Autarquia terá de pagar uma verba de 1,5 milhões de euros, acrescidos de juros de mora. Recurso já está a ser preparado
O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria condenou a Câmara de Óbidos ao pagamento de uma indemnização de 1,5 milhões de euros, acrescidos de juros de mora, à Vitermaco – Compra de Imóveis para Revenda, Lda, a proprietária do lote G1 da polémica urbanização no Bom Sucesso, cuja construção foi embargada em 2000 pela autarquia e que resultou da divisão dos três lotes que pertenciam à Construções 91, Lda. A empresa viu ser considerada parcialmente procedente a ação interposta em 2008, em que exigia o pagamento de 5,2 milhões de euros por danos patrimoniais.
A decisão agora conhecida vem contrariar uma anterior deliberação do tribunal num processo relacionado com o mesmo empreendimento, em que a Câmara tinha sido ilibada. Fonte da autarquia garantiu que o recurso já está a ser preparado.
O processo remonta ao último mandato do socialista José António Pereira Júnior à frente da Câmara (1997-2001). A autarquia deferiu o pedido de licenciamento do empreendimento no Bom Sucesso em maio de 1999, e a construção arrancou no ano seguinte, mas a obra viria a ser embargada. A prorrogação da licença de construção foi recusada por despacho do chefe do executivo municipal, em fevereiro de 2001.
A existência de desconformidades em relação ao projeto que havia sido licenciado esteve na base do litígio, nomeadamente o desrespeito pela a área de implantação licenciada, a que se seguiram decisões judiciais que viriam a confirmar a ilegalidade do licenciamento e a violação do Plano de Urbanização Turisbel/Casalito e do Plano Diretor Municipal (PDM).
Em julho de 2001, o Ministério Público instaurou junto do Tribunal Administrativo de Coimbra um recurso contencioso para declaração de nulidade do despacho proferido pelo presidente da Câmara de Óbidos em maio de 1999, relativamente às especialidades, o que viria a ter provimento em 2006.
Já com Telmo Faria (PSD) à frente dos destinos do município, o litígio prosseguiu, embora com nuances. Em 2002, a autarquia alterou o Plano de Urbanização, para viabilizar o empreendimento, tendo procurado chegar a acordo com os promotores. Sem sucesso, o caso arrastou-se até 2008, quando o Supremo Tribunal Administrativo confirmou a validade da ordem de embargo e determinou a demolição dos edifícios. Aquela operação só não avançou porque a Vitermaco (proprietária do lote G1) e a Vialis, Vias e Infraestruturas do Lis, Lda (que ficou com o lote G3) avançaram com pedidos de indemnização no TAF de Leiria. Quanto ao lote G5 foi alienado pela empresa Ferole, Sociedade de Construções, Lda à Imobiliária Cruzeiro dos Parceiros, SA, que seria declarada insolvente, pelo que a ordem de demolição ficou a aguardar o desfecho dos vários processos.
Passadas duas décadas, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria vem dar razão aos proprietários do lote G1, ao considerar que “foi a permissão administrativa prévia, correspondente ao ato de licenciamento, titulado posteriormente pelo alvará de construção”, que permitiu que a Construções 91, Lda “iniciasse e praticamente concluísse a construção do edifício objeto do pedido de licenciamento”, pelo que o “deferimento do pedido de licenciamento, declarado nulo em sede judicial, é causa adequada dos danos invocados”.
No entender do tribunal, o licenciamento do empreendimento, decretado em maio de 1999 pelo executivo de Pereira Júnior, foi ilegal, porque desrespeitava o PDM, mas acabou por abrir caminho ao avanço das obras pelos promotores, que ficaram, desse modo, legitimados. Em causa está a alteração ao Plano de Urbanização, que ocorreu já posteriormente ao licenciamento da obra, o que teria de levar à nulidade daquele procedimento.
Os edifícios em causa apresentam sinais de degradação, tendo sido objeto de atos de vandalismo ao longo dos anos. No caso do lote G1, estão em causa 16 apartamentos, que a empresa proprietária estimava poder transacionar por uma verba a rondar os 2,9 milhões de euros. ■