Empresários temem abandono da atividade e crescimento da economia paralela
A aprovação do programa Mais Habitação aplica medidas ao Alojamento Local (AL) que estão a preocupar os empresários do setor. Estes queixam-se que o Governo agiu de forma autoritária e isolada, e temem que as medidas possam condenar a atividade dos pequenos empresários.
“O Governo devia ter feito uma leitura das críticas que surgiram ao diploma, como por exemplo a do Presidente da República”, afirmam Sofia Cardoso e Paulo Matos, empresários de AL que integram um grupo informal de empresários do Oeste.
“Quando o processo entrou em consulta pública, houve muitos contributos de cidadãos que foram ignorados”, diz Sofia Cardoso. Na Assembleia da República, foi entregue uma petição com mais de 20 mil assinaturas e a Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP) entregou vários pareceres jurídicos “que indicam inconstitucionalidades” no programa, mas mesmo assim o Executivo de António Costa mostrou-se intransigente, lamenta Sofia Cardoso.
O que está em causa, aponta a empresária, é mesmo a viabilidade da maioria dos negócios. Uma das ameaças é a cobrança da nova Contribuição Extraordinária do Alojamento Local (CEAL), que incidirá sobre a afetação de imóveis habitacionais a AL e cuja receita será consignada ao IHRU, de modo a financiar políticas de habitação.
Segundo Sofia Cardoso, “a CEAL assenta em rendimento presumido e não real, com valores que podem ir de 30 a 40 euros por metro quadrado do AL, consoante o índice de pressão urbanística. Estamos a falar de um valor demasiado elevado, quando muitos dos empresários têm receitas anuais entre os 6000 e os 12.000 euros”, sustenta, acrescentando que o pacote legal pode conduzir ao aumento da atividade paralela.
O programa também suspende a emissão de novas licenças de AL, excluindo em zonas de baixa densidade populacional, “o que significa que os negócios não podem crescer”, adverte Sofia Cardoso, “além de limitar as licenças existentes até 2030, o que significa que temos um negócio a prazo”.
O diploma determina ainda que as licenças de AL são intransmissíveis, o que levanta outros problemas. “Quando se trata de empresas, qualquer alteração à sociedade significa perda das licenças”, refere a empresária. Outra medida que preocupa os empresários é que as novas licenças só podem ser aprovadas com maioria em assembleia de condóminos.
Sofia Cardoso e Paulo Matos acreditam que o setor está a ser usado pelo Governo como bode expiatório para os problemas na habitação, mas recusam o papel.
Segundo um estudo encomendado pela ALEP de caracterização do setor, 62% dos titulares de AL são pessoas singulares e pequenos proprietários, 80% têm menos de três estabelecimentos, 76% dos AL são de gestão própria, 62% dos proprietários reabilitaram imóveis, dos quais 22% estavam devolutos. “Não somos especuladores imobiliários, somos pessoas que encontraram uma forma de rentabilizar as suas propriedades para terem mais algum rendimento. Não só não tiramos nada a ninguém, como geramos riqueza para o país”, refere Sofia Cardoso.
Estima-se que o AL represente 4,6% do PIB nacional e mais de 100 mil postos de trabalho. No Oeste, o setor gerou no ano passado 14,3 milhões de euros de receita (15,6% dos proveitos do turismo na região). É responsável por 1483 quartos (27,6% da oferta da região) e tem capacidade para alojar 3747 pessoas (31% da capacidade de alojamento da região), segundo dados do INE.
“Na região, a maior parte dos imóveis em AL ficam junto às praias ou golfe, são segundas habitações e não servem para o mercado de arrendamento a longa duração”, sublinha Paulo Matos.
Uma regressão no AL será uma machadada no turismo e nas economias locais, acreditam os empresários. “O AL permite a grandes agregados familiares fazerem férias no mesmo espaço, o que não acontece na hotelaria convencional. Por exemplo, na Foz do Arelho não existem grandes hotéis, a oferta que existe é AL, e isso combate a massificação do turismo e preserva a identidade local”, acrescentam.
Sofia Cardoso e Paulo Matos referem que, na região, os autarcas têm mostrado compreensão em relação a estas questões e notam que as autarquias “receberam um presente envenenado do Governo”, uma vez que serão estas a decidir sobre a emissão de novas licenças, mas, se o fizeram, “estão a assumir que não têm problemas de habitação e, por isso, não recebem apoios do IHRU”.
Nas Caldas da Rainha, o presidente da Câmara, Vítor Marques diz que o município ainda não fez uma análise quanto a excesso de AL, “mas nesta altura não sentimos necessidade de fazer restrições”, afirmou. ■