O calendário não deixa enganar, chega Fevereiro e começam-se a contar os dias até ao Carnaval. Nesta altura, enchem-se as ruas para assistir aos desfiles que têm como principal atracção os carros alegóricos e os foliões. Os grandes protagonistas são as colectividades que participam nos corsos e, para quem, a festa de três dias começa antes do início do ano.
É preciso desenhar os fatos, costurá-los, pensar na decoração do carro e distribuir tarefas. Uma coisa é certa: é do suor dos voluntários que nasce o desfile. Gazeta das Caldas acompanhou os preparativos dos Pimpões e do Grupo Desportivo do Landal, duas associações que, já amanhã à noite, estarão na rua a animar o corso.
É sexta-feira, 22 de Janeiro, e são nove e meia da noite. À sala multiusos da Sociedade de Instrução e Recreio os Pimpões começam a chegar os primeiros voluntários, não mais de cinco pessoas. Distribuem-se por quatro mesas e preparam a linha de montagem que irá funcionar ao longo da noite. É preciso que um grupo se encarregue de desenhar os frutos nos tecidos, com a ajuda de moldes pré-elaborados. Há peras, maçãs, morangos e laranjas, uma vez que o tema sugerido pela Câmara foi a Hortofruticultura.
“Passa-me a tesoura”, pede um dos voluntários, que esta noite tem em mãos a tarefa de cortar as figuras desenhadas e passá-las ao posto seguinte, onde três pessoas juntam com alfinetes o tecido de plástico a outro esponjoso com a mesma forma. No fim da linha está Celeste e a sua máquina de costura, que une os dois tecidos. Os frutos que estão concluídos vão sendo agrupados no chão. Laranjas para um lado, peras para outro, de modo a evitar misturas e erros na contagem.
Entretanto, as quatro mesas já não são suficientes para os restantes voluntários que vão entrando. As 15 pessoas na sala vão-se distribuindo pelos diferentes postos, dando vazão às tarefas que precisam de mais mão humana. “Não há mesa, trabalhamos no chão”, desenrasca-se Ricardo Ferreira, um estreante no desfile dos Pimpões. Na opinião do voluntário, “com um bocadinho de boa vontade, tudo se faz, independentemente de haver mais ou menos recursos. Isto é como ter sopa para 10, mas se chegaram 15 os outros cinco também comem”.
Idosos, adultos e crianças, todos trabalham com o mesmo objectivo: levar os Pimpões à rua para celebrar o Carnaval. Ana Maria, ajudada pela neta no “posto dos alfinetes”, não faltou a nenhuma das quatro edições em que a colectividade participou. Por um lado, “o trabalho faz-se com gosto”, por outro, “é muito stressante porque há muita gente a desfilar mas pouca a ajudar nos preparativos”. Este ano, desfilarão pelos Pimpões 70 adultos e 20 crianças, sendo que nos preparativos colaboram cerca de 20 voluntários.
Carnaval une a associação
As primeiras ideias para o desfile surgiram logo em Novembro, quando a Câmara convidou as associações caldenses a inscreverem-se para o corso. Para Teresa Marques, presidente dos Pimpões, “o Carnaval é uma oportunidade para criar laços entre os utentes e a direcção, pois nestes dias convivemos todos de igual para igual”.
Ao mesmo tempo, a participação no desfile assegura às colectividades um subsídio, atribuído pela autarquia. “É uma alavanca importante às nossas despesas, por isso tentamos gastar o menos possível”, adianta a responsável, acrescentando que os custos com o carro alegórico representam a maior fatia da despesa. Isto porque a associação trabalha com um artista plástico caldense, Nuno Bettencourt, que ficou encarregue de construir uma cesta em madeira que decorará o veículo (cedido pela empresa A. Marques) e os dois gigantones que simbolizam vendedores da Praça da Fruta. “Este serviço tem que ser pago, embora o valor seja simbólico”, explica Teresa Marques.
Quanto ao custo dos fatos, este é minimizado porque cada pessoa paga o seu próprio disfarce. “Se calhar não conseguimos fatos muito elaborados, mas conseguimos a boa vontade das pessoas que é o mais importante”, conclui a presidente, realçando que é essencial que o material utilizado seja prático e quente, caso São Pedro faça das suas.
O Carnaval do Landal vive do improviso
A uma semana do primeiro desfile, ultimam-se os preparativos no Grupo Desportivo do Landal. No armazém da empresa Floresta Pronta, ao lado da sede da associação, os trabalhos concentram-se no carro alegórico, emprestado pela ReciPremio. Daqui a uns dias, a viatura estará transformada na Frutaria Pinto da Costa.
O cabeçudo, uma obra de Joaquim Gomes, não deixa enganar. Parece mesmo o presidente do Futebol Clube do Porto. “Quisemos aproveitar o tema para fazer uma crítica e, ao mesmo tempo, brincar um bocadinho. Aqui há uns anos surgiu a polémica que o Pinto da Costa oferecia “fruta” aos árbitros… fruta que eram meninas”, explica Joaquim Gomes, responsável pelos fatos.
Pelo grupo desportivo, desfilarão 30 pessoas, entre as típicas frutas (ananases, cerejas, maçãs, laranjas e morangos), os árbitros e a “fruta do Pinto da Costa”, representada pelas matrafonas. Com as mãos na massa, a trabalhar nos preparativos, estão oito voluntários, a maioria da direcção.
Embora se reúnam uma vez por semana, a maior parte do trabalho é adiantado em casa. “Como não somos muitos, distribuímos as tarefas por todos e cada um vai fazendo um bocadinho. Assim não andamos à espera uns dos outros”, adianta Joaquim Gomes, salientando que são os “talentos” de cada voluntário que definem a atribuição das funções. No seu caso, o jeito para as artes plásticas valeu-lhe o cabeçudo Pinto da Costa.
Poucos dias antes do desfile, monta-se o puzzle com todas as peças. O mais importante, realça Tiago Rosa, presidente da colectividade, “não é que esteja tudo certinho, mas sim que as pessoas se divirtam”. É isso mesmo, “o Carnaval do Grupo Desportivo do Landal é trapalhão e vive da improvisação”, acrescenta o representante. É provável, por exemplo, que coreografia da música “Comeram a Fruta” (Bonga) seja ensaiada minutos antes do início do corso, “mas assim é que tem graça”.
Há sete anos por estas andanças, Tiago Rosa sublinha que o grupo decidiu aderir ao Carnaval das Caldas para “associar o gosto que a freguesia tem por esta altura do ano aos apoios camarários”. Do bolso da autarquia, a colectividade recebeu 2000 euros, um valor “essencial” à sua manutenção, mas que, nas palavras do presidente, seria insuficiente caso a associação suportasse todos os custos do desfile. “Vale-nos o apoio de empresas, mas principalmente a contribuição monetária de alguns voluntários”.