António Vitorino D’ Almeida: “O improviso é uma manifestação de liberdade”

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FotoMaestroFoi um Santuário do Senhor da Pedra completamente lotado que se rendeu ao concerto com o maestro António Vitorino D’Almeida, na noite de 16 de Agosto. Ao piano, o compositor apresentou uma obra inédita e original, intitulada “Improvisação a Óbidos”, que tem como tema a celebração do seu património e História.
À Gazeta das Caldas disse que sempre gostou de improvisar, pois permite-lhe mais liberdade e “sem problemas da direcção a seguir”.

Marcado para as 21h30, o concerto acabaria por ter início 15 minutos depois, uma vez que a lotação já estava esgotava e, à porta do santuário, juntavam-se algumas dezenas de pessoas à espera da possibilidade de entrar. Acabaram por poder entrar todos e, António Vitorino D’Almeida improvisou durante 50 minutos para uma plateia, rendida, de 180 pessoas.
Aplaudido de pé, o maestro e compositor, acabaria por voltar ao piano para dois encores antes de dar por terminado o espectáculo que fez para dedicar a Óbidos. Um concerto no qual entrou mudo e saiu calado pois, quando se trata de improvisos, é esta a prática dos artistas.
Esta foi a terceira vez que António Vitorino D’Almeida fez um concerto de improviso, depois de ter actuado na Casa da Música (Porto) a convite de Pedro Burmester, e de um outro concerto a quatro mãos com o músico brasileiro Luíz Avellar.
À Gazeta das Caldas, António Vitorino D’Almeida contou que sempre gostou de improvisar e que o faz desde pequeno. Uma vez o seu pai disse-lhe que o que “não está escrito [numa partitura] não existe”, percebendo nessa altura que a música escrita obedece a outro tipo de critérios mais formais. No entanto, isso não o impediu de continuar a gostar do improviso sendo certo que um bom músico, para saber improvisar, também tem que ter boas bases sólidas.
O músico e compositor explicou ainda que durante muito tempo existiu uma “espécie de preconceito generalizado de que a improvisação não se devia fazer”, que só acabou quando o compositor e pianista Keith Jarrett fez uma improvisação ao vivo em Colónia (1975) e conquistou o público.
António Vitorino D’Almeida, de 74 anos, revela que gosta muito desta forma de interpretar a música, comparando-a a uma “espécie de psicanálise pois a pessoa diz tudo o que quer, o que pensa, o que sente, não tem quaisquer problemas de direcção a seguir, é uma manifestação de liberdade”, revelou.
E, não tendo uma partitura à frente, quando sabe quando terminar o concerto? “Começa quando começa e acaba quando acaba, não é de modo algum programado”, conta o compositor que nessa noite, por várias vezes, pensou em acabar o concerto mais cedo. Por outro lado, como não tinha relógio, “não sabia há quanto tempo durava”, acrescenta, bem-disposto.
António Vitorino D’Almeida também não poupou elogios a Óbidos, que disse ser um sítio “extraordinário” e onde vem muitas vezes. Também ali viveu, e está enterrada, a sua sogra, a escritora Odette de Saint-Maurice, que era uma “pessoa muito romântica e que faz parte da minha vida e das minhas memórias”, disse, adiantando que foi em todas essas emoções que pensou durante o improviso.
O maestro deu também nota do gosto que tem em tocar em igrejas, ainda que reconheça que o som não é dos melhores. “Tem vibrações por todos os lados, mas é uma igreja e, assim, deixa de ser um defeito para ser uma característica”, destaca.
O concerto foi filmado pelo realizador caldense Miguel Costa, que irá incluir a música no genérico final do filme que terminou recentemente. Trata-se de uma curta-metragem de 24 minutos intitulada “No Divã” e conta com a participação dos actores Paulo Pires, André Gago e também do próprio António Vitorino D’Almeida.
A filmagem tem também por intuito a edição de um DVD com o concerto de Óbidos.

Fátima Ferreira
fferreira@gazetadascaldas.pt