Foi criado em 1979, na altura com o propósito de participar no corso de Carnaval de 80. Mas a brincadeira tornou-se mais séria e dois anos depois o Rancho Folclórico “Danças do Arnóia”, de A-dos-Francos, já dançava com os primeiros trajes típicos.
Actualmente o grupo é composto por 30 elementos, dos três aos 78 anos e pertence à Sociedade de Instrução Musical, Cultura e Recreio de A-dos-Francos.
GRUPO DE VOLUNTÁRIOS
Nenhum dos elementos do rancho é remunerado pelas actuações. Mesmo nos serviços que são pagos, o dinheiro vai directamente para os cofres da Sociedade Musical, Cultura e Recreio de A-dos-Francos. Isto significa que todo o grupo é voluntário e actua pelo amor à camisola.
Actualmente, a maioria das saídas dos ranchos é proporcionada por intercâmbios com grupos de outras localidades e o “pagamento” são lanches servidos no final das actuações que servem de recompensa. Neste aspecto, o rancho de A-dos-Francos gaba-se de bem receber.
“Há mesmo quem diga que não consegue competir com os nossos lanches”, conta Fernando Bernardino, que integra a tocata do grupo desde a sua formação. Antigamente, para conseguirem uma mesa farta, vários elementos do rancho faziam uma ronda pela freguesia, recebendo as dádivas dos seus familiares e amigos. Hoje mantém-se o costume de cada um levar uma iguaria e há mesmo quem não tenha raízes no rancho e contribua com um docinho. É também um sinal que a população acarinha o grupo.
“Só é pena que não seja assim em todo o lado”, lamenta Fernando Bernardino, dando conta que já houve circustâncias em que não sobrou nada para o rancho comer. É por isso que mais vale prevenir e normalmente os elementos levam uma pequena marmita quando actuam longe de casa.
Além de serem voluntários no rancho, muitos também integram outras valências da associação (como a banda filarmónica ou as marchas populares) ou mesmo outras instituições da freguesia. “São sempre os mesmos que estão em todo o lado”, diz Carlos Esteves, acrescentando que cada vez mais é difícil contar com todos os elementos para todas as actuações do rancho. Até porque agora, mais do que há uns anos, há também cada vez mais pessoas com contratos em que trabalham por turnos e aos fins-de-semana.
Também por esta razão o rancho nunca se federou. “Sem dúvida que esse era o passo seguinte que gostaríamos de dar, por várias vezes já falámos disso, mas não sabemos até que ponto seríamos capazes de fazer esse investimento ou dar resposta a todos os compromissos e requisitos exigidos pela Federação Portuguesa de Folclore”, diz Carlos Esteves. É que, principalmente ao nível dos trajes e utensílios utilizados, há uma série de critérios a cumprir.
Como não são uma associação única, os eventos que realizam para angariar fundos não revertem na totalidade para o rancho: estes têm que ser distribuídos pelas várias modalidades da colectividade, o que faz com que, comparado a outros ranchos da região, o de A-dos-Francos seja “um rancho pobre”, refere o ensaiador.
E existe ou não rivalidade entre os vários ranchos do concelho? Carlos Esteves diz que sim – é inevitável fazerem-se comparações entre uns e outros, seja na forma como dançam ou se vestem – mas hoje em dia a competição é mais disfarçada que antigamente. Mas se assim não fosse, nem tinha piada.
Mas se há um sentimento transversal a todos os ranchos é o orgulho que sentem ao representarem a bandeira da sua freguesia quando actuam em localidades fora do concelho. Para Fernando Bernardino, a sua maior alegria é mesmo “subir ao palco e ouvir o nome da minha terra”, sentindo nos ombros o peso da responsabilidade de representá-la o melhor possível. “Há qualquer coisa que mexe connosco, uma emoção muito grande”, acrescenta. O melhor reconhecimento são os aplausos, mas também aquelas vezes em que o grupo já está de partida e as pessoas lhes pedem para actuarem uma vez mais ou ficarem para o convívio.
Depois há actuações que ficam para a história do rancho. Gentil Ferreira recorda uma ida a Penacova, em que o grupo ficou sem acordeonista porque à hora do espectáculo este tinha que se apresentar ao quartel. Era militar. “Fiquei lá com um clarinete coxo e dois acordeonistas que não percebiam nada daquilo… aproximava-se a hora da actuação e eu estava com muito receio”, conta Gentil, acrescentando que disse aos seus companheiros para se agarrarem àquele momento o mais que pudessem. A união fez a força e o resultado final foi “uma das melhores actuações que tivemos”.
PRECONCEITO?
Um mal geral que também afecta o rancho de A-dos-Francos é que são poucos os jovens que se interessam por este tipo de actividades. “Se não vierem antes dos 10 anos, dificilmente os convencemos a ficar”, realça Patrícia Estevão, 34 anos.
É preciso criar raízes para não abandonar o barco e geralmente isso consegue-se quando os mais novos são filhos de elementos do rancho. É como se já tivessem nascido com o bichinho da dança por terem a música folclórica no ouvido desde pequeninos.
Rafaela Esteves tem agora 19 anos, mas nem se lembra do dia em que entrou para o rancho. Foi como se sempre tivesse pertencido ao grupo, tão nova que era quando começou a dançar. Agora, a frequentar a licenciatura em Educação Básica, confessa que o tempo aperta, mas que a vontade (aliada à organização) vence sempre de forma a que não falte a nenhum ensaio ou actuação.
“Aqui sinto que ganhei o espírito de união e tive a oportunidade de conhecer pessoas de A-dos-Francos que de outra forma não conheceria”, diz Rafaela, acrescentando que poderá existir algum preconceito em relação aos ranchos folclóricos da parte dos jovens da sua idade. “A única forma de evitar qualquer sentimento de vergonha por pertencer ao rancho é ser educado desde pequenino neste ambiente”, assegura.
A filha de 14 anos de Patrícia Estevão, por exemplo, está numa idade em que a opinião dos colegas pesa muito. A mãe conta que há dias, numa actuação, a filha estava cheia de receio em subir ao palco porque sabia que iria ter colegas da escola a vê-la. “Parece que os miúdos estão formatados para serem todos iguais, então qualquer um que faça algo fora do comum é gozado”, diz Patrícia Estevão que, no seu trabalho, também sempre foi chamada de “rancheira”. “Só que eu encaro esse nome com muito orgulho”.
Em tempos também existiu em A-dos-Francos um rancho infantil, que funcionava como uma importante fonte de captação de elementos para o rancho adulto. Actualmente, além do empurrão que é dado pelos familiares, são os festivais de folclore que contribuem para chamar a atenção dos mais novos. “Eles vêem outros miúdos a dançar, então também têm vontade de aprender”, conta Patrícia Estevão, realçando que têm no rancho vários jovens que não têm quaisquer raízes no folclore, mas foram influenciados a experimentarem por assistirem ao festival. “São filhos de pessoas que nem dançar num baile de arraial dançam… por isso têm muito valor. É que gostar do rancho quando existe tradição na família, isso é muito fácil”, faz notar.
38 anos de história…
Novembro de 1979: Início dos ensaios do rancho
Fevereiro de 1980: Primeira saída no Carnaval (com trajes todos iguais)
Maio de 1980: Organização do primeiro festival de folclore
Maio de 1983: Primeiro Rancho Infantil
Maio de 1984: Mudança de traje (adopção dos trajes tradicionais domingueiros e de trabalho)