A brasileira que se apaixonou por Fernando Pessoa e o leva ao Jazz

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Gazeta das Caldas
A artista lançou um disco com temas inspirados em Fernando Pessoa que exploram o feminino |DR

Patrícia Lopes, pianista e compositora brasileira, subirá ao palco do CCC no domingo, 29 de Outubro, às 17h00. De São Paulo traz “O Feminino em Pessoa”, um concerto inspirado na poesia de Fernando Pessoa e composto inteiramente por músicas da sua autoria. Ao piano junta-se voz de Paula Mirhan, o clarinete de Hugo Azenha e o violoncelo de Ricardo Ferreira.
Patrícia Lopes inspirou-se em Fernando Pessoa e nos seus heterónimos para compor temas que evidenciam o lado feminino que o próprio poeta explora na sua obra.

Há 16 anos, quando frequentava o mestrado em Composição Musical na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Patrícia Lopes foi desafiada pela sua orientadora (Marisa Rezende) a escolher um poeta que a inspirasse na escrita musical. “Comecei a ler alguns e apaixonei-me por Fernando Pessoa”, recorda a artista, que em 2015 voltou a pegar neste projecto e agora lançou o álbum “O Feminino em Pessoa”.
 “Este trabalho reflecte o lado feminino que eu encontrei na poesia de Fernando Pessoa, é resultado de uma interpretação muito pessoal”, acrescenta Patrícia Lopes, realçando que o termo “feminino” não tem aqui o mesmo significado que “mulher”. “Associo ‘feminino’ a ‘profundidade’, ou seja, ao lado sensível que há no ser humano em geral, incluindo nos homens, que também têm uma faceta mais delicada”, diz a pianista, explicando que musicou poemas em que a figura feminina surge evidente, mas outros em que esta não é clara e dos quais apenas se subentende uma carga sentimental muito forte.
“A emotividade é mesmo aspecto comum e o elo de ligação de todas as músicas do meu espectáculo”, acrescenta Patrícia Lopes, que já apresentou este concerto no Brasil e notou como o público se sentiu tocado pelos temas. “Normalmente as pessoas choram”, refere.

Neste trabalho da pianista há temas que apenas são recitados pela cantora Paula Mirhan, sem acompanhamento instrumental, outros em que entram vários instrumentos, como o piano, o violoncelo e o clarinete. Há também faixas puramente instrumentais que Patrícia Lopes compôs sem qualquer relação à poesia pessoana, mas que se adequam ao espectáculo e até servem para “quebrar o ritmo”. Serve de exemplo “Miniatura nº 1”.
Nas palavras da artista, o processo da transformação da poesia em música é aquele que lhe dá maior prazer. “Passei toda a noite sem dormir”, “O amor é uma companhia”, “Todos os dias agora acordo com alegria e pena” (Alberto Caeiro), “Tenho tanto sentimento”, “O amor, quando se revela” (Fernando Pessoa) e “A flor que és, não a que dás, eu quero” (Ricardo Reis) são alguns dos 14 poemas musicados por Patrícia Lopes, que também interpreta “Se não a amasse tanto”, fragmento de uma carta enviada por Pessoa à amada Ophélia Queiroz, em 1920.
“Utilizo vários métodos, leio os poemas em voz alta porque desde logo as palavras têm ritmos próprios. Mas, sobretudo, são as diferentes intenções que encontro nos textos que me possibilitam criar composições mais fortes ou mais fracas”, afirma a pianista, que considera este processo de criação muito intuitivo porque não tem qualquer formação em literatura. No fundo, “acaba por ser a minha sensibilidade artística que me permite relacionar os poemas com a música”, acrescenta.
Patrícia  Lopes assinala 15 anos de carreira com o álbum “O Feminino em Pessoa”,  que será pela primeira vez apresentado em Portugal. “Estou ansiosa, não só porque actuarei no país de Fernando Pessoa, mas também porque tenho raízes em Portugal pois sou neta de portugueses”, explica a pianista, que bebe influências da música popular brasileira e da música erudita europeia.