns dias, porém, uma comissão que a si própria se intitulava abusivamente Comissão do Povo do Concelho do Bombarral, do qual não havia recebido qualquer mandato e que, paradoxalmente, se veio a verificar não gozar de popularidade alguma, publicou um comunicado no qual punha em dúvida a legitimidade da eleição, insinuando, de forma capciosa, que, além de as pessoas indigitadas para a Comissão Administrativa não serem dignas de serem eleitas, também a missão do distinto oficial do Exército em cuja presença se realizou aquele acto eleitoral se não teria revestido da necessária legalidade. Anunciava, por outro lado, o panfleto a intenção da comissão que o mandara imprimir de promover um comício eleitoral. Obviamente, a Comissão Concelhia de Bombarral do Movimento Democrático Português/CDE difundiu, por sua vez, através de todo o Concelho a sua réplica àquele comunicado, denunciando-o como manobra da reacção fascista numa tentativa de assalto ao poder e convidou os membros da pretensa Comissão do Povo a identificarem-se uma vez que o comunicado desta não continha quaisquer assinaturas e a declararem o dia e o local em que tinha sido investida dos poderes que se arrogava. Todavia, a citada comissão não só não se identificou como também não respondeu às acusações formuladas no comunicado da C.D.E., de entre as quais constava a de que os seus membros estariam ligados a uma proeminente figura fortemente comprometida com o regime deposto em 25 de Abril, a qual teria inclusivamente prestado colaboração à extinta PIDE-D.G.S. É que, devido às frequentes reuniões privadas que a mesma comissão realizava, foi entretanto possível à C.D.E. identificar todos ou quase todos os seus membros. Isto porque eles próprios iam dando conhecimento a pessoas das suas relações das diligências que estavam efectuando, as quais porém não se coibiam de quebrar o sigilo que lhes fora solicitado, comprazendo-se até em fazer circular o rumor de que três componentes da comissão teriam sido recebidos por um membro da Junta de Salvação Nacional e de que a exposição que lhe tinham feito havia sido favoravelmente ouvida. Entretanto, as Comissões concelhias de Bombarral do Partido Popular Democrático, do Partido Socialista e do Partido Comunista foram, cada um sucessivamente, publicando manifestos apoiando a Comissão Administrativa eleita e em que repudiavam as afirmações contidas no comunicado da pseudo-Comissão do Povo”, conta a Gazeta.

O jornal prossegue: “a verdade, porém, é que a Comissão Administrativa eleita, convocada para se apresentar no dia 18 do corrente no Governo Civil de Leiria, a fim de ser empossada, conforme a Imprensa então noticiou, foi, à última hora, avisada telefonicamente de que se não devia deslocar a Leiria pois o Dr. Luís António de Almeida Trindade, secretário do Governo Civil, exercendo interinamente as funções de Governador, havia recebido instruções telefónicas para suspender o acto de posse da comissão. Finalmente, anteontem e ontem a pretensa Comissão do Povo fez larga distribuição de prospectos e propaganda sonora em que anunciava que se realizariam hoje, das 9 às 11 horas, com a presença de elementos das Forças Armadas, na sede do concelho e em cada uma das suas três freguesias rurais, as eleições dos representantes concelhios que viriam a constituir a Comissão Administrativa. Efectivamente, hoje, à hora indicada, foi instalada uma mesa de voto em frente dos Paços do Concelho, na qual tomaram assento, representando a comissão promotora da eleição, os Srs. Domingos Maria Soares e Manuel Gonçalves da Rocha, além do Sr. Tenente João José do Couto, da Base de Radar da Serra de Montejunto, em representação do Movimento das Forças Armadas. Na Praça do Município, do outro lado da estrada nacional, que atravessa aquele largo, concentrou-se um numeroso grupo de pessoas com o fim de presenciar o acto eleitoral. A dada altura, os Srs. João Manuel Ferreira, Humberto de Sousinha Macatrão, Virgilio Alves de Carvalho e Antero Rodrigues Furtado, representantes respectivamente do P.P.D., do P.C., do P.S. e do M.D.P., atravessaram o Largo do Município e dirigiram-se à mesa de voto para apresentarem os comunicados que haviam sido divulgados pelos partidos, e pedirem ao oficial representante das Forças Armadas que os protestos constantes dos referidos comunicados fossem lavrados na acta da mesa eleitoral. Foi um momento emocionante de vibração patriótica pois o povo concentrado no lado oposto da praça, num movimento espontâneo, começou a entoar o Hino Nacional assim que os representantes dos partidos chegaram junto da mesa de voto. Então, estes postaram-se em posição de sentido e só depois de o povo ter acabado de cantar, é que deram cumprimento à missão de que iam incumbidos, tendo-os o Snr. Tenente Couto recebido com a maior cortesia e prometido que ao solicitado seria dado deferimento, depois de aqueles senhores lhe terem narrado sucinta mas claramente as ocorrências que originaram os protestos dos partidos. Seguidamente, alguns democratas cujos nomes tinham sido, sem seu consentimento nem conhecimento, incluídos na lista da freguesia de Bombarral, abeiraram-se igualmente da mesa protestando contra tal abuso e declarando não serem de modo algum solidários com a comissão que os mencionara na lista. As 11 horas, declarou-se encerrada a eleição, tal como estava previsto e, procedendo-se à contagem dos votos, verificou-se que tinham dado entrada na urna 38 listas, uma das quais nula, contando 8 votos o nome mais votado. Entretanto, três outros grupos de delegados dos mesmos partidos tinham-se dirigido simultâneamente às mesas de voto das freguesias de Carvalhal, Vale Covo e Roliça, a fim de apresentarem os seus protestos. Na urna da freguesia de Carvalhal deram entrada 193 listas mas só uma pessoa estava a assistir à recepção destas, sem a presença de qualquer representante do Movimento das Forças Armadas. Na da freguesia de Vale Covo não deu entrada lista alguma. Estava ali, em representação do Movimento das Forças Armadas, o Sr. Capitão José Luís de Carvalho Grandara, também da Base de Montejunto. Na urna da freguesia da Roliça deram entrada 80 votos mas também ali não estivera presente qualquer representante das Forças Armadas, tendo sido dispensado um acolhimento bastante hostil por parte dos membros da mesa da assembleia de voto aos representantes dos partidos. Verificou-se assim ser improcedente e ilegítima a impugnação da eleição da Comissão Administrativa Municipal do Bombarral, sendo por demais evidente que os objectivos da Comissão à qual não foram outorgados quaisquer poderes para representar o povo do concelho não coincidiam com os interesses deste”, conclui.

 

Reunião de Agricultores
Esta semana é também notícia uma reunião de agricultores que se realizou no concelho, na qual “participaram cerca de 54 agricultores, representantes de todas as freguesias, excepto o Nadadouro, onde ainda não há comissão eleita. Esta reunião está na continuação de outras já realizadas com o objectivo da constituição de uma associação de agricultores”.

 

 

O Caldas Sport Clube

“A direcção do Caldas trabalha, não perdendo tempo, já começou a procurar reforços e já é certo que contratou para orientar a equipa, o nosso já conhecido António Pedro, sendo assim um grande obstáculo resolvido. Além do treinador, já conseguiu o concurso para a nova época do guarda-redes Rodrigues que na época anterior representou o Peniche. Cabe aqui também a nota de pedirmos a todos os Caldenses para não se esquecerem que todos nós temos que partilhar na difícil e árdua tarefa que a Direcção se propôs realizar em levar a equipa de todos nós ao plano que todos desejamos. Consócio: encarrega-te de fazer outro sócio. Assim esperamos”, termina a peça.

 

A Guerra Colonial em foco
Esta semana encontramos novamente o tema da Guerra Colonial em foco no jornal, com a publicação de um artigo do “O Século” que frisa que “Moçambique precisa do Exército português para defender o povo de grupos reaccionários”, citando Pereira Leite.
Mas também está patente na promoção de um colóquio, por parte do Conjunto Cénico Caldense, “com quatro elementos das colónias, sobre o tema «O Neocolonialismo e vida nas zonas libertadas». Esta iniciativa insere-se na campanha de esclarecimento sobre as guerras em África, iniciada no dia 7-6-74 com a Exposição sobre os movimentos de libertação no Salão de Turismo. A entrada para o colóquio é livre”, lê-se.


“Meditando sobre 1974” é o título de um artigo, da autoria de José Luíz Almeida Silva, que aborda a questão das guerras, citando o Papa Paulo VI para defender que “a Paz é possível”.

Listando os custos de armamento de França e notando que “Portugal (gasta?) gastava quase 50% do seu orçamento em despesas de caractér de defesa (?) e segurança (…)!”, o autor deixa a “conclusão da meditação: “a paz é possível!!”

 

 

Os cartoons

Nota ainda para mais dois cartoons de Figueiredo Sobral.

 

Para a semana trazemos mais artigos escritos a chumbo. Até lá.

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