
A actual situação do país estará a levar as pessoas a lerem mais “para se poderem recolher em mundos paralelos, sem estar só concentrados numa realidade dura”. A opinião é do escritor Gonçalo M. Tavares, que esteve a 26 de Novembro numa sessão de autógrafos na livraria Bertrand, no centro comercial Vivaci, nas Caldas da Rainha.
“Eu moro em Lisboa e vejo que as pessoas estão a ler muito. Vejo muitas a passear com livros na mão e a lerem no metro, por exemplo. Isso demonstra que as pessoas têm a necessidade da ficção e do imaginário porque a realidade não lhes dá tudo”,
A presença nas Caldas da Rainha aconteceu dias antes da apresentação oficial do seu último livro, “Short Movies”, sobre cenas absurdas do quotidiano.
Embora também seja convidado para palestras sobre os seus livros, Gonçalo M. Tavares gosta de sessões de autógrafos porque possibilitam o contacto mais pessoal com os leitores. “Podemos estar mais tempo a falar com cada um dos leitores”, referiu. “Como passo muito tempo isolado na escrita, que é um trabalho em que se fica fechado e não se vê ninguém, gosto de ter momentos em que saio e tenho contacto com as pessoas”, disse.
Esta é também uma forma de “perceber um pouco quem está do outro lado”. Ao contrário de alguém que trabalhe nas artes performativas, como o teatro, o escritor não tem um contacto directo com o seu público. “A escrita é um trabalho muito diferido. Escrevemos e às vezes passam alguns anos até que alguém leia”.
Gonçalo M. Tavares chega a ser abordado por leitores que têm todos os seus livros e que conhecem muito bem a sua obra. “Há alguns que até coleccionam as primeiras edições e revistas onde publiquei contos”, disse, orgulhoso.O escritor tem também muito sucesso no Brasil, país ao qual se desloca frequentemente e onde recebeu o prémio Portugal Telecom 2007 (considerado o mais importante prémio literário brasileiro).
“Para mim o Brasil não é um outro país. Temos a mesma língua e sou muito bem tratado lá”, contou. O escritor não é muito favorável ao Acordo Ortográfico. “Os desentendimentos entre falantes de língua portuguesa nunca foram desentendimentos ortográficos, mas sim com a lógica das palavras e da sintaxe”, explicou.
O escritor editou desde sempre os seus livros no Brasil sem necessitar de os adequar àquele país. “Continuo a escrever como antigamente e nada foi adaptado. Uma das riquezas das diferentes formas de escrever em português tem a ver com essas diferenças”, concluiu.
Gonçalo M. Tavares gostou da sua passagem pelas Caldas da Rainha, embora não tenham sido muitas as pessoas a participar na sessão de autógrafos. “Gosto imenso de vir a cidades que não conheço bem”, comentou, acrescentando que, como cresceu em Aveiro, gosta de cidades “onde se pode andar a pé”.
Autor de livro sobre Amália tem casa na Foz do Arelho
Entre as pessoas que fizeram questão de falar com Gonçalo M. Tavares estava Luís Machado, da direcção da Associação Portuguesa de Escritores (APE), que aproveitou a ocasião para incentivar Gonçalo M. Tavares a tornar-se sócio da APE, da qual fazem parte 1.500 escritores. “A associação representa os escritores portugueses e luta pelos seus direitos. Recentemente criámos um amplo programa de benefícios sociais para os seus associados”, explicou o dirigente.
Segundo Luís Machado, em Portugal não são muitos escritores que têm a possibilidade de se dedicar inteiramente à escrita.
O também escritor Luís Machado tem casa na Foz do Arelho, para onde gosta de vir regularmente. “Esta zona é extraordinária. Gosto da tranquilidade e do sossego”, referiu, acrescentado ter sido com mágoa que soube do encerramento da Livraria 107. “As Caldas da Rainha tem alguns espaços singulares, que a caracterizam como uma cidade diferente e quando estes desaparecem a sua vida fica mais triste”, afirmou.
Na sua opinião, quem vive nas Caldas não precisa de ir a Lisboa para “encontrar coisas específicas”, embora ache que a oferta cultural pudesse ser melhor. “Talvez o centro cultural das Caldas não esteja a desempenhar o seu papel. É um belo equipamento, mas poderia ser mais ambicioso e o seu espaço poderia ser melhor utilizado”, disse.
Luís Machado lançou recentemente o livro “Amália – Confidências em Noite de Primavera”, que reproduz uma das últimas entrevistas da cantora.