O futebol distrital vale mais de 8 milhões de euros em volume de negócios e entrega ao Estado mais de 1,7 milhões de euros, só em impostos directos. Estes dados dizem respeito à época 2012/13 e são apontados no livro “O valor económico do futebol distrital”, do caldense Manuel Nunes, que serviu de base a uma tertúlia no Folio, no passado dia 17 de Outubro.
Os dados relativos à temporada 2012/13, na qual as competições da Associação de Futebol de Leiria (AFL) movimentaram 10.354 atletas e 688 equipas, apontam para um volume de negócios do futebol e futsal distritais superior a 8 milhões de euros, que deixaram nos cofres do Estado quase 1,7 milhões de euros em impostos directos.
Estes valores incluem gastos com equipamento desportivo dos atletas e custos de actividade dos clubes e da própria associação distrital.
Estes valores serão, sete anos depois, bastante superiores, tendo em conta que o número de atletas subiu na AFL para mais de 11 mil, além da questões ligadas com a inflação de preços.
Manuel Nunes, presidente da AFL, afirmou que o fenómeno desportivo é motor de desenvolvimento económico dentro das comunidades. Além da aquisição de material e equipamento desportivo, há um conjunto de serviços que facturam com a prática, como consultórios médicos e seguros desportivos.
Apesar disso, o dirigente realça que o Estado tem um encaixe financeiro muito mais significativo com o fenómeno futebolístico do que o investimento que faz. Manuel Nunes observa que o Estado central financia o futebol distrital com apenas 25,5 mil euros por ano, através de contrato programa com a AFL.
Além de não apoiar verdadeiramente a prática desportiva, o Estado ainda se aproveita dela aplicando a taxa de IVA máxima, o que para Manuel Nunes não faz sentido.
De resto, o dirigente – que também exerce o cargo político de deputado na Assembleia Municipal das Caldas da Rainha pelo PS – lamenta a ausência de ideias claras para o desporto ao nível do Estado central. “Houve eleições e tanto nas campanhas dos partidos, como nos debates e nas análises feitas pelos comentadores, não se falou de desporto, o que dá a ideia de que está tudo bem”, lamentou.
ASSOCIATIVISMO EM RISCO?
Outro aspecto em que Manuel Nunes se debruça no livro é no papel dos dirigentes benévolos, que são o garante dos clubes e associações que possibilitam a prática desportiva federada no país, substituindo-se, assim ao Estado.
No distrito, os mais de 2000 dirigentes associativos significariam um encargo de 1,4 milhões de euros por mês caso o seu trabalho fosse pago. O problema é que se tem verificado uma crescente dificuldade de sucessão nos clubes por falta de dirigentes.
O funcionamento das associações e clubes estão hoje a ser garantidas sobretudo pelas gerações dos 50 aos 70 anos. A renovação é lenta e feita sobretudo por mulheres, quando num passado ainda recente os dirigentes eram sobretudo homens.
Manuel Nunes acredita que a situação se pode inverter com a criação da figura do dirigente benévolo e um respectivo estatuto que lhe garanta colher benefícios deste trabalho voluntário, que poderiam passar por compensações em sede de IRS ou majorações no tempo de reforma.
Caso não se consiga travar esta diminuição de dirigentes associativos, corre-se o risco de muitos jovens perderem acesso à prática desportiva, observou Júlio Vieira, antigo presidente da AFL e actual dirigente da Federação Portuguesa de Futebol. Júlio Vieira adiantou que nos últimos 10 anos o distrito perdeu 30 clubes (de 160 para 130) e 500 no país, de 2400 para 1900, pelo que esta é uma questão que deve preocupar o governo.
CLUBES TAMBÉM SE QUEIXAM
Jorge Reis, presidente do Caldas, e Hélder Mesquita, presidente da Junta de Freguesia do Olho Marinho e dirigente da colectividade local, acrescentaram outras dificuldades que Estado e federação criam para os clubes não profissionais.
Jorge Reis disse que o Caldas é dos poucos clubes não profissionalizados a competir no Campeonato de Portugal (competição não profissional), para lamentar que não haja enquadramento para os jogadores amadores neste tipo de prova. “Não há enquadramento legal para pagar as deslocações, as refeições ou um subsídio aos jogadores”, observou, acrescentando que se torna necessário criar um estatuto para o jogador não profissional.
Outra dificuldade criada aos clubes é a obrigatoriedade de “pagar ordenados no valor de vários salários mínimos nacionais a treinadores nas competições nacionais, quando esses treinadores não são profissionais”, o que torna a actividade dos clubes insustentável. O presidente do Caldas revelou ainda que organizar um jogo da equipa principal custa 1100 euros e que os clubes não têm receita de jogo para cobrir essa despesa, acrescentando que se torna “mais barato para o clube ir jogar aos Açores do que jogar em casa”.
Na sua intervenção, Hélder Mesquita disse que clubes como o Olho Marinho, que têm dificuldade em encontrar patrocinadores, vivem muito dos eventos que organizam para angariar receita. No entanto, o Estado fica logo com 300 de euros de cada evento organizado, em forma de licenças e impostos.
A tertúlia juntou cerca de 40 pessoas e contou com a participação de Manuel Nunes, presidente da AFL, Margarida Reis, vereadora da Câmara de Óbidos, Vítor Pataco, presidente do IPDJ e Júlio Vieira, director da FPF.