Agricultores do Oeste querem os seus produtos valorizados e maior poder de negociação

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FotocardealProdutos mais valorizados e uma maior justiça na formulação dos preços ao longo da cadeia, diminuindo assim os lucros concentradas na distribuição,  são dois dos grandes objectivos dos agricultores do Oeste, que estiveram reunidos no passado dia 12 de Março no Bombarral. O encontro contou com a presença do cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, que colocou o consumidor no centro da temática e apelou à promoção de uma economia que favoreça a diversificação produtiva e a criatividade empresarial como forma de fomentar emprego.

A falta de valorização dos produtos agrícolas produzidos na região e a necessidade de continuar a concentrar as produções para conseguir aceder às redes de distribuição e ter mais força na negociação foram algumas das conclusões que saíram do encontro que juntou cerca de 180 pessoas. Falou-se ainda das dificuldades na contratação de jovens e trabalhadores sazonais devido à legislação que, por exemplo, impede um jovem de fazer um estágio profissional depois de ter andado a trabalhar, durante o Verão, na apanha da fruta.
Preocupações que terão agora que ser transmitidas às entidades governamentais. No entanto, e de acordo com o cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, é necessário centrar a tónica no consumidor, “que somos todos nós”, para agir “acertadamente” em relação à problemática actual. “O consumidor não é apenas a consequência desta cadeia com um tamanho exagerado da distribuição, mas acaba por ser o elemento determinante, não só da própria produção, porque dita o que quer, como da distribuição”, defendeu.
Pegando na temática do trabalho, que o Papa Francisco também aborda numa encíclica, D. Manuel Clemente afirmou que para fomentar o emprego é “indispensável promover uma economia que favoreça a diversificação produtiva e a criatividade empresarial”. E alertou: “se não tivermos cuidado com esta diversificação e com esta criatividade, não temos futuro para humanidade”.
Antes, o cardeal-patriarca tinha ouvido, durante perto de quatro horas, intervenções onde foi feita uma panorâmica sobre a agricultura no Oeste e, especificamente sobre as suas principais fileiras de produção: fruticultura, horticultura, vitivinicultura, florestas e pecuária.
Na últimas décadas, a dimensão das propriedades no Oeste aumentou e a grande maioria da superfície agrícola utilizada é explorada por produtores singulares. É no Oeste que se encontra cerca de 88% da superfície nacional de pomares de pereiras e 35% de macieiras, assim como 62% das vinhas que produzem uvas de mesa e 66% da área de produção de hortícolas.
A Lourinhã é, por exemplo, o segundo município nacional com maior área de batata de conservação (cerca de mil hectares), Alcobaça tem a maior área regada de frutos frescos, enquanto que no Cadaval cerca de 99% da superfície regada corresponde a culturas permanentes.
É também no Oeste que se situa 45% do efectivo nacional de suínos e onde se produzem 37% das aves para abate.

O lucro está na distribuição

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Num conjunto de inquéritos feitos aos agricultores da região, estes apontam como principais problemas os baixos preços pagos à produção, a falta de apoio à comercialização e internacionalização, a falta de escoamento para as hortícolas e a necessidade de formação e apoio técnico.
Ana Cristina Rodrigues, professora universitária e consultora, defendeu que entre as medidas a tomar estão a implementação de um valor mínimo à produção e regulamentação dos preços, assim como a formação e o apoio à modernização e comercialização.
José Alexandre, da COOPSTECO – Cooperativa de Serviços Técnicos e Conhecimento, falou da fileira da pêra Rocha para mostrar como os produtores são os mais mal pagos na cadeia de produção. Explicou que o custo médio da produção de um quilo de pêra Rocha ronda os 24 cêntimos. Esse mesmo quilo é entregue numa grande superfície a 60 cêntimos e depois vendido ao consumidor final a 1,30 euros. “São os produtores a ganhar pouco e os consumidores a pagar caro”, disse, destacando que a maior fatia do lucro é para a distribuição.
Reportando-se a dados entre 2010 e 2014, explicou que a produção média de pêra num terreno de sequeiro é de 15 toneladas por hectare e que o rendimento líquido obtido pelo produtor é na ordem dos 750 euros. Isto porque o custo médio da produção é de 24 cêntimos o quilo e o valor médio que é pago ao produtor é de 29 cêntimos, o que lhe dá um rendimento liquido de cinco cêntimos por quilo. Este valor duplica no caso do regadio, pois também a produção duplica.
José Alexandre falou também da potencialidade do modo de produção biológico em que o produtor, com um custo de produção na ordem dos 70 cêntimos por quilo, consegue vendê-la a 1,50 euros, dando-lhe um rendimento líquido de 80 cêntimos. No caso de produzir 20 toneladas através deste modo o seu rendimento anual andará na ordem dos 16 mil euros.
Manuel Arsénio, enólogo e produtor do Cadaval, falou sobre vitivinicultura, que pensa poder ser uma alavanca para a região, sobretudo no que respeita à aposta no mercado gourmet, com vinhos de alta qualidade e enoturismo associado. Actualmente a produção por hectare varia entre as sete e as 30 toneladas e o custo de produção anda na ordem dos 2000 a 2300 euros.
A horticultura foi abordada por António Rodrigo, director geral da Louricoop/Biofrade, que alertou para a diminuição sucessiva do rendimento de quem produz da terra. “A maior dificuldade dos produtores é não terem garantia da receita pois os preços são cada vez mais voláteis”, disse, realçando que em Portugal existem meia dúzia de cadeias de produção que dominam 80% do comércio agro-alimentar e que lhes confere uma capacidade negocial muito grande.

Carne de porco vendida abaixo do custo de produção

Jorge Serrazina, director técnico da Cooperativa Agrícola da Benedita, falou sobre os problemas do sector pecuário, que possui um impacto muito significativo na região. O responsável explicou que desde Agosto do ano passado que o preço da venda da carne de porco anda cerca de 30% abaixo do custo de produção e que têm grandes dificuldades em encontrar compradores.
Em Portugal, mais de 40% dos consumos de carne de porco são importados, principalmente de Espanha, que é o quarto maior produtor a nível mundial.
O orador diz que precisam de apoios para salvar as pequenas e médias explorações, exigir a rotulagem sobre a origem dos produtos vendidos nas grandes superfícies  e apelar à organização da produção para fazer frente a uma “procura extremamente concentrada”. É também necessário procurar novos mercados e abrir portas para escoar os excessos comunitários, sobretudo para a Rússia.
Rute Santos, coordenadora da APAS – Florestas, denunciou que as notícias que apontam para a proibição “cega” de novas plantações de eucaliptos terá impactos muito significativos. “O eucalipto na região Oeste é uma espécie com uma adaptabilidade “superior”, com produtividades muito interessantes a nível da gestão florestal que se pretende rentável como suporte à sustentabilidade da sua manutenção”, explicou.
O evento foi promovido pela Acção Católica Rural, a Fundação João XXIII – Casa do Oeste e a COOPSTECO – Cooperativa de Serviços Técnicos e Conhecimento.

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