A cerca do castelo de Óbidos serviu de cenário aos confrontos dos exércitos francês e luso-inglês. Trata-se de cenas que irão integrar o filme Linhas de Torres sobre a terceira invasão francesa.
A equipa do produtor Paulo Branco esteve em Óbidos a filmar durante três dias (entre 18 e 21 de Janeiro) seguindo depois para Torres Vedras. As filmagens, que incluem mais 5.000 figurantes, devem estar concluídas durante a Primavera. O filme tem estreia prevista para Outubro.
A remoção de alguns candeeiros e sinais de trânsito das ruas de Óbidos ajudou a recuar dois séculos no tempo, possibilitando assim a filmagem de algumas cenas da passagem das tropas francesas, inglesas e portuguesas em várias localidades do Portugal de 1810. Também alguns recantos da cerca do castelo, inclusive o espaço traseiro da própria pousada, serviram de cenário a confrontos entre os soldados, a sua esmagadora maioria figurantes da região que responderam a um casting para participar na nova produção de Paulo Branco, que fez recentemente o filme “Mistérios de Lisboa”.
De acordo com o produtor, que esteve em Óbidos na passada sexta-feira, este filme surgiu de um convite feito pelo vereador da Cultura de Torres Vedras, há três anos, para assinalar o bicentenário das invasões francesas. Apesar de não levar muito a sério a proposta no início, devido à quantidade de meios que envolve, depois começou a perceber que se tratava de um período de tal forma importante e pouco conhecido da História de Portugal, que daria a possibilidade de ter “histórias incríveis”. Paulo Branco pediu então a Carlos Saboga – com quem tinha trabalhado nos “Mistérios de Lisboa” – para escrever o guião “e ele fez um dos mais extraordinários [guiões] que li e, a partir daí, a aventura começou”.
O projecto começou há praticamente um ano e, de acordo com o produtor, é dos mais ambiciosos em que já se envolveu. O filme começou a ser realizado por Raul Ruiz, que viria a falecer em Agosto. No entanto, a sua continuidade foi garantida pela esposa do realizador chileno, e também realizadora, Valeria Sarmiento, por persistência do produtor português.
“Pode ser um filme extraordinário e acredito que o seja”, diz acrescentando que integra os melhores actores
internacionais, como é o caso de John Malkovich, Léa Seydoux, Mathieu Amalric, Marisa Paredes, Catherine Deneuve e Isabel Lupert, aos quais se juntam nomes portugueses como Adriano Luz, Albano Jerónimo, Nuno Lopes, Afonso Pimentel, Filipe Vargas e Soraia Chaves.
“Os actores estrangeiros ficaram muito entusiasmados com o projecto porque não conheciam a história”, conta o produtor, acrescentando que não existe a noção de que esta derrota dos exércitos e Napoleão em Portugal foi decisiva para o resto da história da Europa.
O filme retrata não só a movimentação das tropas, como também a vida de uma série de personagens de várias classes sociais, que a guerra retirou da rotina quotidiana e que fogem da progressão dos franceses. Todos eles convergem, por diferentes caminhos, para as linhas de Torres, onde se trava o combate final que decide o destino de cada um.
Este retrato de uma época levou a que fossem necessários mais de cinco mil figurantes. Só em Óbidos participaram mais de uma centena.
Paulo Branco explica que foi fácil mobilizar as pessoas pois existe sempre a curiosidade de participar num filme e, como se trata de uma produção de época, os fatos também são bastante apelativos.
Esta produção custa cerca de quatro milhões de euros e Paulo Branco garante que é “precisa muita imaginação para fazer um filme desta dimensão apenas com este montante”. Para a sua concretização contou com diversos apoios nacionais, nomeadamente do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) e da RTP, assim como da Câmara de Torres Vedras e das outras autarquias onde têm decorrido as filmagens. A nível internacional contam com o apoio de diversas cadeias de produção, como é o caso do Canal Plus, a France Television, Media e CNN francesa.
Até ao momento já decorreram filmagens em Sintra, Serra da Estrela e Óbidos, seguindo agora para Torres Vedras. Paulo Branco gostaria que o filme estivesse pronto na Primavera para estrear em Outubro.
Filmes e séries televisivas procuram a vila medieval
Para Óbidos estas produções são também uma oportunidade de promoção turística. O cenário natural da vila tem atraído a sétima arte, tendo já ali sido rodados vários filmes, como é o caso de “Lionheart” (1987), “Coitado do Jorge” (1993) ou a comédia medieval francesa “Sans Peur et Sans Reproche” (1988).
A pitoresca vila tem também sido procurada para ser cenário de algumas séries televisivas, como é o caso de “Morangos com Açúcar”, “Velhos Amigos” ou “Rebelde Way”. Para breve estão previstas filmagens, em Óbidos e no Bom Sucesso Design Resort, dos últimos episódios de “Rosa Fogo”.
De acordo com José Parreira, administrador da Óbidos Patrimonium, a conjuntura actual de crise levou a empresa municipal a suspender alguns projectos que queria desenvolver ao nível do turismo cinematográfico. No entanto, o responsável acrescenta que sempre que são contactados, agarram a oportunidade, dando apoio logístico nas filmagens.
José Parreira explica que a procura de Óbidos para filmagens traduz-se num aumento das refeições e alojamentos na região durante o tempo em que estas decorrem.
O responsável adianta ainda que nas escolas de Óbidos os alunos trabalham bastante a área da multimédia e que já no próximo Festival Internacional de Chocolate serão apresentados alguns dos filmes feitos pelas crianças.
“Gosto muito de participar, é divertido”
Joaquim Sequeira veio do Bombarral para óbidos para vestir durante três dias a pele de um garboso soldado francês.
“Na quarta-feira fizemos três cenas do grupo francês a entrar na localidade, filmadas à entrada da vila, sendo que a última foi de confronto com as tropas inglesas e até houve tiros e a fuga dos franceses”, contou, entusiasmado com a experiência que acabara de viver.
O figurante, embora envergasse uma espingarda, nunca a disparou. “Só os da frente o fazem”, contou à Gazeta das Caldas.
Joaquim Sequeira já antes tinha feito outras figurações, nomeadamente em produções que decorreram na sua terra natal, o Bombarral. “Gosto muito de participar, é divertido”, disse.
“Está a ser espectacular”
Sebastien Van Braekel, de 23 anos e empresário em Óbidos estreou-se nas andanças cinematográficas nesta produção, mas garante que quer repetir a experiência. “Está a ser espectacular”, disse o jovem, que possui alguma experiência em esgrima medieval e recriação histórica.
Na produção de Paulo Branco, Sebastien Van Braekel é um soldado inglês a quem não acontece nada de mal. “Por sorte sou eu que os mato todos”, diz o figurante que já tinha “morto” três ou quatro franceses.
O jovem obidense destaca ainda a logística que está por detrás das filmagens e o “muito respeito que também existe”, destacou.
Sebastien Van Braekel gostou também de se ver de uniforme inglês e não deixou de comentar que este se adequa ao tempo em que decorrem as filmagens. “É muito quentinho”, afirmou.