Num país em que a maioria da população ainda utiliza carro próprio para seus percursos, começam a aparecer alternativas em termos de mobilidade e todos são convidados a participar nessa mudança, tornando-se mais multimodais
A conversa estava combinada no café do CCC e, à hora marcada, Jaime Neto estava no local e a sua bicicleta elétrica ficara no estacionamento do centro cultural. Demorou menos de 10 minutos no caminho e para o caldense este é, desde há algum tempo, um dos seus meios de transporte de eleição. Há cerca de sete anos foi buscar a bicicleta que já estava guardada há 30 anos e começou a utilizá-la nas suas deslocações. Mais recentemente, com a pandemia e o início das aulas e reuniões, com recurso ao computador, decidiu comprar uma bicicleta elétrica para andar pela cidade. Uma tendência que começa a ganhar cada vez mais adeptos.
“Andar de bicicleta é um prazer, dá boa disposição física e mental. Na deslocação para as aulas, ganho mais energia do que indo de carro e é também uma forma de mobilidade”, diz o professor nas escolas Raul Proença e de Santo Onofre e, por estes dias, ainda vereador do PS na Câmara das Caldas da Rainha. Jaime Neto considera, inclusive, que a bicicleta foi importante para exercer as suas funções na vereação, pois permitia-lhe mais “liberdade na mobilidade” para visitar locais e tirar fotografias sobre problemas que, depois, levava às reuniões e apresentava ao executivo municipal.
No entanto, “não é muito fácil andar de bicicleta nas Caldas”, reconhece o docente, que já apresentou várias propostas no sentido de tornar a cidade mais amiga dos utilizadores dos modos de mobilidade suave.
Jaime Neto evita locais como a Rua da Estação, que é estreita e tem um muro alto de um dos lados. “Ando a 20, 25 kms por hora mas há carros que querem andar mais depressa e fazem pressão, alguns automobilistas são muito agressivos”, conta, acrescentando que já quase teve um acidente na rotunda, por ter sido ultrapassado pela direita.
“Considero que há ainda muito trabalho a fazer, de convivência entre os vários modos de transporte, eu próprio também ando de automóvel e a pé, sou multimodal e acho que essa é a tendência de futuro, os vários modos puderem conviver”, resume.
Apesar de ainda encontrar obstáculos, o uso da bicicleta tem vindo a ganhar terreno em termos de mobilidade e a pandemia ainda potenciou mais a procura por este meio de transporte. As vendas de bicicletas e de bicicletas elétricas aumentaram 40% nos 27 Estados-membros da UE e no Reino Unido, no ano passado. De acordo com os dados da Confederação Europeia do setor, foi o melhor ano em várias décadas, com 22 milhões de bicicletas vendidas. Só Portugal vendeu mais de um milhão e meio de unidades.
A Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável tem “a meta ambiciosa” da construção de 10 mil quilómetros de ciclovia até 2030, com vantagens para a saúde e com impacto económico e social. “Mais ciclistas em circulação proporcionam maior sensação de segurança nas ruas, e mais oportunidades de interação social, beneficiando a economia de proximidade, pois o número médio de visitas a estabelecimentos comerciais tende a aumentar, bem como o nível total de consumo per capita”, refere o documento.
Jaime Neto defende que os municípios têm de ser mais ativos na adopção das políticas europeias nos territórios locais, dando o exemplo do projeto europeu de uma pista ciclável ao longo de toda a costa e salienta que quando integrou a Assembleia Municipal apresentou um plano intermunicipal da mobilidade ciclável das Caldas e Óbidos. O caldense acredita que este modo de deslocação mais sustentável e ativo tem “tudo para andar”, desde que os cidadãos vejam vantagem e os poderes políticos criem as infraestruturas de estacionamento e mais sinalização horizontal. A Câmara das Caldas, no âmbito do Plano de Mobilidade Urbana Sustentável, tem previstas ações de melhoria da circulação pedonal, incremento do número de vias cicláveis e implementação de sistemas de bicicleta pública e beneficiação do transporte público.
No que respeita ao transporte público e intermodalidade, a articulação entre os transportes municipais Toma e Obi e a possibilidade de aquisição do bilhete integrado já é uma realidade. Também o PART- Programa de Apoio à Redução Tarifária procurou aumentar o número de passageiros nos transportes públicos coletivos, através do apoio aos passes sociais, dentro do concelho, e também entre os concelhos do Oeste e a Área Metropolitana de Lisboa.
Modernização da Linha do Oeste
Um dos maiores desafios que se colocam à região em termos de mobilidade é a modernização e eletrificação da ferrovia, problema que se arrasta há décadas e que vê ocorrer adiamentos sucessivos.
Há dias, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, garantiu à Gazeta das Caldas que o contrato de adjudicação para o troço entre Torres Vedras e as Caldas da Rainha deverá ser assinado nos próximos tempos, permitindo o início da empreitada “o mais tardar em janeiro” do próximo ano. Através do programa Portugal 2030 será possível modernizar o troço da Linha do Oeste entre as Caldas e o Louriçal. Uma intervenção que, de acordo com o governante, trará ganhos, desde logo a nível ambiental, com a substituição das composições atualmente movidas a diesel, como também do ponto de vista da viabilidade deste meio de transporte.
O troço das Caldas para norte também terá ganhos de tempo, embora possam não ser os desejados para concorrer diretamente com o automóvel. Para compensar essa falta de competitividade, há fatores a considerar como a comodidade da viagem, a sustentabilidade ambiental, uma maior capacidade para passageiros e mercadorias e os custos associados a uma viagem de combóio.
Também a CP, em resposta à Gazeta das Caldas, refere que se “justifica plenamente uma aposta na mobilidade ferroviária que permita servir as populações dessa região”. A empresa tem investido na revitalização da sua capacidade ao nível da manutenção de material circulante, conforme é o exemplo da reabertura das oficinas na Figueira da Foz, em novembro de 2020, para poder dar uma resposta mais eficaz de mobilidade a esta linha, concretiza.
Ainda de acordo com a empresa do Estado, serão também muito importantes para esta linha as mais valias que possam resultar do estudo em curso pelo governo no Plano Nacional Ferroviário, mantendo-se a CP “muito expectante relativamente ao aproveitamento de todas as oportunidades, para que seja possível ir ao encontro das necessidades de mobilidade das pessoas e dos desafios estratégicos do país”.
Ao nível do material circulante, “sendo expectável” a chegada das primeiras novas unidades encomendadas à Stadler a partir de 2024/2025, a CP poderá também fazer uma reafectação do parque de material circulante nas várias linhas em que opera, melhorando as condições de conforto e eficiência da sua operação, conclui a empresa. ■