Jovens começam a ser ouvidos nas políticas definidas pelos municípios

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Juventude na abertura do Oeste Jovem, que decorreu no CCC em 2017

No passado dia 12 de Agosto assinalou-se o Dia Internacional da Juventude. Em Portugal existem, de acordo com os dados do Pordata, 3,1 milhões de pessoas com menos de 29 anos, dos quais perto de 99 mil residem no Oeste.
E há políticas municipais para a juventude? Os jovens são envolvidos nas estratégias que lhes são dirigidas? Gazeta das Caldas falou com algumas autarquias oestinas e dá-lhe a conhecer o que é feito direccionado para esta faixa etária.
Esta temática é também abordada em projectos internacionais, como é o caso do SLYMS, que envolve universidades e associações de Portugal, Grécia e Espanha e que procura definir estratégias de inclusão e de diálogo intercultural, especialmente com migrantes e refugiados.

Todos foram convidados a dar contributos para melhorar as politicas da juventude

A Nazaré foi o único dos municípios que respondeu à Gazeta das Caldas que possui um plano municipal para a juventude. As políticas implementadas procuram facilitar os recursos e serviços especialmente dirigidos aos jovens e foram definidas em Conselho Municipal de Juventude, onde todo o grupo que o compõe deu o seu contributo.
De acordo com o vereador Manuel Sequeira, as políticas assentam em critérios que “são peças estruturantes da nossa sociedade, desde o fomento de igualdade de oportunidades à coesão social, passando pelo emprego, habitação, educação e lazer”.
Os jovens são ouvidos na definição dessas políticas. Por exemplo, um dos grupos que compõe o Conselho Municipal são as juventudes partidárias existentes no concelho e, neste sentido, é–lhes dado espaço para exporem os problemas e as dificuldades vividas pelos jovens.
O plano apresentado, discutido e votado no Conselho Municipal da Nazaré denomina-se “Por Jovens, Com Jovens e Para Jovens” e é “um mecanismo aberto, que prevê um trabalho conjunto para levar a cabo projectos concebidos e desenvolvidos pelo município da Nazaré nas áreas que consideradas fundamentais para os jovens (empregabilidade, educação, saúde e bem-estar, criatividade e cultura, coesão social, participação, juventude, voluntariado e associativismo)”, concretiza o autarca.
Actualmente está em fase de elaboração um orçamento específico para a juventude para, a breve prazo, ser apresentado e discutido em Conselho Municipal de Juventude. Manuel Sequeira considera que os principais desafios colocados à juventude são a empregabilidade e a formação, “verdadeiros eixos que permitir garantir um município mais coeso e mais ambicioso, motivado pela inexistência de uma universidade ou instituto politécnico no concelho o que leva os jovens a procurar essas metas fora, sendo Leiria uma possibilidade recorrente”.
A fraca participação dos jovens em órgãos de gestão de associações ou colectividades, assim como em medidas de política local, são vistas por este autarca como um problema. Denota ainda falhas no voluntariado jovem, havendo registo de associações que não conseguem captar elementos. Para tentar combater estas situações, a Nazaré está a desenvolver um Plano Estratégico Educativo Municipal e tem prevista a realização de um fórum juvenil, onde jovens que se encontram a estudar fora irão partilhar ideias e possíveis áreas de estudo universitário. “Procuraremos combater a falta de informação existente com recurso a ações de sensibilização capaz de criar ligação entre o poder local e os jovens bem como às demais associações do nosso concelho”, conclui Manuel Sequeira.

Óbidos Jovem

A Câmara de Óbidos lançou, durante o actual mandato o programa Óbidos Jovem, assente em pilares como o empreendedorismo, saúde e bem-estar, arte e cultura, a educação e formação, sustentabilidade ambiental, mobilidade e eventos. Por exemplo, no gabinete Óbidos + Activo, a funcionar nas piscinas municipais, os jovens têm acesso gratuito a consultas de Nutrição, Psicologia e de orientação e prescrição para a prática de actividade física.
O apoio e fomento da prática desportiva na juventude é outra das preocupações do executivo, que disponibiliza actividades aquáticas nas piscinas municipais, férias activas, torneios, multi-actividades de ar livre, desporto adaptado (com aulas semanais) e equitação terapêutica. No Espaço Ó, à entrada da vila, funciona um posto do Ponto Já, que disponibiliza informação sobre criação do próprio emprego, formação e orientação vocacional, assim como de programas de férias educativas, voluntariado e apoios, como bolsas de estudo ou arrendamento jovem, e postos de acesso à internet gratuitos.
Mas como são definidas as políticas municipais da juventude? De acordo com a vereadora Margarida Reis, os jovens tiveram uma intervenção directa na elaboração do programa, sendo através de grupos informais, associações de estudantes e outras associações de jovens, que transmitiram a sua opinião, ideias e preferências.
A criação de um programa de rádio jovem, a participação nos grandes eventos, na animação de rua, dinamização de novas modalidades desportivas e programas de voluntariado, são projectos que, conjuntamente têm sido colocados em prática, exemplifica a responsável à Gazeta das Caldas.

Garantir a fixação no concelho

No Cadaval as políticas destinadas aos jovens são definidas pelo executivo mas, sempre que o assunto é de cariz mais amplo ou relevante, este é apresentado ao Conselho Municipal de Juventude, que toma posição sobre o mesmo, explica o vereador Ricardo Pinteus. É também através desse conselho municipal que os jovens são ouvidos na elaboração de algumas propostas que lhes são destinadas ou na concretização de algumas das suas ideias. Foi o caso de um skate parque, cuja ideia foi apresentada por um grupo de jovens e bem acolhida pela autarquia, que o veio a construir.
Sem um orçamento específico para a juventude, a Câmara do Cadaval possui uma verba afecta às actividades com jovens e que usa, por exemplo, na atribuição dos prémios de mérito escolar (monetários), apoios a associações de formação desportiva juvenil e bolsas de estudo para o ensino superior. Este ano implementou o Orçamento Participativo, em que os jovens também puderam apresentar os seus projectos. De acordo com Ricardo Pinteus, o maior problema com que se debatem é o do “envelhecimento da população resultante da diminuição progressiva de nascimentos de crianças no concelho e o maior desafio será garantir a fixação dos nossos jovens”. O autarca garante que as soluções a encontrar para estes problemas terão sempre em conta os jovens, “que devem ter uma palavra a dizer em matérias que lhes dizem directamente respeito”.
A autarquia de Alcobaça não possui plano municipal para a juventude, assumindo anualmente uma actividade regular, com um conjunto de acções e eventos direcionados aos jovens. Também não possui um orçamento específico porque o executivo entende que esta é uma faixa etária transversal a vários pelouros.
Entre as acções que dinamiza há uma atenção redobrada com a prevenção primária, a prática de hábitos de saúde e de lazer saudáveis e a capacitação para a cidadania, criatividade, comunicação, colaboração, arte, cultura, pensamento crítico e empreendedorismo.
O contacto com os jovens durante as actividades permite ao executivo efectuar ajustamentos de forma a melhorar em edições posteriores, não havendo actualmente uma auscultação directa aos jovens. Mas, com a entrada do município para a Rede de Cidades de Aprendizagem da UNESCO estão previstos momentos de auscultação dos jovens e a criação de espaços para reflexão em torno das temáticas por eles indicadas. A autarquia refere que os conselhos municipais da Juventude e da Educação são outros espaços de auscultação e discussão a ter em consideração.
As questões relacionadas com a participação cívica e a ligação dos jovens ao território são as que merecem maior atenção da autarquia, que tem investido em actividades que promovam uma cidadania activa e também de cariz cultural e pedagógica, assim como o estreitamento das relações com o ensino profissional e politécnico.
Gazeta das Caldas tentou também saber o que é feito ao nível das políticas da juventude nos municípios das Caldas da Rainha, Peniche e Bombarral, mas não obteve resposta por parte dos respectivos executivos.

 

“A questão fundamental é pôr os jovens a participar na vida pública”

“É fundamental os jovens serem chamados a decidir, a participar de forma activa na vida pública, a apresentarem projectos”. Quem o defende é Helder Luiz Santos, responsável da CAI – Conversas Internacionais, uma organização não governamental vocacionada para as políticas da juventude. De acordo com este responsável, se não houver uma participação efectiva e implicação nas tomadas de decisão, os jovens vão-se alheando do sistema democrático.
Os orçamentos participativos afiguram-se como uma boa prática, pois combinam a participação dos cidadãos e uma verba para a concretização dos projectos. Contudo, Helder Luiz Santos alerta que, por vezes, há autarquias que controlam o processo, deixando aquém a cidadania.
Para que os jovens se sintam integrados eles têm que ser reconhecidos pelos adultos “não como a geração que vem destruir o status quo, mas como a que traz novas ideias e que é possível cooperar entre eles para o progresso do concelho”. Para isso, é fundamental a existência de planos municipais da juventude e da participação dos jovens na sua concretização.
Helder Luiz Santos destaca como bom exemplo de participação cívica a ida à Assembleia Municipal das Caldas, de jovens estudantes para falar sobre a greve estudantil pelo ambiente. “Eu estava presente e vi que a maioria dos grupos políticos representados acharam muito interessante a actividade e gostaram da participação dos jovens”, disse o também caldense.
Em sua opinião, um plano de juventude não deve ter uma “atitude paternalista” de chamar os jovens a colaborar, mas sim dar-lhes a possibilidade de discutirem, inclusivamente, o próprio documento. “Não havendo um plano, não se sabe como chamar a juventude”, destacando que, para além de encontros nas escolas e associações juvenis, devem ouvir-se os jovens nas ruas e colocar-lhes desafios sobre o que acham que pode ser mudado.
“Estes movimentos devem ser criados de baixo para cima, ou seja, convidando os jovens a dar as ideias e pensar como se podem colocar em prática, inclusivamente na forma de arranjar o dinheiro”, explica.

Integrar migrantes e refugiados

E porque o país está a envelhecer, há necessidade de atrair migrantes para manter o seu saldo demográfico. Helder Luíz Santos considera que as Caldas da Rainha tem boas práticas de acolhimento aos refugiados, mas deve mobilizar-se para ter mais e por mais tempo do que os 18 meses que dura o acolhimento.
“Era interessante que as Caldas começasse a fazer pressão politica para ter cada vez mais refugiados e apoiá-los, criando uma espécie de estrutura ou serviço que potencie a sua fixação”, disse. E sugere: “como existem mais de 3000 jovens não acompanhados na Europa, não seria interessante as organizações das Caldas mobilizarem-se para receber, por exemplo, 10 desses jovens?”

Jovens de várias instituições partilharam as suas experiências em Barcelona, no âmbito do projecto SLYMS

A associação que dirige, a CAI, participa actualmente no projecto europeu SLYMS – Aprendizagem Sociocultural da Juventude nas Sociedades em Mobilidade, que visa o diálogo e a educação intercultural como forma de integrar os jovens na sociedade, sobretudo refugiados e migrantes económicos. Além de Portugal, integram o projecto associações de Salónica (Grécia) e Barcelona (Espanha).
Recentemente, num encontro que decorreu na Universidade de Pompeu Fabra – onde Gazeta das Caldas participou a convite da CAI – , os especialistas discutiram as políticas de juventude e cidadania, nomeadamente a necessidade de fazer políticas inclusivas. Uma das intervenientes, Maria Àngels Cabasses, da Universidade de Lleida, destacava que os jovens sabem exactamente quais são as suas necessidades, mas que ainda não participam na criação das políticas que as resolvam. A precariedade laboral e as consequências pessoais e sociais que daí advêm também leva a que muitos se afastem dos centros de decisão.
A investigadora destacou que “em todas as políticas públicas os jovens devem estar no centro, pois são eles o futuro da sociedade”. Durante os três dias de trabalho foi ainda abordado o trabalho comunitário, as estratégias de empoderamento juvenil, a democracia participativa e a construção da cidadania, por diversas instituições académicas e associações juvenis.
A par da Grécia, Barcelona possui um forte dinamismo ao nível das políticas de juventude e de abertura ao outro. Por exemplo, qualquer freguesia da região da Catalunha tem um centro da juventude com técnicos que cumprem um plano que é gizado pelos próprios jovens, explica Helder Luís Santos, acrescentando que estes centros discutiram, por exemplo, a autonomia da Catalunha.
Em Portugal a associação pretende integrar os jovens migrantes, por exemplo, através de festivais multilinguísticos e interculturais. O próximo encontro do projecto SLYMS será em Setembro, em Lisboa.