Em agosto de 1930, a Gazeta começa a publicar um conjunto de “princípios de Higiene Moral” fornecidos pelo Dispensário de Profilaxia Social das Caldas da Rainha, indicando que o mesmo era destinado à execução de uma sua nova “modalidade de assistencia”: “a profilaxia do crime”.
“Breviário de higiene moral” foi o título dado à compilação desses princípios publicada no ano seguinte e impressa na Tipografia Caldense. No texto introdutório, Fernando da Silva Correia identifica como atribuição da instituição “a luta contra a mortalidade pela doença e a favor da higiene infantil e geral”. Nesse sentido, explica, para que não se estranhe o interesse pela “vulgarização de noções de moral”, a história da sua criação, oriunda de uma estreita colaboração entre o Lactário-creche rainha D. Leonor, a Câmara Municipal, o Tribunal Judicial e a Direção Geral de Saúde. Assim sendo, era natural que se ocupassem dos inquéritos sociais, como forma de se tornarem “um centro de informação e auxilio a todos os que estão em perigo quer de contagio, quer de imoralidade, quer de caírem no vicio e no crime”.
Este texto é um testemunho das necessidades higiénicas da época, mas dele também transparece a posição deste médico relativamente à educação moral, que era partilhada por alguns contemporâneos. A obra é composta por quinze partes, uma delas reforça a necessidade de uma educação moral, outra fala da importância de escolher boas leituras e as restantes enumeram quais os deveres para com 1) os pais, família e superiores; 2) os iguais em fortuna, saber ou situação; 3) os que sabem menos do que nós, têm menos bens, menos educação ou piores impulsos; 4) os nossos inimigos; 5) os nossos colegas e camaradas de trabalho; 6) os animais; 7) a sociedade; 8) o Estado; 9) as pessoas religiosas; 10) consigo mesmas e 11) com o regímen. A estes deveres acrescenta-se o ABC da civilidade.
Neste ABC, civilidade é apontada como a “arte de ser correto e agradável para com as pessoas que nos cercam”. Para o autor “a convivência com pessoas bem educadas é a melhor escola” e aqui estão reunidas inúmeras indicações sobre como cumprimentar o outro – “Quando se encontra uma pessoa conhecida em qualquer parte, deve cumprimentar-se, tirando-se-lhe o chapéu ou baixando-se-lhe a cabeça” -, sobre o que uma pessoa bem educada não deve fazer, tendo em conta os hábitos de higiene pessoal – “(…) trazer as unhas e os dentes sujos, o cabelo sujo ou por pentear, as botas por engraxar, o fato com nódoas” – ou ainda regras sobre como estar à mesa.
Através do arquivo deste médico, percebe-se o alcance nacional desta obra, que foi publicada na imprensa local de Castelo Branco e foi solicitada por vários médicos em todo o país, sendo inclusive distribuída pelos reformatórios. A médica e deputada Domitila de Carvalho chama-lhe “belissimo guia”. E, para concluir, é interessante mencionar que foram igualmente editados o Breviário das mães e o Breviário de higiene. ■
Joana Beato Ribeiro
IHC-NOVA-FCSH; CEHFCi-UÉ; PH
Bolseira de doutoramento FCT
SFRH/BD/149075/2019