A directora Regional de Cultura do Centro (DRCC), Celeste Amaro, está a ser alvo de uma polémica devido às declarações proferidas no início do mês sobre um grupo de teatro de Leiria. Dizia a responsável que aquele grupo, por não ter pedido subsídio estatal, “não incomodou a Administração Central”.
A comunidade artística não gostou e há uma petição que pede a demissão da directora regional, que já soma mais de 1250 assinaturas.
Celeste Amaro vai ter que prestar declarações na Comissão Parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, após uma proposta do PCP para ouvir a responsável ter sido aprovada por unanimidade.
Em causa estão as declarações que Celeste Amaro proferiu a 2 de Março, em Leiria, quando elogiou o grupo de teatro Leirena por ter feito uma programação sem recorrer aos apoios da Direcção-Geral das Artes: “vim cá a Leiria porque, por incrível que pareça, não me pediram dinheiro. Como é possível? Ainda por cima na área do teatro! Foi algo que me tocou bastante. É uma lição de como um grupo de teatro profissional, com três actores, que se dedica de corpo e alma ao seu trabalho, vive sem pedir dinheiro, não incomoda a Administração Central”. Tais afirmações suscitaram um Manifesto em Defesa da Cultura e vários artistas exigiam, em petição pública, a demissão de Celeste Amaro da DRCC. Na petição, que foi dirigida ao ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, os subscritores “repudiam” as declarações de Celeste Amaro afirmando que esta “não tem condições para continuar no cargo”. Os subscritores pedem ao responsável pela pasta da Cultura para “agir em conformidade e com urgência”. O Bloco de Esquerda enviou um requerimento ao Ministério para saber se o Governo considerava que a directora regional tinha condições para continuar no cargo.
Celeste Amaro viu-se obrigada a fazer um esclarecimento onde se afirma que “quis valorizar a forma como este Grupo de Teatro tem desenvolvido a sua atividade, sem necessitar de qualquer apoio financeiro da Administração Central, ao longo dos seus quase sete anos de existência”.
O ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, afirmou que mantém a confiança na directora regional de Cultura do Centro e que não há razões para a demitir. “Após a retratação pública feita pela senhora directora regional, estando quase no final do seu mandato [que termina no final de 2018], não consideramos haver matéria para uma acção de demissão”, disse o ministro, em audição parlamentar, em resposta a pedidos de informação do PCP e do BE.
Celeste Amaro é ex-deputada do PSD e foi reconduzida no cargo em Dezembro de 2013, pelo secretário de Estado da Cultura de Passos Coelho, Jorge Barreto Xavier.
A directora já tinha suscitado polémica quando se revelou satisfeita pela integração de Diogo Gaspar na DRCC quando este é arguido num processo em que é acusado de furto de bens do Museu da Presidência da República. A responsável afirmou ao Público que “recebemos o Dr. Diogo Gaspar com muito agrado. Não se tratou de nenhuma imposição, e ele veio trabalhar em três projectos que já estavam em curso”. E acrescentou que o facto de Diogo Gaspar ser arguido e suspeito do desvio de bens “não me interessa nada – actualmente, metade dos portugueses são arguidos”.
“Como é que ela se mantém no cargo?”
As declarações de Celeste Amaro foram “inqualificáveis e inclassificáveis”, disse à Gazeta das Caldas, José Carlos Faria, do PCP local e um dos responsáveis pelo Teatro da Rainha. Este responsável acha que Celeste Amaro “não sabe qual é o papel da Cultura nem qual é a sua missão no que diz respeito à criação cultural”.
José Carlos Faria, citando Rui Vieira Nery, afirmou que não considerar a Cultura como prioritária “é um sinal de grande ignorância”. Mas vai mais longe e questiona para que serve, então, a directora regional. E sugere que, já agora, para não incomodar o Estado “a própria também poderia abdicar do seu salário!”.
Na sua opinião, Celeste Amaro “apesar de contar com a benção do senhor ministro, revela uma ignorância crassa em relação ao sector cultural”, rematou. Já a vereadora da Cultura caldense, Maria da Conceição Pereira (do mesmo partido de Celeste Amaro), escusou-se a tecer qualquer comentário sobre as declarações daquela responsável.
A historiadora de arte, Raquel Henriques da Silva, considera que as afirmações da directora regional de Cultura do Centro são de “uma indignidade absoluta” e, como cidadã, questiona-se: “como é que ela se mantém no cargo?”. A docente universitária esteve nas Caldas a 22 de Março no âmbito de uma actividade no Museu Malhoa.
Luísa Arroz, coordenadora do mestrado de Gestão Cultural da ESAD, afirmou que “entristece-me bastante termos uma directora regional de Cultura que valoriza o silêncio dos seus agentes e que acha que é nessa medida que se avaliam as actividades e a qualidade dos grupos”. A responsável pela licenciatura de Programação e Produção Cultural preferia que houvesse uma outra atitude da DRCC: “os artistas não são pedinchas e era bom que se tratasse com dignidade e que se criassem outros critérios para o apoio à criação artística”, rematou.