
Acabar com as assembleias de freguesia e reduzir o número de eleitos para as Juntas. Implementar um sistema autárquico em que são os deputados municipais que elegem o executivo da Câmara. Envolver os cidadãos no debate político através de Agendas 21 locais e orçamentos participativos. Estas foram algumas das ideias defendidas por António Eloy no debate 21 às 21 com o tema “Terapias para as Autarquias”.
A sessão promovida pela Associação MVC – Movimento Viver o Concelho realizou-se no dia 21 de Janeiro, na sede da União de Freguesias Nª Sra. do Pópulo, Coto e S. Gregório.
Estão as autarquias doentes? António Eloy diz que sim e realça mesmo que “as autarquias são uma das doenças fundamentais da nossa democracia”. Mais conhecido pelo seu percurso ligado à área das energias e ao activismo ambiental (como dirigente do Movimento Ibérico Anti-Nuclear está envolvido na luta pelo fecho da Central de Almaraz), António Eloy foi também vereador na Câmara de Lisboa e deputado municipal no concelho de Barrancos. E é com base na sua experiência política que defende que “o sistema autárquico necessita de uma varridela total porque actualmente não é funcional”.
Tanto o diagnóstico como as terapias que António Eloy sugere – não só para as câmaras, mas também para as juntas de freguesia – estão evidenciadas no livro “Clientelismo – Doença Infantil da Democracia”, que escreveu a duas mãos com o jurista Tomaz Albuquerque. “Decidimos escrever este livro porque estávamos preocupados e aborrecidos com a corrupção que surge em torno das autarquias locais”, diz o autor, salientando que em Portugal há vários casos de presidentes da Câmara eleitos em processos que envolveram a “distribuição de envelopes”. Uma realidade que desde logo é retratada na capa da obra, que faz referência à pintura “A Compra do Voto” (1904) de José Malhoa.
No combate à corrupção das políticas locais existe “uma justiça que é lenta e incapaz de investigar adequadamente os gestores autárquicos”.
QUAIS OS PROBLEMAS?
Antes de identificar os principais males das juntas de freguesias e das autarquias, António Eloy recua até ao pós-25 de Abril, altura em que “as pessoas tinham uma enorme vontade de participar e envolver-se nas questões da sociedade” .
O problema não está na existência dessa vontade participativa, mas na forma como foi gerida. “Achámos que essa participação deveria ser canalizada para mega-instituições e criámos entidades completamente infuncionais”, explica o convidado, dando o exemplo imediato das Juntas de Freguesia. Estas são organizações do território que antigamente correspondiam às paróquias: era o padre que geria os assuntos relacionados com o nascimento, a morte e o casamento. Mais tarde foi substituído pelo regedor.
Actualmente existem em Portugal 3000 freguesias, das quais mais de 1000 têm menos de mil habitantes. “A maioria tem apenas funções administrativas, seja da gestão da limpeza das ruas e do lixo ou dos cemitérios”, revela Eloy, defendendo, por isso, que não se justifica a eleição de dois órgãos diferentes que implicam 15 elementos do lado da assembleia e três a cinco no executivo. E lembra os casos em que em freguesias rurais há dificuldade em apresentar uma lista com tantas pessoas, caindo-se no erro de convidar representantes que nem sequer são caras conhecidas das localidades.
“Depois há ainda juntas que contratam assessores, mas que muitas vezes são os próprios deputados da assembleia”, acrescenta o autor, propondo antes o modelo espanhol em que se elege apenas um órgão que é a Junta. “Nas pequenas freguesias bastava eleger-se um presidente a meio tempo, à semelhança do antigo regedor, e nas maiores, que merecem uma contemplação legislativa diferente, chegavam sete eleitos”, sugere. Nesta lógica reduzia-se o número de eleitos de 60 mil para seis mil e as juntas ficariam dez vezes mais funcionais.
“Do mesmo modo, também é necessário reformular o sistema autárquico”. Tendo em conta uma vez mais o exemplo da vizinha Espanha, Eloy defende que o executivo da Câmara deveria ser eleito directamente pela Assembleia Municipal. E critica o facto de existirem deputados municipais que são funcionários da autarquia ou presidentes de Junta que têm lugar na Assembleia. “Como é que estas pessoas vão ter autonomia nas suas decisões?”, questiona-se.
AGENDAS 21 E ORÇAMENTOS PARTICIPATIVOS
Das várias medidas que servem como “terapias para as autarquias”, António Eloy antecipa-se dizendo que todas assentam no princípio de aproximar os cidadãos à política local. Sugere a realização de Agendas 21 (documento aprovado no Eco-92, mas que aqui surge como plano de acção para a sustentabilidade do munícipio e que envolve o poder local, as forças vivas do concelho e a comunidade), assim como o investimento em orçamentos participativos.
“Deveria haver um vereador responsável, de facto, pelos Orçamentos Participativos”, realça, justificando que por vezes a falta de participação dos cidadãos se deve ao facto de “as Câmaras não estarem realmente interessadas em que existam estas campanhas porque resultam numa redução do seu poder político”. Neste contexto, Teresa Serrenho, gerente da Bombondrice que no ano passado concorreu ao OP, criticou a postura da autarquia caldense, que marcou para o mesmo dia e hora, a apresentação das candidaturas ao Orçamento Participativo e o Plano Estratégico das Caldas. “Quem quer estar presente em tudo, como é que faz nesta situação?”, questionou.
A existência de referendos autárquicos, assim como de espaço para os cidadãos assistirem e participarem nas assembleias municipais são outras soluções que Eloy propõe para curar as autarquias. Pela positiva, sublinha que o caso das Caldas é único, pois em mais nenhum ponto do país há um Conselho da Cidade.
O orador também defendeu a corrida das listas independentes, frisando que os partidos deveriam ser obrigados a recolher o mesmo número de assinaturas que os movimentos independentes para se poderem candidatar às câmaras.