Já não são só as avós que têm habilidade para a costura. Há uma nova geração, a dos netos, que se tem rendido cada vez mais às agulhas, às linhas e aos tecidos. São jovens na casa dos vinte e poucos anos (até mais novos) e vêem na arte da costura uma oportunidade para personalizarem o seu guarda roupa, para passar o tempo – há quem lhe chame terapia – ou mesmo para lançar pequenos negócios.
Coser voltou a estar na moda há cerca de cinco anos e com isso dispararam os cursos de costura, embora estes não sejam uma novidade. Existem há anos, desde o século passado, mas agora chamam-se workshops.
Entramos no Planeta dos Tecidos a um sábado à tarde e a azáfama é grande. À medida que vão cortando tecido e atendendo os clientes, as irmãs Inês e Elisabete Silva arranjam um tempinho para conversar connosco. Acenam quando lhes perguntamos se o interesse pela costura por parte dos jovens é uma realidade e explicam que tem vindo a crescer principalmente porque “eles estão fartos de andar todos vestidos de igual e encontram na costura uma forma de personalizar o seu guarda roupa”.
Os rapazes nem tanto, mas são cada vez mais as jovens que procuram workshops de costura para aprenderem o básico. Algumas aventuram-se a costurar de raiz todo o tipo de peças de roupa, mas a maior parte limita-se a transformar vestuário que já tem em casa ou que compra nas lojas.
“Quando são elas a fazer não há dúvida que quase sempre sai mais barato e compensa pela qualidade dos tecidos”, diz Elisabete Silva, acrescentando que a chegada do Verão tem motivado a que muitas raparigas se dediquem à confecção de fatos de banho. “Associados aos biquínis compram também tecidos para fazerem as toalhas, bolsas e páreos com padrões a condizer”, salienta a responsável do Planeta dos Tecidos.
No dia anterior, as funcionárias da loja ficaram boquiabertas quando atenderam uma menina de nove anos que queria comprar tecidos para criar os seus próprios calções, tops e biquínis. “Foi uma miúda que acompanhou a mãe num curso de costura e acabou por aprender também. Chegou aqui e decidiu sozinha que tecidos queria, explicando-nos que gostava de fazer a sua roupa para marcar a diferença”, conta Elisabete Silva, que realça o papel importante das escolas no incentivo à iniciação na costura em tenra idade.
De ano para ano, assim que se aproxima a altura dos bailes de finalistas, há também cada vez mais adolescentes que chegam à loja à procura de tecidos para confeccionarem os seus vestidos. Algumas vêm com desenhos na mão, mostrando os modelos que elas próprias idealizaram, ou então com fotografias de vestidos que encontraram na internet e que pretendem adaptar ao seu gosto.
“Depois há muitas jovens mamãs que aprendem a costurar para criarem o enxoval do seu bebé e hoje em dia é possível fazer tudo. Desde as almofadas de amamentação, sacos, babetes, fraldas e roupinhas, até porque há tecidos próprios para as peles dos bebés”, realça Inês Silva, que entretanto é chamada a atender uns clientes que acabam de entrar na loja. Mesmo a propósito, são duas jovens.
Joana Fragoso vem acompanhada de uma amiga e tem 21 anos. “Procuro tecidos para aplicar em almofadas e fazer uns peluches para um projecto que tenho que apresentar na escola”, disse a jovem que é estudante de Design Gráfico na ESAD e começou por aprender croché com a avó, tinha uns 11 anos. Pouco tempo depois estreou-se no primeiro workshop de costura e actualmente já cria artigos para venda.
Oportunidade de negócio
A costura como oportunidade de negócio também é uma realidade. Muitas vezes começa apenas como um hobby – há quem lhe chame terapia – mas acaba mesmo por tornar-se num mini negócio que é conciliado com outras actividades profissionais. Foi o que aconteceu com as caldenses Joana Casimiro e Margarida Sousa, duas amigas de 23 anos que no início de Abril lançaram a Maju, um projecto online de venda de swimwear.
Antes de iniciarem esta aventura, pouco ou nada sabiam de costura. “Sabíamos fazer pequenas coisas, principalmente porque no Carnaval tínhamos iniciativa de fazer os nossos próprios fatos, mas pouco mais”, conta Joana Casimiro, que chegou a frequentar um workshop para aprender técnicas básicas.
Inicialmente o objectivo era apenas fazerem os seus próprios fatos de banho, mas concordaram que se a experiência corresse bem podiam tentar vender alguns modelos online. Quando terminaram as licenciaturas, decidiram que era altura de dar o primeiro passo e investiram cada uma 250 euros numa máquina de corte e cose.
Depois foram necessários dois meses e meio de cose e descose para chegarem às medidas certas. “Eu desenhava os moldes e a Joana testava em tecido, mas foram precisas várias tentativas até chegarmos aos moldes finais. Mesmo agora sinto que vamos aperfeiçoando cada vez mais as nossas técnicas”, diz Margarida Sousa, revelando que actualmente conseguem confeccionar dois fatos de banho e dois biquínis por dia.
Em vez de optarem por criar uma colecção, as duas amigas disponibilizam online os padrões e os modelos das peças, deixando ao cliente a tarefa de escolher as combinações. “Nunca quisemos escolher pelas pessoas, preferimos que elas personalizem a seu gosto porque é essa possibilidade que falta lá fora, nas lojas”, realça Joana Casimiro, que está a terminar o mestrado em Gestão de Qualidade e Segurança Alimentar. Já Margarida Sousa, licenciada em Gestão Hoteleira, trabalha num restaurante aos fins-de-semana.
Embora conciliem o projecto com estas actividades, a dupla faz questão de ter um horário de trabalho de forma a dar uma resposta mais eficiente às encomendas. Estão no atelier das 9h00 às 13h00 e das 15h00 às 19h00 de segunda a sexta-feira. O tempo que dedicam à Maju não é só passado a coser, mas também a gerir as redes sociais onde divulgam os seus fatos de banho, principalmente o Instagram (www.instagram.com/maju.onlinestore/) onde já têm mais de 4000 seguidores. “Não tínhamos a noção que íamos ter tanta gente a contactar-nos apenas por curiosidade, mas que depois não chegariam a avançar com a compra. Independentemente disso, temos que dar resposta a toda a gente e há dias em que recebemos mais de 10 mensagens”, conta Joana Casimiro.
Uma ferramenta para a faculdade
Aprender a costurar pode também ser uma mais valia para quem pretende estudar moda. Foi assim com Margarida Runa, 21 anos, que nem gosta muito de costura mas frequentou um curso nos Pimpões porque sabia que os conhecimentos poderiam ser-lhe úteis quando iniciasse a licenciatura em Design de Moda.
Em seis meses, “aprendi não só a costurar como a fazer moldes de várias peças de roupa e a adaptá-los a diferentes tamanhos, por isso o workshop ainda foi mais útil do que pensava inicialmente”, diz a jovem, que no futuro pretende criar a sua própria linha de vestuário.
No caso de Margarida Runa, a costura fará parte do seu percurso profissional, mas a estudante reconhece que é “uma mais valia para qualquer pessoa, até porque é uma competência que confere aos jovens autonomia no dia-a-dia: compram umas calças, precisam de fazer uma bainha e já não precisam de ir à costureira”, salienta.
Antes de frequentar o workshop, Margarida pensava que a costura era um bicho de sete cabeças, mas assim que começou a ir às aulas, “apercebi-me que basta um pouco de treino para que o mecanismo seja quase automático”. Basta ser paciente.
O empurrão dado pela crise
Há cinco anos para cá Mário Felizardo tem notado um aumento da procura de máquinas de costura pelos jovens. O representante da Bernina em Portugal – que tem loja nas Caldas – salienta que os adolescentes optam por máquinas de iniciação (há opções a partir dos 179 euros) enquanto que os jovens desempregados, já com algum fundo de maneio, preferem investir em máquinas mais caras, muitas vezes para montarem negócios ligados à costura.
Os workshops de iniciação e os de costura criativa são os mais procurados e as motivações voltam a ser as mesmas: “é uma forma de se diferenciarem através da roupa, um hobby e também uma oportunidade para amealhar mais uns euros ao final do mês”, diz Mário Felizardo, acrescentando que a crise também contribuiu para que a arte da costura voltasse a ser moda. “É que se calhar antes um fecho estragava-se e as pessoas compravam umas calças novas, mas com a crise, muitos preferiram aprender a costurar e gastar cinco euros num fecho em vez de 35 num par novo de calças”, explica o responsável.