A Assembleia Municipal de Óbidos não reconheceu o interesse público municipal para a regularização da actividade pecuária dos aviários da Avarela e da pedreira de Currais Novos, no Olho Marinho. Os deputados municipais do PSD e PCP votaram em consonância com a posição da autarquia, inviabilizando a possibilidade de legalização das duas explorações, enquanto que o PS se absteve, depois de ver chumbada a proposta apresentada para adiamento destes dois pontos.
Na reunião, que decorreu no passado dia 23 de Fevereiro e durou cinco horas, foram ainda aprovadas várias moções e algumas propostas incluídas em comissões já existentes.
A maioria dos deputados municipais entende que cinco pavilhões da exploração de perús da Avarela devem ser demolidos dando assim cumprimento à Declaração de Impacte Ambiental (DIA). Rui Raposo, do PCP, considera que o decreto-lei aprovado pelo governo PSD/CDS-PP, que possibilita a regularização de unidades produtivas sem título de exploração ou de exercício válido, visou essencialmente “legalizar o que nasceu em desconformidade com a lei”, pelo que é contra. Destacou ainda que o intuito deste diploma legal foi o de “satisfazer o interesse económico privado em prejuízo do interesse público”. No caso concreto dos pavilhões da Sociedade Avícola da Avarela, Lda., lembrou que foram construídos em “desconformidade” com o PDM de Óbidos, quanto às suas dimensões, considerando a localização em área classificada de Reserva Agrícola Nacional.
O deputado comunista realça que é ao “proprietário da obra que compete, em primeiro lugar, acautelar o cumprimento da lei ou dos regulamentos, onde se incluem os planos directores municipais e tal não aconteceu”.
Entende que a relevância económica resultante do funcionamento dos cinco pavilhões não se sobrepõe aos interesses ambientais e económicos do concelho e considera que, em contraponto, devem ser acautelados os interesses das populações da Avarela e zonas circundantes, “prevenindo as consequências de eventuais efeitos negativos, potencialmente agravados pela ampliação da exploração”.
Esta posição foi corroborada pelo presidente da Câmara, Humberto Marques, que recordou que o processo já se vem arrastando há vários anos. Salientou os problemas com as moscas associado a estes aviários e que a DIA já apresentava como condicionante para o licenciamento da actividade da exploração, a demolição dos cinco pavilhões.
O PS absteve-se neste ponto, depois de ter visto recusada a proposta de adiamento que apresentou por entender que havia falta de documentação fundamentada.
Os socialistas mostram a surpresa pelo facto da Câmara reenviar à Assembleia a mesma proposta que já havia apresentado em Novembro, “ignorando totalmente” o relatório da comissão de acompanhamento do Casal da Avarela, assim como a possibilidade de detectar erros que esse tivesse.
Os ânimos chegaram a exaltar-se quando, durante a longa discussão deste ponto, o presidente da Assembleia Municipal, Telmo Faria, perguntou ao deputado do PS, José Machado, que interesses tem neste assunto, pois viu-o com uma “acérrima” defesa num interesse privado. O deputado socialista evocou a figura da defesa da honra por se considerar ofendido e respondeu que a “insinuação feita é falsa”.
Exploração de rocha ornamental
Também a pedreira Currais Novos, no Olho Marinho, viu ser reprovado o reconhecimento público municipal que permite regularizar a exploração. O período destinado ao público, no início da sessão, foi aproveitado pelo responsável técnico daquela pedreira, Paulo Pedro, para explicar o seu funcionamento.
De acordo com o engenheiro de minas, a pedreira está a funcionar há mais de 20 anos, tem sete trabalhadores e dali é extraída rocha ornamental, os chamados calcários do Olho Marinho ou “Azul Óbidos”. O técnico referiu ainda que a exploração não gera resíduos, mas sim blocos de rocha ornamental de primeira, blocos de rocha ornamental de segunda e subprodutos. “Tudo isso são pedras que as autarquias podem comprar, muitas vezes para fazer barreiras ou segurar taludes”, acrescentou.
A empresa pretendia fazer a exploração por mais três anos e, no ano seguinte, fazer a recuperação do local.
O PS, que se absteve na votação, apresentou uma proposta para que também este assunto fosse adiado para uma próxima sessão, pedindo para, entretanto, serem esclarecidos vários pontos.
O deputado João Paulo Cardoso entendeu que as explicações dadas pelo técnico da empresa justificam o interesse público municipal e alertou para o facto de se a exploração agora parar, ficar lá o buraco.
Já o deputado comunista Rui Raposo lembrou que o seu partido há muito que vem alertando para o “negativo” exercício daquela actividade no planalto das Cesaredas e defendeu que os quatro municípios (Óbidos, Lourinha, Bombarral e Peniche) devem entender-se sobre o que querem para aquele local.
De acordo com o presidente da Câmara, Humberto Marques, existem achados arqueológicos e biodiversidade do local que é importante manter. O autarca acrescentou que existe uma articulação entre os quatro concelhos para um projecto de turismo “ainda em fase conceptual, que se está a candidatar para que exista um desenho paisagístico daquela zona, de modo a ser visitada”.
Os deputados municipais aprovaram, por unanimidade, a proposta da Câmara para que a sua integração no futuro sistema multimunicipal da Grande Lisboa e Oeste seja feita de forma a mitigar ao máximo os custos da estrutura e para manter o mais baixo possível os custos de saneamento.
Apesar de crítico da estratégia do anterior governo em matéria de águas e saneamento, que considera ter como objectivo a privatização futura da gestão pública da água e dos sistemas de águas residuais, Rui Raposo (PCP) votou favoravelmente a proposta por entender que a constituição deste sistema multimunicipal é o que melhor serve os interesses da população de Óbidos.
Socialistas querem melhorar regimento
A comissão que fez o regimento da Assembleia Municipal (com um elemento de cada partido) foi reactivada e irá agora estudar as propostas apresentadas pelo PS na última reunião. Estas têm por objectivo melhorar o funcionamento deste órgão e valorizá-lo. Consideram que as reuniões têm-se prolongado por muito tempo, que não tem havido intervalos a cada 90 minutos e que os 60 minutos do período de antes da ordem do dia têm sido “sistemática e largamente” ultrapassado. Os socialistas referem também que uma parte significativa do tempo total das intervenções é utilizada pelo presidente da Câmara e que importa evitar que as reuniões sejam fastidiosas e excessivamente demoradas. Querem ainda ver implementadas as boas práticas de funcionamento da Assembleia Intermunicipal do Oeste, que o órgão Câmara Municipal (presidente e vereadores) estejam afastados da mesa da Assembleia, “preservando-se a independência do órgão fiscalizador” e que as reuniões sejam transmitidas pela Internet.
“Além destes aditamentos, o que seria mesmo bom era que o regimento fosse cumprido”, registou a deputada Cristina Rodrigues (PS).
O PS apresentou também uma proposta de recomendação da Assembleia Municipal à Câmara para alteração às posturas municipais, que foi rejeitada pela maioria social-democrata. Os socialistas pretendiam ver diminuído o tempo máximo dos estrumes a descoberto, especialmente no período de Verão. “Propomos que quando se faça a estrumação de terras se tape imediatamente, em tempo quente porque este é um foco muito importante de moscas”, disse João Paulo Cardoso.
Unanimidade na defesa da Linha do Oeste
Foi aprovada por unanimidade uma moção, apresentada pelo PCP, sobre a situação da Linha do Oeste. Os deputados condenam a decisão da CP de retirar de circulação as automotoras “592” que serviam os comboios inter-regionais de ligação à linha do Norte e a Coimbra e exigem a reposição dessas composições. Reafirmam ainda a necessidade de modernização da Linha do Oeste.
Rui Raposo (PCP) lembrou que só em 2016 foram transportados na Linha do Oeste quase meio milhão de passageiros e que não aceitam que a CP, “para dar resposta aos compromissos contratuais noutro troço ferroviário, prejudique as populações servidas pela Linha do Oeste e ponha em causa o processo de recuperação e modernização da mesma”.
O deputado comunista realçou que a saída de circulação das automotoras “592” agravou o já existente problema de falta de material circulante nesta Linha, tendo havido vários dias em que foram suprimidos comboios e substituídos por autocarros, na ligação entre as Caldas da Rainha e Torres Vedras e entre Leiria e Caldas da Rainha.
TRANSFERÊNCIA DE COMPETÊNCIAS
O PCP apresentou ainda uma moção sobre a transferência de competências do Estado para as autarquias, que foi aprovada por maioria. O PS e o PCP votaram a favor e a maioria dos deputados do PSD absteve-se, viabilizando assim o documento, que teve apenas dois votos contra.
Os comunistas defendem que a solução a encontrar deverá passar por uma verdadeira descentralização de competências e que devem manter-se no Estado os poderes que permitam o desenvolvimento estrutural do país. De acordo com o deputado Rui Raposo, as novas competências para as autarquias exigem o preenchimento de condições (financeiras, de autonomia e de organização) para o seu pleno exercício. Para além disso, é também necessário repor competências ao nível das águas e das freguesias.
O presidente da Câmara, Humberto Marques, referiu que o processo tem sido “muito mal conduzido” pois fala-se de descentralização de competências com um caderno de encargos desconhecido. “Sou adepto da delegação de competências com contratos administrativos e velocidades diferentes. Não pode ser uma regra universal sem atender às especificidades e realidades de cada concelho”, concluiu.