As medidas que vão ser tomadas no âmbito do memorando de entendimento com a troika “não podem pôr em causa a existência da rede de instituições particulares de solidariedade social (IPSS) que dão apoio às franjas mais desfavorecidas da sociedade”, defendeu Eduardo Graça, presidente da CASES (Cooperativa António Sérgio para a Economia Social).
Na sua intervenção durante uma conferência sobre Economia Social que a Caixa de Crédito Agrícola (CA) dinamizou a 5 de Maio no CCC, Eduardo Graça salientou que a continuação desta rede é fundamental para manter a coesão social em Portugal.
Na sua opinião, deve ser feita uma análise cuidada ao documento assinado pelo PS, PSD e CDS, para que se perceba quais serão as alterações profundas que irão ser feitas no país.
Um dos exemplos que deu foi a da reforma da administração local, com a redução “de uma forma drástica” do número de municípios e juntas de freguesias antes das próximas eleições autárquicas.
Eduardo Graça defende também que as caixas de crédito agrícola devem continuar a apostar na intervenção na economia e não “querer ser um banco como os outros”.
Segundo o responsável, 2012 foi declarado pela ONU como Ano Internacional das Cooperativas e pode ser uma oportunidade para que “o sector cooperativo, de que as caixas agrícolas fazem parte, se possam afirmar de uma forma mais forte na nossa sociedade”.
A economia de proximidade e o capital social
Jorge de Sá, do Centro de Administração e Políticas Públicas do ISCSP, falou sobre a economia de proximidade. O professor universitário destacou que as grandes empresas podem facilmente deslocalizar investimentos “e destruir num ápice equilíbrios estabelecidos ao longo do tempo”.
Pelo contrário, as empresas de pequena ou média dimensão, como as que se inserem na economias social, não se deslocalizam “porque são parte integrante do território e é nele que encontram a sua identidade”.
Outro conceito que abordou foi o de capital social. “Se um cidadão entra em cooperação com o seu vizinho e se ambos forem ao encontro de cooperar com outros vizinhos, haverá a criação de capital social que poderá satisfazer as necessidades de todos”, explicou.
Na sua opinião, as caixas de crédito agrícolas têm contribuído muito para a criação de capital social “pela sua presença no terreno ao longo do tempo”.
Américo Mendes, docente da Universidade Católica do Porto, considera que o Crédito Agrícola é uma organização que, pela sua distribuição ao longo do território, “presta um contributo precioso para a redução das disparidades regionais”.
O professor universitário alertou para o risco de ruptura em algumas IPSS do país devido à crise, até porque muitas dependem dos subsídios do Estado. “São organizações que prestam um serviço muito valioso na resposta aos problemas sociais do nosso país”, sublinhou.
Por isso, defende que este sector tem de se reestruturar para ganhar eficiência. “Precisa de fazer a revolução silenciosa que o crédito agrícola foi capaz de fazer nos últimos 30 anos, centralizando o que é preciso centralizar, descentralizado aquilo que é preciso descentralizar”, referiu.
Crédito agrícola nasceu com a República
A conferência nas Caldas da Rainha foi uma das iniciativas realizada no âmbito das comemorações do centenário do Crédito Agrícola.
Embora date de 1896 a primeira referência expressa às caixas agrícolas, só em Março de 1911 é que foi publicado o decreto que é considerado o diploma instituidor das cooperativas de crédito agrícola.
“Nessa altura a pequena e média lavoura era ignorada pelos bancos comerciais, que nem tinha qualquer presença no meio rural, e ficava à mercê de agiotas e usurários de todo o tipo”, referiu Carlos Courelas, presidente do Conselho Geral e de Supervisão da Caixa Central, numa intervenção sobre a história da instituição.
A criação das caixas (que estiveram na base do actual grupo) corresponde a um impulso cooperativista que se verificava também noutros países europeus e tornou-se um marco importante no processo de desenvolvimento do sector.
Carlos Courelas salientou que o grupo se implantou de norte a sul de Portugal “a partir das zonas rurais”. Logo na sua génese, o grupo “foi orientado para dar resposta a problemas concretos do desenvolvimento económico-social a nível e à melhoria da qualidade de vida das suas populações”.
O responsável referiu que o compromisso das caixas com as suas regiões está desde logo materializado “no facto dos recursos captados serem, antes de mais, canalizados para o apoio das actividades que se inserem na sua área social, criando portanto riqueza e emprego a nível local”.
As caixas distinguem-se de outras instituições bancárias porque não vêem os locais onde desenvolvem as suas actividades meramente como mercados “para onde vão quando o negócio se apresenta como promissor, mas de ondem se apressam a sair se o mercado em causa começar a perder o interesse”. A Caixa, garante, “trabalha para a área social em que foi criada nos tempos bons, nos menos bons e nos maus”.
Carlos Courelas citou um estudo recente do FMI que indica que os bancos cooperativos foram um importante factor de estabilidade durante a crise económica e financeira mundial. “Sem a sua acção, mantendo o crédito às PME e aos pequenos negócios locais apesar do ambiente económico, o impacto da crise teria sido mais gravoso”, afirmou.
Por outro lado, sublinhou o investimento deito nos últimos anos na sua infra-estrutura tecnológica e operativa, mas também a sua solidez financeira. “O activo do grupo excede já os 14.000 milhões de euros, o que representa perto de 9% do PIB português”.
No entanto, apesar do seu crescimento “o Crédito Agrícola manter-se-á fiel às suas origens”, contribuindo para a economia local.
João Costa Pinto, presidente do Conselho de Administração executivo da Caixa Central, assinalou que há cerca de duas décadas foi criado o sistema integrado de crédito agrícola “que espelha o seu sucesso num país onde as generalidade das experiências de base cooperativa têm falhado, ou atravessam extremas dificuldades”.
A autonomia, proximidade com os clientes, poder de decisão local e a solidariedade entre as caixas são também a explicação para o seu sucesso, acredita o responsável nacional.
O Crédito Agrícola tem 700 balcões, através de 85 caixas de crédito agrícola, com meio milhão de associados e mais de um milhão de clientes. Há zonas do país onde o CA tem mais de 30% de quota de mercado.
Segundo João Costa Pinto, “não há nenhum grupo financeiro português na situação do CE em termos de solvabilidade”. Isso permite continuar a “a apoiar a actividade económica”.
O presidente da Câmara das Caldas, Fernando Costa, também usou da palavra na abertura da conferência, salientando que o município é cliente da Caixa de Crédito Agrícola local há muitos anos. “É uma instituição por quem dou o meu aval”, afirmou, saudando a direcção da CA das Caldas “pelo excelente trabalho que tem feito”.