O novo hospital deverá ficar localizado num centro urbano, com uma boa rede de mobilidade e saber-se a área que deve servir, defenderam os especialistas, que consideraram o estudo efetuado “redutor”
Caldas da Rainha, Torres Vedras ou Santarém. Estes são os maiores centros urbanos da região e, de acordo com Sérgio Barroso, diretor do Centro de Estudos e Desenvolvimento Regional Urbano e especialista na área do Ordenamento do Território, deverá ser um deles a acolher o novo Hospital. O orador convidado a participar no debate “Cuidados hospitalares no Oeste – um novo hospital”, que decorreu no passado sábado no CCC, promovido pelas autarquias das Caldas, Óbidos e Rio Maior, defendeu que o equipamento deve localizar-se numa área densamente povoada, tendo em conta o conjunto de serviços que tem para oferecer e para que este seja um factor de dinamização económica.
Crítico das decisões sobre os investimentos públicos em Portugal, que foram sistematicamente vistos sob uma ótica sectorial, Sérgio Barroso, entende que o hospital ainda não foi feito porque não houve capacidade orçamental do Estado para isso. E, se prestar serviços de saúde é a missão prioritária do hospital, há outras dimensões que devem ser consideradas, como é o facto de ser uma unidade empregadora, pelo que o aglomerado que o recebe tem de oferecer serviços, habitação, equipamentos de apoio e escolas para que os seus funcionários possam ter um quadro de vida de proximidade e qualidade. “É incompreensível que localizamos um hospital em que todos os seus recursos humanos se vão deslocar 50 ou 60 quilómetros”, disse. Outras questões a serem ponderadas prendem-se com a dimensão turística e a procura sazonal, económica e de mobilidade. “A articulação entre o sistema hospitalar e o transporte ferroviário é fundamental, até como desbloqueador e acelerador da recuperação, que é vital, da Linha do Oeste”, exemplificou.
A idade, provecta, da rede hospitalar foi destacada por Durão de Carvalho, membro do conselho de redação da TecnoHospital, dando conta que o conjunto de hospitais que compõem o CHO apresenta uma média de 53 anos. Acresce que este “centro hospitalar é particularmente ineficaz”, disse, dando conta que cerca de 50% dos utilizadores não utiliza o centro hospitalar da sua área de residência. “Este centro hospitalar pela dispersão gera necessidades de recursos humanos superiores àqueles que seriam necessários para uma unidade da mesma dimensão”, disse, acrescentando que estas são boas razões para se construir uma nova unidade. De acordo com Durão de Carvalho, o novo equipamento deverá ter cerca de 400 camas, 47 gabinetes de consulta, 11 salas de bloco operatório, um hospital de dia polivalente para a área de Oncologia, deve ter uma unidade de hemodiálise e uma urgência médico-cirúrgica. A área previsível de construção ronda os 60 mil metros quadrados, com um custo que andará na ordem dos 130 milhões e um equipamento de 40 milhões, para criar um hospital “muito semelhante ao de Loures”.
Caldas,Óbidos e Rio Maior
O historial do hospital das Caldas e os procedimentos feitos na defesa da localização nas Caldas da Rainha foram apresentados pelo deputado da Assembleia Municipal, António Curado, e o presidente da Câmara, Vítor Marques. Reiteraram que querem um equipamento a integrar a Rede Nacional Hospitalar e deixaram a garantia de que as Caldas não irá desistir desta luta. Uma causa que é também de Óbidos e agora de Rio Maior, com o presidente da Câmara, Filipe Santana Dias, e a presidente da Assembleia Municipal, Isaura Morais, “completamente articulados” com esta posição. A antiga presidente de Câmara, Isaura Morais, manifestou a sua “preocupação” pelo facto de Rio Maior não ter sido ponderado nos critérios do estudo e considera que esta é a altura certa para se fazer esta discussão.
A proximidade de Rio Maior às Caldas em termos de saúde (embora tenha Santarém como hospital de referência) foi destacada por Filipe Santana Dias, que não compreende como o seu concelho ficou de fora do estudo, quando foram incluídas freguesias de Mafra que “nem utilizam o CHO”. O autarca reiterou o convite que fez ao ministro da Saúde para conhecer a realidade deste território e manifestou que esta é uma causa que une todo o espetro político rio maiorense. “Afastar para sul o centro hospitalar do Oeste é não só concentrar alternativas onde elas já existem como é prestar um pior serviço a Rio Maior”, defendendo a permanência do hospital nas Caldas.
A atratividade e permanência dos profissionais de saúde na região são uma preocupação para o autarca Filipe Daniel, que defende que a nova unidade deve estar munida da academia. Acrescenta também os bons acessos que a localização Caldas/Óbidos permite, nomeadamente através da linha ferroviária, o combate à descarbonização, e a forte procura turística por parte deste território.
Estudo “é insuficiente”
Manuel Delgado professor na Escola de Saúde Pública de Lisboa e antigo secretário de Estado da Saúde começou por dizer que o estudo encomendado pela OesteCIM à Universidade Nova “está aceitável” e que todas as suas componentes técnicas partem de pressupostos objetivos. “O relatório apresentado é sério, tem conclusões, aponta um caminho”, referiu durante a sua intervenção. No entanto, no final do debate, questionado por um elemento da plateia sobre se aceitava o estudo para tomar uma decisão, o ex-governante reconheceu que este “é insuficiente”.
Para Manuel Delgado entre as limitações estão a falta de análise das diferenças das necessidades da população, bem como da procura hospitalar, não identificando as principais patologias das pessoas que consomem cuidados hospitalares, nem as respetivas idades e concelhos de residência. Também não pondera o peso das deslocações para os hospitais centrais.
Manuel Delgado defendeu um modelo de hospital diferente do previsto no estudo, propondo um conceito de hospital único, com unidades satélite, de pequena dimensão, para atividade ambulatória a funcionar nas zonas mais populosas. Deixou ainda nota para a possibilidade de uma unidade local de saúde no Oeste.
Decisão em março?
O ministro da Saúde, Manuel Pizarro, anunciou que em finais de março decidiria a localização do novo hospital do Oeste. Mas esta é também uma decisão que não reúne consensos. Se para os presidentes da Câmara de Óbidos e também das Caldas este é um prazo que deve ser respeitado, para outros, como Sérgio Barroso, o que importa é um bom modelo de decisão, “que não se faz para tomar decisões em março”. O especialista em Ordenamento do Território defende que é necessária uma “decisão sólida, clara e inequívoca”. A acompanhá-lo está, por exemplo, o vereador socialista na Câmara de Rio Maior, Miguel Paulo, que, no debate, reconheceu que a data é apertada porque “existem, pelo menos, 120 mil habitantes de Rio Maior que não foram ouvidos e que o merecem ser”. O também presidente da concelhia socialista fez saber que “quando temos urgência num prazo a primeira coisa que nos ocorre é impugnar o prazo e assim acaba a urgência”, e incentivou à realização de um estudo técnico para entregar ao decisor.
Já para Filipe Daniel, presidente da Câmara de Óbidos, a pergunta que se impõe, a partir de 31 de março, é quanto tempo levará até estar no Orçamento de Estado e quando será feito. “Se os chineses fazem um hospital em 10 dias não vamos levar 10 anos a construí-lo, porque a necessidade urge”, ironizou.
Entre o público, José Marques Serralheiro, antigo administrador hospitalar e mentor do Hospital Oeste Norte, manifestou que as “Caldas não tem sabido querer este hospital”, avançando que a solução mais adequada é a construção de dois equipamentos, um nas Caldas da Rainha e outro em Torres Vedras. Também o antigo presidente da Câmara das Caldas, Fernando Costa concordou que esta solução e deixou críticas às escolhas do estudo, que recomenda “como segunda localização Campelos, que está a 20 quilómetros de Torres Vedras e cuja vila mais próxima é Bombarral, a 13 quilómetros”. Referindo-se ao despacho do ministro Manuel Pizarro, de criação do grupo de trabalho, classificou-se de “desonesto” ao integrar a ex-ministra Ana Jorge, que “é parte interessada, porque é autarca na Lourinhã e dirigente do PS em Torres Vedras”.
Foram ainda levantadas questões sobre financiamento para o equipamento, sobre a sua capacidade de expansão, a atratividade dos locais considerados no estudo. Entre os presentes houve ainda quem questionasse os autarcas do oeste sul e se estes se reviam no estudo, ao que o presidente da Câmara caldense respondeu que todos foram convidados a estar presentes, mas que não compareceram. Ausentes na sala estiveram também os vereadores do PSD caldense, mas que acompanharam o debate online. ■