UM ANO DE MANDATO – Luís Patacho: “Quando a mesma força política está mais de 20 anos a gerir uma Câmara, a Democracia fica doente”

0
1380
- publicidade -

Luís Patacho diz que a Democracia fica a perder quando um mesmo partido governa uma autarquia, um país ou uma região durante mais de 20 anos. É o caso das Caldas, para a qual o socialista aponta razões sociológicas, políticas e históricas para explicar a hegemonia do PSD ao longo de 40 anos.
Num executivo composto maioritariamente por elementos do PSD, Luís Patacho diz que é difícil fazer ouvir a voz da oposição, mas que, mesmo assim, 15 a 20% das suas propostas foram aprovadas. O modelo de gestão do Hospital Termal, o valor do IRS cobrado pela autarquia aos munícipes, a falta de interesse da Câmara pelo Orçamento Participativo, são algumas das críticas que faz à gestão PSD.
Em entrevista à Gazeta das Caldas, o vereador socialista defende a continuidade da ampliação do hospital caldense e diz que a localização do novo hospital do Oeste tem que ser nas Caldas da Rainha, que “nasceu da saúde” e é “o coração do Oeste”.
“Um ano de mandato” é como se designa a rubrica que hoje iniciamos, na qual vamos entrevistar autarcas da região. Tinta Ferreira, presidente da Câmara das Caldas, e a quem convidamos para a iniciar, recusou dar uma entrevista ao nosso jornal.

 

GAZETA DAS CALDAS – Como é exercer oposição numa câmara com maioria absoluta?
LUÍS PATACHO – Eu reformularia a questão: como é fazer oposição numa câmara sem pelouros, sem apoios, sem condições técnicas e com uma vida profissional extremamente intensa, como é a minha e a do Arq. Jaime Neto. Isso é que é difícil de gerir. A circunstância de a câmara ser composta maioritariamente por elementos do PSD dificulta-nos as tarefas do ponto de vista da aprovação das nossas propostas e da aceitação das nossas considerações relativamente às matérias que são discutidas. Sabemos que, no limite, vencerá sempre a posição do PSD.

- publicidade -

 

 

GC – Qual é a percentagem de propostas vossas que são aprovadas?
LP – Talvez à volta dos 15 a 20%. Mas o facto de estarmos em minoria não nos constrange de apresentarmos as nossas propostas, os nossos pontos de vista, os quais, algumas vezes, são tidos em consideração. E as posições que são trazidas pela maioria, muitas vezes são revistas em face das nossas observações. O relacionamento que existe, quer ao nível do trabalho, quer em termos inter-pessoais, é bom. Mas, é claro, temos divergências de fundo sobre determinadas matérias.

GC – Quais são as principais divergências?
LP – São ao nível do método de trabalho e das prioridades. Temos visões completamente distintas sobre o Hospital Termal, sobre o modelo e o projecto que a Câmara preconiza e para o qual temos um projecto alternativo.

GC – Que projecto alternativo é esse?
LP – É um projecto com uma visão muito mais abrangente e mais holística sobre o próprio Termal em si. A nossa visão assenta, por um lado, na utilidade clínica que obviamente ninguém põe em causa, mas por outro lado temos uma perspectiva que o Termal tem de ser uma alavanca da economia local e até regional. Porque tem potencial para isso. Não pode é ser com este projecto minimalista que a Câmara tem, que pretende abrir as inalações em Abril (era para ter sido a 15 de Maio e depois em Julho), depois abrir mais alguns banhos e duches no primeiro andar e, lá para 2019 ou 2020 a piscina no Balneário Novo. É uma perspectiva que assenta numa ideia de que 2000 aquistas darão sustentabilidade económica para este projecto. Mas não dão, nunca darão, nem o dobro provavelmente dará. E muito menos nestas condições de infraestrutura do Termal que não cumpre os critérios que hoje em dia os aquistas exigem.

GC – Qual é a vossa solução?
LP – Teríamos que ter um projecto de expansão da própria infraestrutura do Termal assente num estudo de viabilidade económica, que nos diga qual o número de aquistas e em que termos é que o projecto é sustentável. Deveria ser criado um novo balneário, porventura na zona da Parada, que, aliás, está previsto no auto de concessão para ser feito num prazo de cinco anos. Portanto, deveríamos estruturar esse projecto de expansão assente num programa de apoio ao próprio termalismo, saúde e bem-estar, desenvolvimento do turismo e com um conjunto de critérios de atractividade. Terá de ter uma componente de apoio às empresas que se dedicam aqui à restauração e ao alojamento, que deveriam ter apoios e isenções fiscais. Deveria ser um programa estruturado ao nível da oferta cultural, do meio ambiente, da regeneração urbana, com o novo hotel…

GC – O hotel previsto para os Pavilhões do Parque não colide com esse projecto?
LP – De maneira nenhuma. Pelo contrário. Entendemos que o hotel pode ser uma mais valia para aquilo que nós entendemos que é o projecto de expansão do termalismo.

“A NOSSA MAIOR CRÍTICA AO HOTEL É A PRIVATIZAÇÃO DO CÉU DE VIDRO”

GC – E o que diz das críticas que referem que o hotel vai privatizar a antiga Casa da Cultura?
LP – Acompanho essas críticas. Mas não sou contra o hotel porque acho que pode ser uma infraestrutura importante de apoio ao projecto termal nessa perspectiva muito mais arrojada e muito mais expansiva.

GC – Mas esses pormenores de que discorda no projecto do hotel são o preço a pagar para poder ter esse equipamento?
LP – Não. Não se pode hipotecar o nosso património, que é único e de relevância nacional, para fazer face a apetites que são legítimos do ponto de vista económico e da viabilidade financeira do projecto. Só que nós não podemos estar por tudo.
Mas atenção que ainda não se conhece o projecto de arquitectura porque ele, simplesmente, ainda não existe. Apenas se conhece um esboço. O projecto está a ser tratado junto da DGCP e da Câmara Municipal e parece que alguns dos aspectos mais criticados já terão sido limados.
A nossa crítica mais forte é a privatização do Céu do Vidro. Parece-nos absurdo que se tenha de fazer a entrada do hotel por uma manga aérea de ligação ao primeiro pavilhão desde o Céu de Vidro. É escusado, é forçado. O Céu de Vidro é muito importante do ponto de vista sócio-cultural e histórico nas Caldas. Era um elemento de visualização entre a Alameda dos Plátanos e o próprio Hospital e não podemos aceitar uma solução destas.
A outra crítica tem a ver com o excesso de volumetria da antiga Casa da Cultura, mas parece que o promotor admite diminui-la, compensando com a construção de um novo pavilhão onde era antigamente o Salão Ibéria.
Havia um recuo do próprio alinhamento da Casa da Cultura que entrava mais para dentro do Parque e que nos parece também escusado. Havia também a questão do estacionamento no subterrâneo, que parece que a ideia é abandonar. O estacionamento deverá ir para a zona da Parada, o que não nos parece mal desde que não hipoteque a possibilidade de expandir o Termal e colocar lá o novo balneário. O fecho de alguns portões do Parque também parece uma ideia que terá sido abandonada.
Portanto, a confirmar-se o recuo da maior parte das objecções que nós tínhamos, parece que estamos a ir no bom sentido. A única crítica que subsiste é a questão da entrada do hotel no Céu de Vidro. Seremos sempre frontalmente contra essa solução porque para os caldenses o Céu de Vidro é muito emblemático e não é aceitável que o privatizem.

GC E no vosso projecto também seria a Câmara a gerir o Hospital Termal?
LP – Não. Defendemos um modelo assente numa entidade pública autónoma, porventura uma fundação, que tivesse no seu seio o Ministério da Saúde (dava-nos conforto termos o know how do Ministério da Saúde e já agora o aspecto financeiro do Estado central). O Ministério da Saúde não se pode demitir da gestão de um hospital… Às vezes esquecemo-nos que nós temos aqui um aspecto diferenciador nas nossas termas que é o hospital. Não vale a pena dizermos que as termas vão ser geridas pela Câmara das Caldas tal como outras são porque estas não são umas termas quaisquer. Têm um hospital e outras não.
Portanto, seria uma entidade que reuniria o Ministério da Saúde, a Câmara Municipal e uma IPSS com know how de gestão no termalismo. O património ficaria todo ele, uno, na posse dessa entidade e evitava-se o espartilhamento que existiu). E por outro lado assegurava-se que o Termal estaria no Serviço Nacional de Saúde.

GC – E essa entidade seria uma fundação?
LP – Poderia ser uma fundação ou uma associação.

GC – E uma empresa municipal?
LP – Não excluiríamos isso, mas seria mais arriscado fazê-lo. Admito que num primeiro momento de arranque exista um saldo negativo nas contas do Hospital, mas uma empresa municipal não pode ter mais do que dois anos seguidos de contas negativas. Por isso, uma fundação seria a entidade jurídica mais correcta, mas “fundação” é uma palavra um bocado queimada na sequência das polémicas que existiram no passado.

GC – O governo é PS, mas as Caldas é PSD. Para a oposição PS é irrelevante a cor do governo?
LP – Não é irrelevante porque o passado tem-nos dito que assim não é. Nós temos tido governos PS, PSD, PSD/CDS e a perspectiva que temos é amplamente favorável aos governos do PS. Isto sem prejuízo de acharmos que os sucessivos governos não nos têm tratado bem relativamente a algumas matérias, entre as quais a Lagoa de Óbidos, o Hospital Termal e a linha do Oeste. Há que fazer mea culpa em todos os partidos que estiveram no governo, mas também fazer mea culpa dos próprios intervenientes políticos locais, de todos os partidos, pela falta de peso político para conseguir inverter algumas das decisões que não foram tomadas. Não me custa nada fazer essa mea culpa no que diz respeito ao PS, como também o fez o senhor presidente da Câmara, na última Assembleia Municipal, relativamente ao PSD. E outros partidos seguramente me acompanhariam nisto. A verdade é que nós não temos deputados das Caldas na Assembleia da República e isso é um problema.

“O Cavaquistão não é em Viseu. É em Leiria.”

GC – Por que motivo, em 40 anos de Democracia, o PS nunca conseguiu quebrar, nem mesmo beliscar, a hegemonia do PSD nas Caldas da Rainha?
LP – Bom… Há aqui razões do fórum sociológico. Nós somos uma zona fortemente conservadora… E depois houve aqui um primeiro momento no início do poder local, que foi decisivo, quando nas primeiras eleições autárquicas o PSD ganha por 200 votos ao PS. A partir daí houve uma fase importantíssima de construção de infraestruturas básicas de água, saneamento, electrificação, etc.

GC – Mas acha que tantos anos depois o PSD ainda estará a facturar votos à conta disso?
LP – Está e continuará sempre a facturar isso. Em Ciência Política, quando uma força política está mais de 20 anos consecutivos a gerir, seja um país, seja uma câmara municipal, seja uma região autónoma, já não se considera tecnicamente uma Democracia. Chama-se a isso um regime híbrido. Porquê? Porque o próprio sistema não é capaz de se regenerar, de criar alternância e portanto a Democracia estará como que doente.
É o que acontece nas Caldas. Quantos mais anos está o mesmo partido no governo, mais difícil é para a oposição chegar lá. Porque se cria aqui uma rede de contactos extremamente grande. Reparem que Caldas tem uma coisa extraordinária que é um movimento associativo muitíssimo forte e uma sociedade civil muito activa. Felizmente para nós, porque se não fosse isso, isto seria um marasmo total. E, portanto, é evidente que os contactos amiúde com as próprias associações e o movimento associativo tornam-se numa mola muito forte de apoio à própria autarquia. Essas coisas não são fáceis de dissociar pois as associações precisam da ajuda das autarquias e as autarquias precisam da ajuda das associações. Aliás – e isto é uma questão estatística – uma boa parte das pessoas que fazem parte dos órgãos sociais das associações, faz parte das listas do PSD aos órgãos camarários e juntas de freguesia.

GC – E acha que o PSD tem tendência para usar e abusar desse poder?
LP – Não digo isso. Só digo que é uma tendência natural, para quem está há tantos anos no poder, aqui como noutro lado qualquer em que haja relações, até inter-pessoais, com os membros das associações. E isso tende a dificultar uma inversão, juntamente coma questão sociológica – de facto nós somos um concelho conservador, eminentemente rural e o próprio distrito é conservador. O Cavaquistão não é em Viseu. É em Leiria. É o único distrito onde nas legislativas nunca ganhou o PS.

GC – Ao nível dos empregos e dos estágios na Câmara Municipal das Caldas acha que o PSD tende a pôr lá as suas pessoas, os seus peões?
LP – Eu não queria entrar por aí. As pessoas estão lá. Sabe-se as filiações das pessoas. Isso é público. Não queria entrar por aí…

GC – E o que é público? Que são pessoas ligadas ao PSD?
LP – Umas são ligadas ao PSD e outras não são ligadas ao PSD.

GC – O presidente da Câmara recusou uma entrevista à Gazeta das Caldas para fazer o mesmo que o senhor está aqui a fazer connosco, que é um balanço do primeiro ano de mandato. Quer comentar?
LP – Acho estranho. O senhor presidente lá saberá as razões por que não o fez. Mas é estranho uma vez que, sendo presidente de câmara, e sendo esta entrevista em jeito de balanço, ela é como que uma prestação de contas pública. E portanto, nessa medida, eu não deixo de estranhar essa posição.

“Um chumbo ao modelo de gestão preconizado pela Câmara”

GC – Voltando ao Hospital Termal, qual a leitura política que faz ao chumbo do Tribunal de Contas ao acordo entre a Câmara e o Montepio?
LP – Essa pergunta já contém uma resposta em si – foi um chumbo ao modelo de gestão preconizado pela Câmara. O Tribunal de Contas recusou, através do visto, o modelo de gestão proposto pela Câmara. E aproveito para clarificar a nossa posição [de abstenção] na Assembleia Municipal sobre esta matéria. Acho que é insólito ser a Câmara Municipal a fazer a gestão directa de um hospital termal.

GC – Não vai ser capaz?
LP – Nem ter que ser capaz. Não faz parte das competências de uma câmara municipal gerir hospitais. É ao Ministério da Saúde que compete fazer isso. Dir-me-ão que também há outras câmaras que gerem termas, mas não há outras termas com… um hospital termal! É que isto é um hospital. A menos que se queira tirar daqui o hospital…
Queremos fazer umas termas das Caldas como quaisquer outras? Sem este elemento diferenciador? Não queremos. Mas isto é um hospital. E as câmaras não têm competências para gerir um hospital. Ponto. Agora, por que é que nós nos abstivemos? Porque só há um modelo pior do que este, que é o que nós temos agora, o modelo da agonia do Hospital Termal e o seu encerramento perpétuo. E o superior interesse das Caldas obriga-nos a fazer este equilíbrio difícil, embora tivéssemos vontade de votar contra. Mas somos responsáveis e não queremos hipotecar a abertura do hospital.

GC – Que expectativas tem para a nova administração do CHO?
LP – Tenho de ser optimista porque acho que, de facto, as coisas não correram bem nos últimos anos.

GC – Essa é mais uma daquelas situações em que o PS deve fazer mea culpa?
LP – O PS faz mea culpa. O PS tinha a expectativa de que as pessoas que foram indicadas conseguissem obter outros resultados. Não estou a afastar a responsabilidade do PS (os nomes foram evidentemente indicados pelo PS) e o PS terá, em tese, algumas responsabilidades. No entanto, o Dr. Carlos Sá também foi reconduzido pelo governo PSD. Portanto, quanto muito, aqui haveria que repartir as culpas entre o PS e o PSD.
Mas sobre esta administração as primeiras impressões têm sido globalmente positivas. Têm-me dito que do ponto de vista administrativo, do expediente, que já têm despachado coisas que estavam há meses pendentes. E do ponto de vista das relações humanas entre si, também parece estar a funcionar bem (o que nem sempre aconteceu no passado).

GC – Caldas deveria abdicar do seu hospital em benefício de um bem maior que seria um novo hospital, um verdadeiro CHO, noutro concelho?
LP – As Caldas tem que pensar em primeiro lugar em melhorar as condições do seu hospital e ampliá-lo. Estas obras são importantes, mas não podem ficar por aqui porque senão ficam coxas. Nós temos que pensar já numa segunda fase que é a da ampliação da Medicina Interna porque senão abrimos o gargalo da entrada no hospital, mas depois fica atrofiado o seguimento para a Medicina Interna.
É preciso, pois, continuar a ampliação. Até porque se hoje, porventura, fosse tomada uma decisão de construir um novo hospital, demoraria oito a dez anos a estar aberto. E até lá temos que zelar pelos cuidados de saúde dos utentes.
GC – E a localização do eventual novo hospital?
LP – Naturalmente nas Caldas da Rainha. Existem inúmeras pressões dos nossos vizinhos, do Bombarral, de Alcobaça, de Óbidos, que disputam o coração do Oeste. Mas onde é que fica o coração do Oeste? É nas Caldas da Rainha. As Caldas nasceu da saúde, vive muito em torno da saúde, o hospital é o principal empregador deste concelho e é um equipamento absolutamente decisivo para o seu desenvolvimento. Portanto nós não podemos abdicar dele. É a nossa História, é o nosso sangue, são as nossas raízes. Nós nascemos da saúde, não podemos nunca abdicar dela.

GC – Faz sentido continuar com o mega agrupamento Rafael Bordalo Pinheiro, ou acha que Santa Catarina deveria reganhar a sua autonomia?
LP – Achamos que deveria voltar ao modelo que existia anteriormente e de sair deste mega agrupamento, por razões de critério de proximidade e da continuidade do percurso académico. Sim, somos da opinião de que é excessivo.

GC – Como vê a forma como o governo está a fazer a descentralização de competências?
LP – Por princípio sou favorável à descentralização. Tal como seria favorável, já agora, à regionalização (e ainda tenho esperança que esse processo seja recuperado no próximo mandato). Mas a descentralização é uma grande oportunidade de aprofundar o poder local e de racionalizar os meios. Mas é evidente que vem alterar todo o edifício administrativo.
GC – E acha que o cheque que está previsto é suficientemente generoso?
LP – Pois a questão é essa. É a pergunta de um milhão de dólares. Neste momento há apenas um estudo meramente indicativo da Associação Nacional de Municípios, que prevê 4,5 milhões de euros para as Caldas e que, aparentemente, poderá ser curto nalguns sectores.
Mas esse valor não está fechado, o próprio presidente de Câmara já o disse.
Gostaria, no entanto, de salientar que a partir de 2021 a descentralização será universal. Até lá é facultativa e há um processo gradual de adaptação, em que à medida que os 21 diplomas sectoriais vão saindo, as câmaras ficam a saber as competências e os valores. Depois têm 70 dias para responder à Direcção Geral das Autarquias Locais se aceitam ou não.

GC – Mas as Caldas já fez saber que não vai aderir nesta primeira leva.
LP- Já o fez saber e precipitadamente, porque não tinha de o fazer. Não quisemos fazer um cavalo de batalha disso, até aderimos a essa deliberação porque era muito em cima da hora.
Não foi uma decisão política, foi técnica, não se aderir em 2019. Mas na verdade é uma decisão inócua porque as decisões têm que ser sector por sector, diploma sectorial por diploma sectorial e ainda não veio nenhum à sessão de Câmara para deliberação.

GC – A Linha do Oeste está no estado em que sabemos. O que poderia o município fazer para evitar o descalabro a que chegou?
LP – A Câmara das Caldas sozinha não pode fazer grande coisa em relação à Linha do Oeste, mas, na minha óptica, podia fazer mais. O que eu faria se fosse presidente da Câmara era pegar no carro e ir fazer lobby pela positiva junto dos presidentes de Câmara dos municípios que são atravessados pela Linha do Oeste. E ter também intervenção na CIMOeste e até nos partidos que sustentam os municípios do Oeste, no sentido de, em conjunto, fazermos mais peso para inverter este problema.
GC – A fraca promoção turística das Caldas também tem sido criticada pelo PS. O que pode ser feito?
LP – Aumentar o orçamento para o Turismo. Este ano temos cerca de 15 mil euros orçamentados para o Turismo e no ano passado tivemos 10 mil. E esse valor não chega a esgotar no final do ano. Isto diz tudo sobre o que é verdadeiramente a prioridade que esta Câmara dá ao turismo, que é zero.
Esse dinheiro é gasto basicamente na limpeza das ruas e das praias.

GC – Como se pode potenciar, a nível turístico, o concelho?
LP – Com reforço do marketing territorial e de uma visão intermunicipal sobre esta matéria. Não faz sentido as Caldas estarem de costas para Óbidos ou para a Nazaré, Peniche ou Batalha, concelhos que também têm potencial turístico.
Temos tanto potencial que faria sentido uma concertação do ponto de vista intermunicipal da oferta cultural. Também é preciso investir nas infraestruturas, numa regeneração urbana a sério e não nestas brincadeiras que andam a fazer e que está à vista de todos que foi dinheiro que enterramos. Não melhoramos significativamente, excepto no saneamento, que é o que não se vê.
Também descoramos o concelho nas questões ambientais, temos linhas de água a passar a céu aberto na cidade que ainda continuam poluídas, as entradas da cidade continuam feias, as ruas estão esburacadas.
É também preciso fazer promoção, colocar as Caldas no mapa, indo a feiras no estrangeiro e em Portugal e fazer publicidade nos meios de comunicação social.
GC – O PS tem sido crítico da política fiscal. A que se deve esta divergência?
LP – Tenho sido crítico em determinados sectores, noutros concordo, como é o caso da proposta de taxa mínima de IMI. Se a Câmara tem uma boa saúde financeira, não faz sentido castigar as pessoas do ponto de vista fiscal.
A crítica prende-se com a devolução do IRS, em que a Câmara poderia devolver 5% do valor aos cidadãos e actualmente retém 3% e devolve 2% aos munícipes.
O Dr. Tinta Ferreira quando concorreu à Câmara propalou amiúde que tínhamos os impostos mais baixos do Oeste e depois de vencer as eleições aumentou-os. Na altura a Câmara ficava com 2,5% e devolvia outro tanto, e agora passou a ficar com 3%. A proposta que fiz foi a de voltarmos a esse momento, da Câmara ficar com 2,5%.
Se tomarmos por referência o valor que a Câmara recebeu de IRS, de 1,135 milhões, deixaria de receber 189 mil euros. Este impacto orçamental é muito pouco significativo, aliviava as pessoas e ajudava a aumentar o consumo interno.

GC – O Orçamento Participativo foi uma proposta do PS. Acha que não está a ser suficientemente acarinhado?
LP – O grande problema do Orçamento Participativo é que a Câmara se sentiu constrangida, na altura, a ter que o aceitar, mas nunca acreditou na democracia representativa. A Câmara acha que é dinheiro mal gasto, que as pessoas não ligam nada a isto. Como disse o presidente da Junta de Salir de Matos, Rui Jacinto, numa Assembleia Municipal, é uma vergonha ter um orçamento participativo com um orçamento superior ao de uma junta. Esta é a verdadeira visão, que não há coragem de assumir por parte do PSD local. Eles não querem o Orçamento Participativo, é um mal que têm que sustentar.
Temos sido nós, PS, na Câmara, a puxar sempre pelos montantes, porque eles não acreditam.

GC – A segunda fase das dragagens ainda não avançou e a Câmara nem sequer consegue contactar a APA. O que o PS caldense pode fazer junto do governo do PS?
LP – Esse é um assunto que nos preocupa porque deveria estar a ser lançado o concurso para as obras começarem em 2019 e não temos conhecimento de que este tenha sido lançado. Não sei as razões pelas quais o senhor presidente da Câmara não consegue contactar o presidente da APA, mas não deixo de estranhar que não o consiga. Se eu fosse presidente de Câmara seguramente que o conseguiria porque quando quero vou, quando não quero telefono.

GC – E o PS local poderia fazer alguma coisa nesse sentido?
LP – O PS local tem estruturas distritais e nacionais com quem tem canais. Temos vários mecanismos e fazemos isso amiúde, mas em política não é quem fala mais alto quem tem razão. Eu poderia vangloriar-me de coisas que a título pessoal fiz, mas não tenho que o dizer. O ponto é procurar ajudar.
Contacto com os deputados do distrito, se não diariamente, por vezes mais de uma vez por dia sobre as mais diversas matérias, como esta da Lagoa, a Linha do Oeste, o Hospital Termal, o CHO.
Também já tenho ido a ministérios falar com ministros e secretários de Estado.
GC – Acha normal que o Centro de Gestão Agrícola de Alvorninha receba mais de um terço do orçamento destinado à Feira da Fruta?
LP – Não acho normal. Perguntei na sessão de Câmara e fiz uma declaração de voto sobre essa matéria. Não tenho nada contra o Centro de Gestão de Alvorninha, mas não deixámos de notar que uma fatia muito importante da organização, da promoção e até do próprio marketing da feira, lhe esteja atribuído.
Não está em questão o dinheiro, mas as competências que lhe estão atribuídas na organização da feira, que me parece que extrapolam aquilo que seria o seu know how. Não estamos a dizer que está mal gerido ou que é muito dinheiro, o que questionamos é porque é o Centro de Gestão a gerir, por exemplo, o marketing e publicidade da feira? Não me parece que esteja propriamente vocacionado para esse efeito.

GC – Está confiante na candidatura das Caldas a Cidade Criativa 2020?
LP – Sou um optimista por natureza, vou torcer, mas não me parece que seja uma candidatura fácil.

GC – Vai ser candidato à Câmara daqui a três anos?
LP – Não sei o que vai ser o meu almoço amanhã, quanto mais o que farei daqui a três anos.

GC – Qual o livro que está a ler?
LP – Guerra e Paz, de Lev Tolstoi.

GC – E o último filme que viu no cinema?
LP – Acho que foi a Missão Impossível.

 

“Agregação de freguesias foi feita por motivos eleitoralistas”

 

GC – As uniões de freguesia, que foram formadas à força durante o período da troika, deverão manter-se?
LP – Quem tem de ter uma palavra decisiva sobre esta matéria são as populações. A minha percepção é que se fizessem um referendo local em Salir do Porto, Serra do Bouro e S. Gregório, as populações diriam que sim, que gostariam de voltar a ter um presidente de Junta só para a área da sua freguesia.
Há duas hipóteses nesta matéria: ou se espera que o governo aprove a lei de definição dos critérios até ao final do mandato (como o ministro Eduardo Cabrita assumiu que o faria), ou então por via de iniciativa legislativa na Assembleia da República.

GC- E acha que o PSD local aceita essa sua visão?
LP – O PSD é que cozinhou esta agregação, agora não vai recuar.

GC – Agregou porque foi obrigado.
LP – Foi obrigado por questões políticas e meramente eleitoralistas. Mas faz algum sentido S. Gregório agregar-se a Nª Sra. do Pópulo? Só numa perspectiva – para que o PSD nunca mais perca a junta de freguesia de Nª Sra. do Pópulo! Com Sto. Onofre aconteceu o mesmo. Como o PS disputa sempre aquela freguesia taco a taco com o PSD, e Serra do Bouro é mais favorável ao PSD, aquilo foi uma forma de procurar inviabilizar que o PS vença em Sto. Onofre. Os critérios foram meramente eleitoralistas.

GC – Logo não é de esperar que o PSD nas Caldas dê voz ao povo para que as juntas de freguesia voltem a recuperar a sua autonomia?
LP – Evidentemente que não.

 

Contra um hipermercado que procura concorrer com o comércio tradicional

GC – Qual a sua alternativa para a antiga fábrica da Secla?
LP – Não concordamos com mais uma grande superfície comercial naquele espaço. São mais de 3 mil metros quadrados de área comercial, sendo que o Lidl 2 também já fez um pedido de informação prévia, para se instalar na antiga Secla 2. Ou seja, a cerca de 200 metros de distância vamos ter mais de 6000 metros de área de construção de comércio.
Somos contra mais um hipermercado e entendemos que, sobretudo este, que é o Bonjour (Continente), procura concorrer mesmo com o comércio tradicional e descentraliza o centro da cidade. Do ponto de vista da mobilidade e da circulação dos automóveis, convida as pessoas a saírem, o que significa desertificar a zona central.
Também nos opomos à falta de preservação da memória colectiva da Secla, porque o projecto prevê manter apenas o pórtico, com uma estrutura metálica atrás, com um banquinho nas traseiras, com vista para o parque de estacionamento com 156 carros e do outro lado tem o cemitério.
Nós queríamos a preservação de, pelo menos, o edifício central da Secla porque ali podíamos, como contrapartida do próprio promotor em conjunto com a Câmara, colocar ateliers e manter aquele espírito vivo da criatividade da Secla.

GC – Como acha que a Câmara lida com o património industrial caldense?
LP – Não lida. A Câmara não tem iniciativa sobre isso, assim como não tem iniciativa sobre coisa nenhuma. De uma forma geral tudo o que acontece nas Caldas é por iniciativa privada. Felizmente que temos uma sociedade civil e um movimento associativo muito forte, porque senão esta cidade, de parada passaria a cidade fantasma. Mas garanto que as contas da Câmara estariam certíssimas.
Uma das críticas que faço à Câmara é a de falta de pro-actividade. O presidente deveria contactar mais empresários, instituições de ensino superior e sair para captar investimento. Mas este não pode ser a todo o custo. Investimento em mais hipermercados, não obrigado.

- publicidade -