A Associação Cultural e Recreativa do Campo acolheu a 21 de Abril a iniciativa “21 às 21” do Movimento Viver o Concelho e que se destinou a celebrar a revolução dos Cravos.
O evento, que reuniu 70 pessoas, contou com um jantar volante seguido de debate, onde foi feita uma resenha histórica sobre a Revolução dos Cravos. Houve ainda lugar a animação musical com canções de Abril.
O coronel Carlos Barata estava colocado em Mafra em Abril de 1974. Era tenente e comandou um dos seis pelotões que foi ocupar o aeroporto no dia da Revolução. Só que “fizemos o reconhecimento em Camarate durante o dia e não nos passou pela cabeça que teríamos as estradas obstruídas pelas pessoas que à noite estacionam os carros um pouco por todo o lado”, revelou o convidado durante o debate. O estacionamento “à portuguesa” fez com que a coluna militar “se atrasasse uma hora e meia pois tivemos que ir dar uma volta muito maior”.
No entanto, a tomada do aeroporto era um dos pontos que era necessário tomar para poder sair o primeiro comunicado das Forças Armadas. Isto porque só depois de interditado o espaço aéreo é que as operações poderiam seguir a sua marcha.
Este militar recordou também como foi à sede da Pide no dia 26 de Abril. O Posto de Comando disse que estava difícil a tomada daquele objectivo por uma unidade de fuzileiros e então dois pelotões de Mafra “foram dar uma mãozinha”. Quando lá chegaram já os fuzileiros tinham entrado, mas houve algo que o incomodou. Carlos Barata tinha o estereotipo dos agentes da Pide como os homens cinzentos, de gabardine e chapéu na cabeça e afinal o que encontrou foram pessoas de várias classes sociais, “desde jovens estudantes, funcionários públicos e até outros com ar de chulos. Afinal não eram só os senhores do chapéu…”.
Carlos Barata preside a Associação 25 de Abril e conta que são sempre muito solicitados nesta altura do ano para participar em sessões de esclarecimento. “O problema é que somos cada vez menos os que participámos”, disse o coronel, de 65 anos, que é dos mais novos que fez a Revolução. “É cada vez mais difícil contar com alguém que tenha participado activamente e os que ainda podem não chegam para tantos os pedidos”, disse o convidado.
UMA FUGA PARA FRANÇA
Aires Rodrigues contou a sua experiência ligada às lutas estudantis que nos anos 60 decorreram em Lisboa e em Coimbra. Contou em pormenor o sucedido na capital no ano de 1964 com a ocupação da cantina por algumas centenas de estudantes, “o que deu direito a intervenção da polícia de choque e de cães polícias”.
A cantina foi encerrada e “nós fomos todos presos”. Como tinha a Pide no seu encalço, em 1966 fugiu a salto para França numa viagem de 23 dias pelos circuitos da emigração clandestina. Chegaram a ser interceptados pela Guarda Civil que estranhamente “nos deixou prosseguir caminho dando-nos uma espécie de salvo conduto para prosseguir viagem”. Só quando chegou a França é que Aires Rodrigues percebeu porquê. O general Humberto Delgado tinha sido entretanto assassinado em território espanhol e a descoberta do seu cadáver levou a que as autoridades franquistas se quisessem distanciar do sucedido.
“Por isso, a Guardia Civil deixou passar quem queria chegar a França, ao contrário da postura habitual que era a de entregar os fugitivos às autoridades portuguesas”, explicou.
“Quando fomos apanhados o meu primeiro pensamento foi como é que vou saltar do camião?’ pois se fosse entregue à polícia “iria concerteza ser enviado para a guerra colonial”.
“A Democracia deveria ser cada vez mais participada pelos cidadãos”
Para o médico Henrique Pinto, o 25 de Abril foi algo muito singular que marcou os anos 70 na Europa e que só encontra comparação no Maio de 1968. O convidado parafraseou Maria Filomena Mónica ao afirmar que o 25 de Abril permitiu ao país “passar do feudalismo à pós-modernidade” e que foi vivido “com grande alegria pela maioria dos portugueses”.
Nenhum dos oradores escondeu as preocupações com a actual crise, mas todos sublinharam o desenvolvimento do país e a extinção de grande parte da pobreza que então minava a sociedade portuguesa.
Os convidados sublinharam ainda que a lei eleitoral é algo que precisa de ser revisto, até porque o método de Hondt não é o único a estabelecer a proporcionalidade democrática. Quase todos os países já têm outros modelos, sendo este usado apenas por Portugal e Espanha.
Carlos Barata considera que passados 37 anos “a democracia deveria ser cada vez mais participada pelos cidadãos” e queixou-se de uma geração que fez da política carreira e que nunca passou pelo trabalho.
Já para Aires Rodrigues é necessária a modificação da lei eleitoral para outros método que não o de Hondt e salientou que as manifestações da Geração à Rasca são a expressão de um descontentamento profundo de pessoas que têm acesso à informação e que conhecem o que se passa internacionalmente. “Temos que acreditar que há uma solução para isto pois as batalhas não estão ganhas apesar de termos feito um percurso positivo desde o Salazar até hoje”, disse.