Cem anos
Marcelo Rebelo de Sousa
Presidente da República Portuguesa
Por definição, o editorial de uma publicação é da autoria do Diretor, pela simples mas evidente razão de que retrata a orientação editorial dessa publicação.
Pode ser por ele ou ela delegado em membros da direção ou da redação. Sempre identificados com os valores e princípios a que obedece a mencionada orientação.
Porque não há comunicação social sem uma pauta de valores e princípios retores da sua afirmação comunitária ao longo dessa missão cívica.
Não obstante, o que importa é a honra que foi concedida ao Presidente da República Portuguesa de escrever umas linhas na edição comemorativa de cem anos de vida.
Não sendo um editorial, representa sempre uma colaboração e o respetivo convite um gesto muito gentil.
Cem anos significam que esta Casa testemunhou ainda o final da Primeira República nas Caldas da Rainha, em Portugal e no mundo.
Viveu o caminho das esperanças do termo da Grande Guerra frustradas e mesmo destruídas pela ascensão das ditaduras e pelo galope para a Guerra de Espanha e a Segunda Guerra Mundial.
Sentiu no seu quotidiano a censura, a negação das liberdades e a imposição do pensamento único ou dominante.
Teve de esperar décadas para ver o mundo assistir ao ruir da bipolarização mais aos ensaios de novos arranjos universais, multilaterais, bilaterais, unilaterais, com potências a cair e outras a emergir.
Viveu os vários lances da integração europeia.
Entre nós, testemunhou ocaso da ditadura, descolonização com termo de Império de cinco séculos, revolução, democratização por fases, inserção europeia.
Pelo meio, contou como a rádio se juntou ao cinema e ambos foram submergidos pela televisão e a internet e as novas redes sociais aceleraram o tempo na existência das pessoas.
Narrou como as Caldas e a região deram saltos demográficos, económicos e sociais. Mas também sofreram crises e tempos de compassos de espera.
Tudo, com paciência, resistência, constância nos valores e princípios humanistas, éticos, cultores da liberdade e da democracia republicana, dentro do espaço possível, ou seja o espaço deixado pela ditadura, as recessões económicas, os sufocos de uma imprensa sem meios e de uma imprensa regional e local a desaparecer por permanente cerco das conjunturas adversas.
Resistiu e fez um século.
Coisa de sublinhar por quem andou nessa vida desde há sessenta anos.
E de realçar como sinal de cultura liberal e democrática numa comunidade, que nunca regateou solidariedade, mesmo se com escassos recursos, a esta empreitada de vulto.
Finalmente, a teimosia, quase obstinação, de quem nunca desistiu.
Como o convidante para esta colaboração.
Ele é um exemplo feliz de que fazer-se jornais e, com isso, lutar-se pelo bem comum que o mesmo é dizer o bem do povo, das pessoas, é uma paixão.
Uma paixão que não morre
Bendita paixão!
Dela se faz o conhecimento, a liberdade, a democracia, o verdadeiro progresso e a mais duradoura felicidade dos povos e das nações.



































