Futuro dos bombeiros voluntários é incerto

0
572
O painel de oradores que debateu o tema nesta tertúlia
- publicidade -

O ciclo de tertúlias organizado pela Associação de Bombeiros Voluntários do Bombarral sobre segurança e proteção de pessoas e bens, foi um momento para refletir sobre o futuro desta missão nobre no país

‘Que futuro para os corpos de bombeiros?’ foi o título da última de três tertúlias realizadas pela Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Bombarral durante o mês de outubro, subordinadas ao tema ‘Segurança e Proteção de Pessoas e Bens’, para assinalar o 100º aniversário da instituição. Para debater com a comunidade foram convidados, no passado dia 25, Rui Rocha (presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Leiria), Pedro Lourenço (comandante dos Bombeiros Voluntários do Bombarral) e Ricardo Coelho (presidente da direção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Cadaval). E cedo de percebeu que, para projetar o futuro, há que compreender e debelar as graves dificuldades que as associações humanitárias e os seus corpos ativos estão a enfrentar, que vão dos constrangimentos financeiros à dificuldade de mobilizar voluntários para bombeiros.
O financiamento para o desenvolvimento da prestação do socorro à população continua a ser a principal dor de cabeça dos dirigentes que voluntariamente gerem as associações humanitárias. Com um orçamento de quase um milhão de euros, o presidente dos Bombeiros do Cadaval está preocupado com o futuro e, no presente, considera que urge alterar o regime de apoio a estas estruturas que, “enquanto entidades do direito privado, prestam essencialmente serviços públicos e, o que é um facto, é que tudo anda à volta do financiamento”. Em causa está, sobretudo, o conjunto de regras do financiamento das associações humanitárias de bombeiros (conhecido por PPC – Programa Permanente de Cooperação), no continente, enquanto entidades detentoras de corpos de bombeiros, entre as quais o socorro e serviços, como é o caso do transporte de doentes para hospitais. “O Estado não paga aquilo que devia pagar às associações de bombeiros enquanto prestadores de serviços e que é, há já vários anos, deficitário”, critica Ricardo Coelho. O PPC só cobre 6% do custo da instituição. Até a instalação do Posto de Emergência Médica do INEM, segundo o dirigente, é “de forma deficiente porque o valor fixo que é pago nunca chega para garantir os turnos com pessoal”, visto que a fatura só é apresentada quando a ambulância sai em serviço do quartel. No caso do Bombarral, o valor do PPC nem chega para suportar metade do valor que é pago pela associação à Segurança Social dos encargos com os seus colaboradores.
Também Rui Rocha, que há duas décadas preside à Associação de Bombeiros de Ansião, frisou que “não somos subsídio-dependentes” mas “os sucessivos governos ainda não tiveram a capacidade para reconhecer a importância para o país de haver entidades de direito privado que fazem este trabalho da forma como fazemos”. “É angustiante perceber a força que poderíamos ter e que não temos, porque não existe um espírito de grupo dentro do nosso setor”, até porque, sublinhou, “a maior parte do serviço que prestamos é ao Estado e que é dos piores pagadores que podem existir no mercado”.
O comandante Pedro Lourenço, bombeiro voluntário desde 1980, recordou que “antigamente tocava-se a sirene e conseguíamos, entre os 20 bombeiros de então, resolver os problemas. Agora os desafios são outros e cada vez é mais difícil haver pessoas com disponibilidade para as missões dos corpos de bombeiros”. Advoga, por isso, a criação de incentivos para atrair voluntariado, em jeito de compensação pelo seu trabalho, porque, no caso dos bombeiros, executam um trabalho “que é da responsabilidade do Estado”.
As restantes duas tertúlias, realizadas a 11 e 18 do mês passado também no auditório da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Bombarral, abordaram as temáticas ‘A Proteção Civil de Âmbito Municipal’ com a participação de Carlos Guerra (comandante sub-regional de Leiria), Carlos Silva (comandante sub-regional do Oeste) e Mário Cerol (coordenador municipal de proteção civil da Nazaré), enquanto que para debater a ‘Segurança Contra Incêndios em Edifícios’ contou com Marco Martins (comandante dos Bombeiros Voluntários de Óbidos), Flávio Santos (técnico da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil de Leiria) e Jorge Maia (engenheiro projetista SCIE, regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios). ■

Vítor Garcia alerta que muitas associações já não conseguem pagar ordenados

“Se nada mudar, acabam-se os bombeiros!”

Vítor Garcia, à beira de cumprir o último mandato de presidente da direção da Associação dos Bombeiros Voluntários do Bombarral, encara o futuro com muito pessimismo ao fim de quase 25 anos de dirigente. Se não houver resoluções a nível governamental, dentro de poucos anos fica comprometida irremediavelmente a operacionalidade das corporações de bombeiros voluntários. “Não podemos ignorar que temos muitas associações que já não conseguem pagar os ordenados!”. O responsável defende que deve haver mais profissionalismo para o exercício das responsabilidades que são atribuídas aos corpos ativos.
Os cerca de 40 colaboradores em regime permanente acabam também por ser os voluntários para o dia-a-dia. “Não podemos estar a contar com o voluntariado”, frisa Vítor Garcia, sendo para si indiferente que o apoio estatal venha do Governo ou das autarquias. “Quem tiver essa obrigação tem que entrar [com o dinheiro]! De outra forma não vale a pena termos ilusões, porque não vamos conseguir!”, conclui.
Ainda no âmbito das comemorações do centenário da associação, tendo como objetivo informar melhor a população do concelho para a importância e missão desta instituição, vão decorrer ao longo deste mês sessões de esclarecimento públicas em todas as quatro freguesias do município. Na ocasião, o presidente da Câmara Municipal do Bombarral, Ricardo Fernandes, destacou o apoio da autarquia para a criação de três equipas de intervenção permanente e foi porta-voz de mais uma oferta do empresário Mapril Baptista, de uma nova ambulância para a corporação bombarralense.
Alimentar as associações de bombeiros com voluntários, quer ao nível da estrutura associativa mas principalmente para rejuvenescer os corpos de bombeiros, constitui, para o comandante bombarralense Pedro Lourenço, o grande desafio no futuro. “Não vale a pena termos bons equipamentos e veículos se não tivermos pessoas para guarnecer, tripular e exercerem aquilo que são as missões dos corpos de bombeiros”, alertou o também vice-presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Leiria. A exigência da formação de um bombeiro versus o valor que aufere no exercício profissional enquanto bombeiro, é também um fator que tem vindo a pesar negativamente na atração de novas pessoas para esta atividade, com tendência para um maior agravamento nos próximos anos. “Há que criar um modelo para reter as pessoas nos corpos de bombeiros”, porque a experiência adquirida ao longo dos anos “é muito importante para aquilo que é sua missão”. ■

- publicidade -