Jovem caldense viveu experiência de voluntariado em Moçambique

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A caldense considera que no voluntariado a partilha do conhecimento e a mudança de mentalidades é mais importante do que a infra-estruturação.

Uma jovem caldense esteve durante cerca de um mês num projecto de voluntariado em Moçambique e regressou cheia de vontade de regressar, encantada com as pessoas. “São simples, humildes e altruístas. Têm tão pouco e dão tanto”, disse Tânia Mendes à Gazeta das Caldas, depois do regresso a casa a 14 de Setembro.
Tânia Mendes diz que nunca mais vai esquecer como é viver como uma moçambicana. “De comer couve com chima, de andar de ‘chapa’, de me enrolar na capulana quando tinha frio, de caminhar pelas ruas de terra batida durante a noite à conversa com quem encontrava, das longas missas cantadas e dançadas, dos abraços sentidos da despedida e, principalmente, das pessoas”.
A caldense acredita que recebeu mais do que deu durante esta viagem. “Aprendi a ser mais tolerante, a pôr-me no papel do outro e a não querer tudo já e agora. Vivemos na era do imediato, do agora e do já. Em Moçambique vive-se o dia-a-dia, com poucos compromissos, e muita alegria”, revelou.Durante a sua estadia conheceu pessoas fascinantes, como a Toninha, que lhe pareceu “uma autêntica personagem de Mia Couto”, que dizia que na Matola vivem sempre “à espera do que o vento nos traz”. Toninha ensinou-lhe que se deve dormir de mãos abertas e pernas esticadas “porque assim deixava o sonho fluir”.
Tânia Mendes tem 26 anos e nasceu nas Caldas da Rainha. Licenciada em Jornalismo, pela Escola Superior de Comunicação Social, exerceu durante pouco tempo esta profissão e actualmente trabalha na área da promoção de eventos, relações públicas e comunicação, numa empresa em Lisboa.
“Sem nunca ter reflectido muito acerca do carácter social e humano da profissão que gostaria de ter, a verdade é que o jornalismo tem uma vertente interventiva muito grande em diversos aspectos e de maneiras distintas”, contou.
Já fora do jornalismo “dei por mim envolta num mundo ‘demasiado comercial’ e preocupado com o consumo”.
Embora goste do que faz, sente que “não estou a contribuir para uma mudança efectiva do mundo nas áreas que realmente necessitam de intervenção e soluções criativas”.
Começou por fazer voluntariado na Casa de Protecção e Amparo de Santo António, uma instituição de mães adolescentes em Lisboa, e deu formações de Informática na Universidade Sénior de Rio de Mouro.
Nessa altura pensou em fazer voluntariado internacional, até porque tem uma grande paixão por África. “Cresci a ouvir as histórias de infância da minha mãe e da minha tia passadas em Angola”, explicou.
Em conversa com o seu amigo André Madeira, conheceu o projecto GASNova (gasnova.org), um grupo de acção social que foi fundado por estudantes universitários em Lisboa.
O grupo pretende incentivar os jovens a responder aos principais desafios do mundo. “Somos convidados a fazer uma caminhada [espiritual] de um ano que contempla formações em diversas áreas, desafios, fins-de-semana de voluntariado, angariação de fundos para as missões e voluntariado semanal, entre outras actividades”, contou Tânia Mendes, que acabou por ser uma das voluntárias escolhidas para ir para o continente africano.

UM MÊS CHEIO DE PROJECTOS

Com um bebé moçambicano. A estada em África proporcionou experiências enriquecedoras.

Com mais duas voluntárias, Tânia Mendes foi para a paróquia de S. João Baptista do Fomento, na Matola (arredores de Maputo), através da Fundação Gonçalo da Silveira.
O pároco local é um jesuíta moçambicano que, por coincidência, tem família nas Caldas da Rainha
A caldense começou por relançar o jornal da paróquia e dar formação nesta área, mas logo que chegaram apercebeu-se que havia muitas necessidades e foram respondendo a outros desafios.
Acabou por se envolver em diversas acções e projectos que incluíram a criação do Clube de Jornalismo e o lançamento do jornal Precursor.
Deu também uma formação inicial em Jornalismo na Namaacha (na fronteira com a Suazilândia) e em Comunicação no Seminário de Santo Agostinho (Matola) e desenvolveu um manual para a sala de informática.
Houve ainda tempo para dar explicações de Inglês, promover actividades didácticas e lúdicas com as crianças e com os educadores “para compreenderem o desenvolvimento infantil”.
Um dos maiores desafios foi a realização de um workshop com dinâmicas sobre relações interpessoais, auto-estima e sexualidade a um grupo de jovens (entre os 12 e os 21 anos) que costumam aparecer aos domingos na casa onde ficaram (que pertence à Igreja) porque querem seguir a vida religiosa. “Foi uma experiência engraçada e que correu bem, apesar de elas estarem com imensa vergonha”, lembrou a voluntária, que ironiza com o facto de terem feito um workshop sobre sexualidade para futuras freiras.
Tânia Mendes envolveu-se também com a Associação Voluntária de Mães e Crianças Carenciadas, na qual as mulheres recebem propostas de trabalho, tendo dado apoio na “escolinha” e na realização da festa do final do ano.
Algumas mães trabalham na agricultura, outras vendem na rua e outras estão na creche, onde ficam todos os filhos delas. É  “um corropio de mamãs” a entrar e a sair, galinhas para matança, pintos a chegar, pão, molhos de couves, alfaces e de todos os produtos passíveis de serem vendidos pelas participantes.
“Este projecto tocou-me particularmente e decidi fazer também uma recolha de informação para criar documentos de marketing importantes para a apresentação da associação, angariação de fundos e outras actividades”, referiu.
No futuro quer escrever uma reportagem “sobre este ‘case-study’ social fantástico”.

“Fazer voluntariado é uma forma activa de mudar o mundo”

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Tânia Mendes acredita, mais do que nunca, que o voluntariado “deve ser centrado na ‘pessoa’” e que, como diz o provérbio, “não dês o peixe, ensina a pescar”. Na sua opinião, fazer voluntariado é uma forma activa de mudar o mundo.
Tânia Mendes salienta que o voluntariado deve ter uma perspectiva de cooperação para o desenvolvimento e não limitar-se apenas a dar e construir gratuitamente e depois ir embora.
Na sua opinião, por causa de demasiados anos com esta metodologia errada de apenas construir infra-estruturas, tem sido mais difícil explicar aos moçambicanos que devem aproveitar os voluntários para aprenderem. Por isso, o trabalho tem passado também por mudar mentalidades “uma tarefa bem mais difícil do que construir hospitais e estradas”.
Por outro lado, o voluntariado não pode ser pensado apenas à escala internacional. “O voluntariado deve começar na nossa casa, no nosso prédio, na nossa rua, no nosso bairro”, disse. “Porquê implementar projectos de combate à solidão dos idosos se nem aos nossos avós telefonamos?”, questiona.
De qualquer forma, fica com o sonho de voltar um dia a Moçambique, para ajuda a Associação Voluntária de Mães e Crianças Carenciadas ou para desenvolver um projecto na ilha de Inhaca, onde não há nenhuma ONG a trabalhar.
“Já que sonhar é gratuito, gostava de pôr a mochila às costas e percorrer Moçambique de Maputo a Tete e ir contribuindo e ajudando em diversos projectos”, rematou.

Pedro Antunes
pantunes@gazetadascaldas.pt

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