
Dois poetas e xilogravadores brasileiros partilharam conhecimentos sobre literatura popular e a sua produção
Na tarde de sexta-feira, José Lourenço compunha, manualmente, os caracteres de chumbo que deram origem ao poema “Inquietações Brasil Portugal”, que junta versos de 15 poetas populares portugueses e brasileiros. Ao seu lado, Chico Bruno dedicava-se à xilogravura que será a capa do folheto de cordel. Os dois brasileiros, poetas, xilogravadores e tipógrafos, oriundos de Juazeiro do Norte (Ceará), trabalhavam no Atelier Artes&Letras, em Óbidos, no âmbito do projeto “Desassossegos Transatlânticos Brasil-Portugal: em torno da Literatura Popular e suas formas de produção”. Dinamizado pela Livraria Artes & Letras, de Óbidos, juntamente com parceiros nacionais e brasileiros, o projeto trouxe ao Folio a arte popular.
Os dois xilogravadores e poetas populares ligados à literatura de cordel mostraram a sua arte em oficinas de xilogravura e estiveram em contacto com poetas populares da região, numa conversa que decorreu na livraria Artes e Letras, no dia 12 de outubro. “Nós enviámos para o Brasil, no século XVIII, a literatura de cordel e agora estamos a trazê-la de volta, pela mão destes artistas e já adaptada aos materiais locais”, explicou Luís Gomes, da livraria Artes & Letras, dando nota que, no encontro os poetas populares mostraram as suas inquietações. Muitos deles “auto publicam-se, de uma forma muito barata, mas também muito eficaz e muito bonita”.

A literatura de cordel no Brasil tem ainda tem uma importância artística e social. Por exemplo, publicaram-se cordéis (pequenos livros) durante a pandemia, a explicar, em verso, que precauções as pessoas deveriam de ter, explicou o livreiro, que pretendeu ver partilhado esse conhecimento com os poetas populares locais.
No final do encontro, produziram uma espécie de “cadáver esquisito”, ou seja, cada poeta disse algumas quadras que, juntas, deram origem ao folheto de cordel (pequeno livro), produzido no atelier Artes & Letras e que estará à venda na livraria. O poema é assinado por Chico Bruno, Vitor Duarte, Adélia Duarte, Isabel Militão, Lurdes Portela, Vítor Mata, Elisa Fernando, Gustavo Freitas, Natália Santos, Rui Matos, Isanete Marques, Daniela Alcântara, José Lourenço e Cattleya Guedes.
A história de José Lourenço confunde-se com a da tipografia. Natural de Juazeiro do Norte, iniciou sua atividade artística ainda criança ao ajudar o avô, Pedro Gonzaga, na Tipografia São Francisco, uma editora de cordel que, mais tarde viria a dar lugar à Lira Nordestina. Iniciou seus trabalhos de xilogravura em 1986, tendo participado de diversas exposições nacionais e internacionais, e atualmente é assessor artístico da Lira Nordestina, contribuindo com a memória, formação e divulgação da xilogravura naquela região do Ceará. Poeta poeta popular, tipógrafo e xilogravador, José Lourenço realça que o livro de cordel é muito popular no nordeste brasileiro.
Também Chico Bruno é poeta de cordel e xilogravador. “A xilogravura está ligada ao folheto de cordel porque é a ilustração mais clássica dessa nossa manifestação cultural”, explicou o artista. “No Brasil ainda é muito presente, nós produzimos, editamos, comercializamos e distribuímos. Tem uma grande aceitação, principalmente na nossa zona”, explicou o jovem que aprendeu a xilogravura na tipografia Lira Nordestina, agora convertida em centro de produção cultural.
Os poetas populares brasileiros já regressaram a casa, mas Luís Gomes pretende dar continuidade a este projeto transatlântico. “Seguramente que com os poetas portugueses irá continuar, com encontros e discutindo os caminhos da literatura popular portuguesa, tendo a livraria como ponto de encontro”, concretiza. ■






























