
Setenta quadros inspirados em bandas punk, dos Joy Division aos Ramones, fazem parte da exposição “We Love 77”, do duo Sardine & Tobleroni que está patente até amanhã, 12 de Maio, no Museu Bernardo, nas Caldas da Rainha.
A mostra faz parte do projecto CHCR (Caldas da Rainha – Hardcore), cujos elementos convidaram a dupla de artistas para mostrarem o trabalho em que é contada a história e evolução do punk rock.
Sardine é Vítor Torpedo, um músico de Coimbra que fez parte da banda Tédio Boys, e Tobleroni é Jay Rechsteiner, um artista plástico suíço, radicado em Inglaterra.
Vítor Torpedo foi o único que esteve presente na inauguração da exposição, a 14 de Abril, altura em que falou à Gazeta das Caldas sobre o processo criativo dos dois artistas.
“Eu faço sempre o lado direito da tela e o Tobleroni faz o lado esquerdo, mas antes de passarmos para a tela, todo o design é trabalho em computador”, contou. A dupla descreve a sua prática como “Conceptual Art Brut”, o equivalente ao que o punk significa na música. Esta série de trabalhos demorou cerca de seis meses a ser produzida e para isso a dupla de artistas inspirou-se numa edição especial da revista Mojo, que teve como título “Punk 77 Smashers Punk”.
Para Vítor Torpedo, “é num sítio assim que deve estar uma exposição destas”, sublinhando que este é local mais indicado em Portugal para receber a mostra. “Tem tudo a ver com o ‘underground’ e o ‘do it yourself’” do movimento punk. O artista gostou da forma como as ideias eram tão compatíveis, sem o rigor de outras galerias. “Noutros locais gostam de se afirmarem, ao princípio, como ‘underground’, mas depois querem é fazer o mesmo que os outros”, disse.

A exposição teve a sua estreia em Londres em 2011, onde reside o artista Tobleroni e onde Vítor Pedro também viveu durante 11 anos.
O artista voltou para Portugal há cerca de um ano. “Fui para Inglaterra em 2000, depois do último concerto dos Tédio Boys”, a banda conimbrense do qual fazia parte.
Dos Tédio Boys aos Parkinsons
Vítor Torpedo foi guitarrista dos Tédio Boys, a banda mais mítica de Coimbra (1989-2000) que deu origem a projectos como Wraygunn, The Parkinsons, Bunnyranch e The Legendary Tigerman.
Um dos concertos mais célebres em Portugal foi em 1995, na Queima das Fitas em Coimbra, quando Vítor Torpedo actuou nu, apenas com a guitarra a tapá-lo. No entanto, foi nos Estados Unidos que a banda teve mais sucesso. Em 2007 deram origem a um documento intitulado “Filhos do Tédio”, de Rodrigo Fernandes e Rita Alcaire.
Com o baixista Pedro Xau e o vocalista Afonso Pinto, Vítor Torpedo criou em Londres a banda Parkinsons. “A nossa ideia era ficar seis meses em Inglaterra e depois irmos para os Estados Unidos”, mas foi em Londres “que tudo aconteceu”.
Segundo Vítor Torpedo, “tivemos uma entrada de sonhos, porque passado alguns meses os Parkinson ‘rebentaram’ completamente”.
Acabaram por fazer digressões não só em Inglaterra, mas também Estados Unidos e Japão, entre outros países. A primeira fase do projecto durou três anos com a composição original e depois até 2005 com Vítor Torpedo como vocalista.
Em 2011 os Parkinsons reapareceram, depois de Vítor Torpedo ter voltado para Portugal a pedido da sua mulher, que é escocesa. “Já nem pensava em mudar-me, mas ela quis”, contou. Já realizaram alguns concertos e em Abril a banda gravou um disco. Em 2011 foram cabeça de cartaz num festival em Londres (mesmo depois de anos de ausência) e isso foi o suficiente para terem muitas requisições. Para Portugal está para já garantida a presença no Optimus Alive.
Hardcore até Junho
O CHCR (crhc-zine.tumblr.com/) é uma iniciativa do colectivo caldense Ozzy Project, em parceria com o Museu Bernardo, que tem apoio financeiro da Fundação Calouste Gulbenkian. Em Junho a Casa Bernardo irá receber uma exposição colectiva com trabalhos de João Belga, Pedro Bernardo, Pedro Cá e Joana Montez.
Segundo João Belga, mentor do CHCR, há 25 anos que existe nas Caldas da Rainha uma tradição no hardcore e no punk rock, muito baseado na expressão “do it yourself” (D.I.Y. – faz tu mesmo) em que as bandas fazem todo o trabalho sozinhas. “Todo o movimento artístico que existe nas Caldas tem muito a ver com esse mote e é herdeiro desses tempos em que surgiram nomes como o João Paulo Feliciano e o Gi”, considera João Belga.
“Na realidade artística o hardcore tem a ver com a atitude, com a necessidade das pessoas em criarem algo, independentemente dos mercados e dos públicos”, explicou.
Para João Belga, faz todo o sentido que nesta altura ressurja um maior interesse por este fenómeno, em termos de criação artística. “O hardcore acaba por ser apenas um pretexto. Queremos reunir uma determinada informação e transformá-la num documento” que poderá vir a ser editado em livro.
Pedro Antunes
pantunes@gazetadascaldas.pt