Os sistemas de informação e a programação informática são profissões com boas perspectivas de futuro para os jovens. João Figueiredo, um dos fundadores da Janela Digital – uma das primeiras empresas de base tecnológica da região – diz que as tecnologias de informação vão ser nos próximos 100 anos o que a indústria do petróleo foi nos últimos 100. Esta é uma oportunidade que o Oeste tem todas as condições para agarrar, mas a oferta formativa na área está muito aquém das necessidades, sobretudo ao nível do ensino superior.
“As perspectivas são as melhores possíveis. A programação, o software, as tecnologias de informação vão ser nos próximos 100 anos o que a indústria do petróleo foi nos últimos 100. Vão estar em todo lado, vão ser utilizadas a todo o momento”, diz o empresário João Figueiredo em relação às saídas profissionais de quem escolhe esta área para prosseguir estudos.
Onde houver um dispositivo eléctrico, há necessidade de uma indústria do software por detrás a fazê-lo funcionar. Esses dispositivos já estão por todo o lado, seja nas nossas casas, no carro, no telemóvel, no trabalho. Um dos exemplos de quão rápidos são os avanços da tecnologia é o advento dos automóveis sem condutor. “Já não é ficção cientifica, já há milhões de quilómetros percorridos por estes veículos sem condutor que andam nas estradas e partilham as mesmas vias por onde andamos nós”, realça.
Outro sinal dos avanços da indústria tecnológica é “A Internet das Coisas” (Internet of Things – IoT), ou a forma como os dispositivos se ligam cada vez mais uns aos outros em rede para serem mais úteis aos seus utilizadores com base na utilização que lhes é dada. “Há uma série de desafios que só agora estão a começar e, tal como nos anos 80, há a sensação de estar tudo ainda por fazer e para acontecer”, observa João Figueiredo.
Hoje várias empresas tecnológicas já estão cotadas como das melhores do mundo. É o caso da Apple, da Google, do Facebook, ou da Amazon, e a tendência é para que o sector continue a crescer.
Em Portugal têm surgido muitos projectos para encubar empresas tecnológicas e o Web Summit (evento que se realizou em Lisboa no ano passado e regressa em 2017) mostra a potencialidade que o país tem para desenvolver o sector.
“Nós temos tudo para sermos uma potência nesta indústria do software, uma indústria limpa, sustentável, cheia de futuro, bem remunerada, cobiçada por vários países”, diz João Figueiredo, acrescentando que os portugueses já deram provas “para estarmos a par dos melhores do mundo neste campo”. E a grande vantagem é que ser um país periférico não é negativo, como o é para industrias de proximidade, diz o empresário.
No entanto, João Figueiredo é da opinião que as oportunidades que estão a surgir estão a passar ao lado, tanto do país, como da própria região. E a razão disso estar a acontecer é que “somos pouco ambiciosos pois surgem-nos oportunidades imperdíveis à nossa frente e não as queremos apanhar, ou pelo menos não as conseguimos vislumbrar a tempo de as agarrar e de fazer delas uma base para a nossa evolução enquanto país ou região”.
E concretiza a ideia dizendo que, apesar da indústria do software já necessitar de muita gente e de vir precisar de ainda mais no futuro, não há formação, nem planos, nem orientação para que a oferta educativa consiga suprir as actuais necessidades e as futuras.
“Estamos com falta de recursos humanos para estas empresas e ao mesmo tempo com uma taxa de desemprego elevadíssima. O que é isto senão amadorismo e mau planeamento?”, questiona.
FALTA CURSO DE ENGENHARIA INFORMÁTICA
João Figueiredo aponta um exemplo dessa falta de visão a nível local. “Enquanto administrador da empresa que giro, há 16 anos que peço ao Instituto Politécnico de Leiria que crie uma licenciatura de Engenharia Informática nas Caldas da Rainha, na ESAD, prometi-lhes que se formarem 30 engenheiros informáticos serão 30 engenheiros contratados, se formarem 50 serão 50 contratados”. E acrescenta que já perdeu a conta às reuniões que teve, aos e-mails que enviou, às conversas pessoais em fóruns, sem qualquer resultado.
O empresário diz ainda que o IPL deve muito às Caldas da Rainha pelo que investiu na criação e manutenção da ESAD “e a verdade é que as ambições das gentes da região, onde me incluo, não são correspondidas”.
No entanto, o fundador da Janela Digital consegue vislumbrar alguns exemplos positivos, como é o caso de Óbidos. O investimento na criação do Parque Tecnológico foi “uma pedrada no charco e é um oásis para mais de uma centena de empreendedores que na região querem lançar-se nas tecnologias de informação”.
João Figueiredo enaltece a aposta feita então por Telmo Faria à frente do executivo de Óbidos e revela esperança na visão dos dirigentes Humberto Marques, Tinta Ferreira e Hugo Oliveira para que se consigam criar cursos e licenciaturas informáticas na região.
Elogia também a postura das escolas do ensino secundário, que têm dado sinais positivos em relação a esta temática. Escolas como a Bordalo Pinheiro, a ETEO, a de Rio Maior e o Externato Dom Fuas Roupinho (Nazaré) são exemplos apontados pelo empresário, mas destaca a Raul Proença, “que ultimamente está de longe no primeiro lugar no que concerne à qualidade de formação em informática”. Quem quer seguir os estudos nesta área, João Figueiredo aconselha a rumar a Lisboa.
Um dos pioneiros na década de 1980
João Figueiredo pertence a uma geração que despertou para as tecnologias de informação ainda na década de 80, muito antes do advento da Internet.
“Os meus pais ofereceram-me um ZX Spectrum, um pequeno computador vocacionado essencialmente para jogos, mas com o qual escrevi as minhas primeiras linhas de código em Basic”, recorda.
Não haviam telemóveis, computadores pessoais, muito menos portáteis, máquinas fotográficas digitais, DVDs ou CDs. Era a época das cassetes de video VHS e Beta, dos Walkman. Os programas e jogos para o Spectrum 16k ou 48k eram carregados através de um pequeno leitor de cassetes audio que se ligava ao computador e este ligava-se à televisão. “E o cenário estava montado para tardes e tardes de divertimento entre os amigos que se juntavam à volta do Spectrum”, continua.
João Figueiredo conta que decidiu cedo o que queria fazer da vida, embora na altura estivesse mais inclinado para os jogos de computador.
Mas houve um acontecimento que o direccionou profissionalmente: a abertura do Curso Técnico Profissional de Informática piloto na Escola Secundária Bordalo Pinheiro, em conjunto com mais dois, em Lisboa e no Porto. “Segundo me contaram, a Bordalo Pinheiro na altura teria encomendado uma serie de computadores IBM – os que originalmente deram o nome de Personal Computer (PC) – e depois de uma repreensão do ministro da Educação da altura pela aquisição, chegaram à conclusão que uma saída airosa seria abrir nas Caldas da Rainha o curso”, recorda.
A Bordalo Pinheiro conseguiu, então, juntar nas primeiras turmas todos os que na altura eram apaixonados por computadores. “Foram tempos de descoberta em todos os aspectos, quem na altura enveredou pela informática não teve qualquer problema em ganhar a vida”, realça o empresário.
Lembra-se de, com 18 anos, dar cursos de formação “muito básica” sobre introdução aos computadores por 1.500 escudos (7,50 euros) por hora. “Nas férias de Verão cheguei a juntar 500 contos, uma fortuna para mim”, acrescenta. J.R.