Portugal é o país da Europa onde há mais infecções hospitalares

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DSCN9838Esta é uma das consequências da falta de enfermeiros em Portugal, país que apresenta a proporção de 6,2 enfermeiros por 1000 habitantes (um número muito inferior aos 8,6 recomendados pela OCDE). Uma realidade que está exposta no livro “Vidas Partidas. Enfermeiros Portugueses no Estrangeiro”, apresentado por Cláudia Pereira na livraria Bertrand das Caldas no passado sábado, 12 de Fevereiro.
A obra nasceu de uma iniciativa da Ordem dos Enfermeiros, depois de Cláudia Pereira ter vivido cinco meses em Londres e concluído que os enfermeiros são os profissionais portugueses mais representados no Reino Unido e o segundo grupo de enfermeiros estrangeiros mais presente naquele país, logo atrás dos espanhóis.
Lançado o ponto de partida, a antropóloga e investigadora do Observatório da Emigração,  do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE, contou com o apoio de especialistas nas áreas da Ciência Política, Sociologia, Economia da Emigração e entrevistou 20 enfermeiros espalhados por 12 países, recolhendo ainda o testemunho dos seus familiares. O livro ficou concluído em Dezembro do ano passado.
Nos últimos anos emigraram 12.500 enfermeiros portugueses e, anualmente, a Ordem recebe cerca de 3.000 pedidos de equivalência para que estes profissionais possam exercer no estrangeiro. O que os motiva a sair do país? No estrangeiro há mais respeito pelos horários de trabalho, menor carga horária, maior equilíbrio entre o número de utentes por enfermeiro, incentivos à progressão na carreira (que em Portugal está congelada) e formação paga (que é contabilizada nas horas de trabalho). E, claro, a diferença salarial é significativa.
Mais: a autora concluiu também que, actualmente, “quem emigra não são apenas os enfermeiros que procuram o primeiro emprego, mas também aqueles que estavam efectivos e a trabalhar na área que queriam”.
Além disso, os profissionais portugueses são ainda considerados dos mais competentes do mundo, um dado que pode ser explicado pelo facto da licenciatura de quatro anos em enfermagem incluir a componente prática logo no primeiro ano. “Eles estagiam em várias áreas distintas ao longo do curso, o que lhes permite adaptarem-se às diferentes exigências de cada país”, acrescentou Cláudia Pereira. No Reino Unido, por exemplo, os enfermeiros desempenham funções que em Portugal são responsabilidade dos médicos.
Recrutados por agências específicas em certos países, é frequente que sejam novamente contactados quando decidem regressar a Portugal. Como aconteceu com uma enfermeira que esteve em França e a quem ligavam todos os anos para lá voltar. “Da última vez ela disse-lhes que só aceitava a proposta se arranjassem emprego para o namorado. Em dois dias o rapaz tinha trabalho”, contou a autora.

Más condições de trabalho nas urgências do CHO

Júlio Branco, enfermeiro-chefe do CHO e um dos convidados da mesa serviu-se do (mau) exemplo de funcionamento do serviço de urgência do Hospital de Caldas da Rainha para justificar a saída de enfermeiros portugueses. “Basta lá entrar para concluir que ninguém no seu perfeito juízo aceitaria trabalhar nas condições em que trabalhamos. Não existe equilíbrio entre a responsabilidade que nos é exigida e o número de doentes que nos é posto em mãos”, revelou o responsável, que viu sair do Hospital cerca de 7 colegas de trabalho nos últimos cinco anos.
Se há 27 anos, quando Júlio Branco concluiu a licenciatura, havia facilidade em arranjar colocação profissional dentro do país, hoje o cenário é o oposto. Contudo, “já naquela altura se emigrava”, acrescentou o enfermeiro, que também se revelou preocupado com o fenómeno de migração dos enfermeiros dos hospitais para os centros de saúde. “Desta vez não pelo salário, mas pelos melhores horários”.

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Gonçalo e Cátia, dois enfermeiros lá fora

Durante mais de um ano, a Gazeta das Caldas publicou na rubrica “Novos Emigrantes – O Oeste Nos Quatro Cantos do Mundo” o testemunho de 78 portugueses que partiram para o estrangeiro. Entre eles, destacavam-se os profissionais de saúde. Gonçalo Ferreira, assistente de enfermagem no Reino Unido é um exemplo da realidade descrita no livro de Cláudia Pereira.
“Gosto especialmente da forma como o governo apoia a formação”, escreveu-nos o jovem de 27 anos, contando que em Inglaterra existe a oportunidade de ingressar na Universidade e só pagar o curso após a sua finalização. “E com um ordenado bastante aceitável”.
Como assistente de enfermagem no Hospital de Southampton, o caldense auxilia os pacientes nas suas actividades diárias e presta apoio à restante equipa de enfermeiros, desempenhando tarefas como a avaliação de sinais vitais, electrocardiogramas e recolhas de sangue.
Da Alemanha, chegou-nos também a experiência da enfermeira Cátia Mendes, que em Düsseldorf desempenha funções na área de hemodiálise. Segundo conta, os seis anos que trabalhou em Portugal “já não estavam a ser satisfatórios, tanto ao nível das condições de trabalho como dos salários”.
Por outro lado, Cátia revelou que os doentes alemães são menos exigentes do que os portugueses e que, de um modo geral, os conhecimentos em enfermagem são muito inferiores na Alemanha relativamente aos adquiridos em Portugal.
Ao mesmo tempo, “aqui reconhecem o nosso trabalho, vejo progresso e apoio para a realização formações”, explicou, lamentando que em Portugal uma profissão “tão prestigiada seja tão maltratada”.
Na altura em que enviou o seu testemunho, a caldense não ponderava regressar a Portugal.

 

Maria Beatriz Raposo
mbraposo@gazetadascaldas.pt

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