Alunos deram um abraço humano aos colégios e m protesto contra as decisões do Governo

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O protesto decorreu num ambiente alegre e nada crispado | BEATRIZ RAPOSO
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Mais de mil alunos, professores, funcionários e encarregados de educação do Colégio Rainha D. Leonor mostraram-se unidos na sexta-feira, 6 de Maio, ao participarem na iniciativa nacional “Movimento em Defesa da Escola Ponto”. Por todo o país, os colégios com contrato de associação mobilizaram-se contra as recentes decisões do Governo, que no próximo ano lectivo pretende preencher todas as vagas nas escolas públicas antes de autorizar a abertura de turmas de 5º, 7º e 10º anos nos colégios privados financiados pelo Estado.
Nem a chuva estragou os planos aos alunos, que em vez de se juntarem no espaço de recreio reuniram-se no Pavilhão da escola. A comunidade escolar do Colégio Frei Cristóvão, em A-dos-Francos, também aderiu à iniciativa.

Sexta-feira, 6 de Maio, 10h45. São Pedro parece não querer ceder e a chuva obriga a uma mudança de planos. O abraço humano previsto realizar-se no exterior do Colégio Rainha D. Leonor passa para o interior do Pavilhão Gimnodesportivo. Os alunos vestem t-shirts brancas, os professores amarelas. Todos estão entusiasmados e com vontade em mostrar a sua posição: querem ver retirada a decisão do Ministério de Educação que diz que não autoriza a abertura de turmas de início ciclo no próximo ano lectivo até que as escolas públicas preencham todas as vagas. Outra questão que os preocupa é que apenas aqueles que residam nas freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, Nadadouro e Foz do Arelho poderão matricular-se nesta escola em 2016/2017.

Embora a nível nacional os colégios tenham sido desafiados a organizarem um abraço humano à escola, o Rainha D. Leonor quis fazer mais e resolveu dar esse mesmo abraço à volta de um logótipo humano do colégio em forma de coroa. Além disso, colocaram 500 flores de papel (feitas à mão) no gradeamento da escola, largaram 200 balões e exibiram 600 cartazes com mensagens como “Pela liberdade de escolha da escola”, “Nós também somos professores” ou “Não tirem o meu filho da escola que ele tanto gosta”.
Mais de mil pessoas compõem o Pavilhão Gimnodesportivo e, todos juntos, gritam várias vezes pelo nome desta escola. Em alto e bom som.
Meia centena de pais também marca presença. Susana Almeida tem duas filhas a estudar no Colégio, uma delas em transição de ciclo (vai passar para o 7º ano), e hoje abdicou de um dia de férias para poder fazer ouvir a sua voz. “Esta situação é uma grande injustiça e contribui apenas para destabilizar os miúdos, principalmente aqueles que daqui a pouco tempo têm exames nacionais. Como mãe estou muito preocupada e sinto que me tiraram o tapete pois se escolhi este projecto educativo é porque o considerei o melhor para as minhas filhas”, diz Susana Almeida, acrescentando que não encontra em nenhuma escola pública o ambiente familiar que o Colégio proporciona aos alunos.
Já Tatiana Maltez afirma que se mudou de São Martinho do Porto para as Caldas precisamente para que os dois filhos morassem mais perto da escola. “Peço apenas que me apresentem provas do impacto que esta medida vai ter nos contribuintes, nas redes de transportes, nos comércios aqui à volta e nos próprios professores, que se arriscam a ficar sem emprego”, contesta a encarregada de educação. Também Mónica Gaspar reclama por respostas do Ministério de Educação, salientando que não a assusta mudar os filhos para a escola pública, desde que possa escolher aquela que mais lhe agrada. Esta mãe acrescenta ainda que o Colégio é o único estabelecimento de ensino do concelho que pode receber todos os graus de ensino, permitindo-lhe matricular os três filhos na mesma escola.

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“O Governo não cede”

Sandra Santos, da direcção pedagógica do Colégio, faz um balanço positivo de todas as iniciativas levadas a cabo pela escola, elogiando o ambiente interno que se conseguiu promover: toda a comunidade escolar está unida e com vontade de “ir à luta”. Contudo, “não sei qual é o balanço de quem decide porque os discursos do Ministério da Educação continuam a não mostrar qualquer sinal de cedência”, diz a responsável, adiantando que a direcção propôs à Câmara a abertura de um número mínimo de turmas que garanta a manutenção do Colégio e não apenas aquelas que sobrarem às escolas públicas.
O Colégio Rainha D. Leonor tem actualmente 35 turmas com contrato de associação (1005 alunos) e arrisca-se a perder 12 no próximo ano lectivo. O posto de trabalho de 15 professores e 4 funcionários, assim como o financiamento de 966 mil euros também estão em causa. No caso do Colégio Frei Cristóvão, a permanência de 160 alunos (de cerca de 400) pode não ser assegurada no próximo ano, tal como o emprego de 30 trabalhadores, segundo adiantou a direcção daquele estabelecimento de ensino à Gazeta das Caldas.

Câmara diz que a lei é sempre para cumprir

Com perguntas e respostas enviados por e-mail, a Câmara das Caldas respondeu da seguinte maneira às questões do nosso jornal.

GAZETA DAS CALDAS – Face aos protestos dos colégios privados, há razão para perspectivar que estes venham a fechar? Qual a posição da Câmara e do vereador da Educação face a este assunto?
R – Se não forem autorizadas novas turmas do 5º, 7º e 10º no Colégio Rainha D. Leonor e 5º e 7º no Colégio Frei Cristovão para o próximo ano lectivo e seguintes, ao fim de três anos não existirão turmas a funcionar nesses estabelecimentos e, naturalmente, encerrarão.
Actualmente existem 51 turmas a funcionar nestes dois estabelecimentos. Em nossa opinião, as actuais escolas da cidade das Caldas da Rainha não têm capacidade para acolher mais estas 51 turmas.

GC – Enquanto conhecedora da rede escolar do concelho das Caldas, a autarquia entende que a oferta das escolas públicas é suficiente para acolher todos os alunos, ou haverá turmas que deverão ficar nos colégios com contrato de associação? Se sim, quantas turmas?
R – A Rede é definida pelo Ministério da Educação. Devem manter-se as turmas que permitam o funcionamento dos estabelecimentos de modo a que as escolas (públicas, privadas ou com contrato de associação) continuem a garantir a qualidade do ensino que vêm demonstrando e que se tem traduzido nos óptimos resultados que os alunos do concelho têm obtido.
Não sabemos quantas turmas são necessárias para que os colégios se possam manter em funcionamento. Essa é uma matéria que terá de ser avaliada entre o Ministério da Educação e as entidades proprietárias.
Apenas podemos reafirmar que sem uma rede pública com oferta adequada não será possível garantir o acesso ao ensino público a todos os alunos do concelho.

GC – Tendo em conta que, legalmente, só deverão ser encaminhadas turmas para os colégios com contrato de associação se não houver capacidade disponível nas escolas públicas, a Câmara entende que, ainda assim, deve-se desrespeitar a Lei por forma a evitar que os colégios fechem?
R – A lei deve ser sempre respeitada.

Escolas públicas das Caldas podem receber turmas do Colégio

Gazeta das Caldas contactou os agrupamentos Rafael Bordalo Pinheiro, Raul Proença e D. João II, tendo constatado que as escolas públicas caldenses têm capacidade de sobra para absorver as 12 turmas financiadas pelo Estado que estão no Colégio Rainha D. Leonor.
Dessas 12 turmas do Colégio estão em causa cinco turmas do 5º ano, quatro do 7º e três do 10º.
Relativamente ao 5º ano, a D. João II consegue receber mais duas turmas e a EBI Santo Onofre mais três. Já no 7º ano, a D. João II também pode inscrever mais duas turmas, a EBI Santo Onofre mais duas e a Bordalo Pinheiro mais uma. Isto significa que as escolas públicas das Caldas podem, pelo menos, abrir mais cinco turmas no 5º ano e outras cinco no 7º. Sem contar com a EB Santa Catarina, que tem actualmente 14 turmas, mas pode chegar às 18, sendo que as quatro turmas sobrantes podem abrir tanto no 5º como no 7º anos. Finalmente no 10º ano, tanto a Raul Proença como a Bordalo Pinheiro têm resposta para mais duas turmas cada.
Estes dados indicam que as escolas públicas das Caldas têm capacidade para as 12 turmas do Colégio Rainha D. Leonor, ficando apenas por esclarecer a resposta às turmas em risco do Frei Cristóvão (que não forneceu esse número à Gazeta).
Céu Santos, directora do Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro, disse que no ano lectivo 2006/2007 a Bordalo Pinheiro ficou “meio vazia” porque perdeu muitos alunos para o Colégio Rainha D. Leonor. “Só conseguimos dar a volta porque investimos no ensino profissional, caso contrário muitos professores continuariam com horário zero”, acrescentou a responsável, adiantando que esta escola se arrisca a não ter turmas de 7º ano no próximo ano lectivo caso não receba alunos do Colégio.
A vereação socialista caldense solicitou uma reunião de executivo com os directores dos agrupamentos, de forma a obter mais respostas, dada “a incapacidade do executivo PSD em facultar dados concretos do município que possam ajudar a medir com propriedade a actual capacidade de alunos e turmas adicionais da rede pública”. O PS das Caldas afirma ainda repudiar as afirmações de Tinta Ferreira, que defendeu que “nenhuma das escolas públicas do concelho com ensino secundário deve integrar qualquer turma do colégio”.
Em comunicado, o PS Caldas insurge-se contra a “demagogia” em torno desta questão e afirma que “não estão em causa os contratos de associação em vigor até 2018 (…) assim como não está em causa a interrupção de nenhum ciclo de estudos que já tenha sido iniciado”, o que significa que nenhum aluno será obrigado a abandonar a escola que frequenta actualmente.
Para a passada quarta-feira estava prevista uma reunião dos directores dos três agrupamentos caldenses no Ministério da Educação.

Quando a PJ esteve nos Colégios

Em Janeiro de 2014 a Polícia Judiciária apreendeu viaturas, telemóveis e computadores aos colégios Rainha D. Leonor e Frei Cristóvão durante uma operação que envolveu buscas a mais três três colégios do grupo GPS (dois em Mafra e um na Batalha).
A investigação, dirigida pela 9ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, foi feita em conjunto com a Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ. Em causa estava a suspeita de crimes de corrupção e branqueamento de capitais.
O grupo GPS detém 26 colégios, dos quais 14 recebem financiamento do Estado. Em 2014 os contratos de associação previam que os privados recebessem por ano 85.000 euros por cada turma encaminhada que lhes fosse encaminhada da rede pública.
Este grupo é liderado por António Calvete, que enquanto deputado do PS, pertenceu à Comissão de Educação da Assembleia da República. No GPS trabalharam ex secretários de Estado e ex-directores regionais de Educação, quer do PS, quer do PSD. Entre eles figuram José Canavarro e Paulo Pereira Coelho (que foram secretários de Estado do governo de Santana Lopes) e José Almeida e Linhares de Castro que foram, respectivamente, directores regionais de Educação de Lisboa e do Centro. C.C.

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