Vítor Pires trabalhou mais de 40 anos na histórica fábrica, além de ter sido dirigente da Associação de Artesãos. As suas peças são para colecionadores
Nasceu nas Caldas há 65 anos e é um de sete irmãos, muitos com veia artística. O pai fazia trabalhos ligados à construção civil (em marmorite) e dedicava-se ao mobiliário. “Fez todas as peças de mobiliário e de decorações lá de casa!”, contou Vítor Pires, recordando que viveu na ilha operária do Bairro Joaquim Luís, situada perto dos Silos. Entre os seus irmãos estão José Pires, pintor, falecido em 2016, outros que se dedicam à cerâmica como Maria de Lurdes Pires, que foi modeladora na Bordalo Pinheiro. Vitor Pires começou a trabalhar na Fábrica de Faianças em janeiro de 1976 e ao fim de 40 anos era o chefe máximo das vendas. Antes passou pela Farmácia Freitas, enquanto tirava o curso noturno de Comércio, na então Escola Comercial.
Aos 16 anos entra na Fábrica como paquete do escritório da unidade que estreava os fornos elétricos, e após ter recebido uma intervenção de Francisco Malhoa que tinha integrado a Bordalo, vindo da Fábrica Belo.
“Vivia-se apenas do que se vendia no mercado nacional”, recordou o autor que começou a receber os chamados agentes que vinham com clientes estrangeiros. Recordou que foi a partir da participação na Ceramex, feira da especialidade que decorria em Lisboa, que começou a internacionalização da fábrica pois começaram a surgir clientes de França, Inglaterra e dos EUA. Vítor Pires também começou a viajar e a representar a Bordallo em certames na Alemanha, França e nos EUA. Quando entrou, lembra-se que a técnica de enchimento com calda veio “substituir a técnica de calcar com os dedos as peças nos moldes”. E no início do seu trabalho não se faziam as peças de museu. “Produzia-se peças correntes como as couves, os peixes, frutas e as ostras”, disse o funcionário que assistiu à expansão da fábrica, para a Zona Industrial.
Os azulejos foram reintroduzidos nos anos 80 do século passado. Antes da Visabeira, e sob gestão do engenheiro Serrano, Vítor Pires recordou que se apostou na reprodução das peças gigantes de Bordalo Pinheiro. Mas a crise já grassava e houve até um movimento em volta da fábrica caldense que foi resolvido com a passagem não só da Vista Alegre como também da Bordallo Pinheiro para o grupo Visabeira. “Lembro-me das pessoas afluírem em massa à loja da Fábrica pois não se sabia se esta resistiria. Levavam tudo! E até tiravam as peças das mãos umas das outras!”, disse o ceramista que considera que a Visabeira apostou na valorização da própria marca, a partir de 2008. De qualquer modo, acha que a empresa “funciona de costas voltadas para as Caldas”. Basta ver como está a loja da fábrica “que bem precisava de uma renovação!”.

Presépios em barcos e botas
Mesmo no final dos anos 70, Vítor Pires começou a fazer peças e como não dominava ainda as técnicas “fiz três figuras, algo monstruosas”, e que hoje fazem parte da sua coleção. “Tive críticas menos boas, o que me levou a fazer uma paragem”. Voltará ao barro pois a sua sogra fazia presépios e acabou por lhe passar o saber-fazer, por volta do ano 2000. “Comecei a fazer os presépios à moda dela”, disse o autor que acabou por encontrar a sua própria assinatura, mais tarde, tendo feito vários cursos no Cencal. “Fazia as peças em casa e cozia na fábrica”, disse o ceramista que fazia também Sto. Antónios e paliteiros sob influência de Bordalo Pinheiro e também de Manuel Mafra. O autor aposta no movimento das figuras e surpreende pois faz presépios em barcos ou em botas. As figuras são colocadas em posições variadas, por vezes, inesperadas. “Hoje só faço peças para os colecionadores que me pedem”, disse o autor à Gazeta.

Vítor Pires esteve ligado à Associação de Artesãos. Entrou como ceramista em 2005 e chegou a presidente da direção, cargo que teve durante vários anos. Trabalhar numa associação “é sempre desafiante pois há diversos interesses que é preciso gerir”. Há cerca de cinco anos, saiu da associação dando lugar à direção de Pedro Brás, atual autarca e que “dinamizou a entidade que estava um pouco adormecida”.E rematou recordando que numa das últimas viagens de trabalho feitas aos EUA o informaram que a Bordallo é mais conhecida que a Visabeira. “Basta olharem para uma folha de couve, para dizerem: “É Bordallo Piñeiro!”, rematou. ■