Eles são os rostos dos concessionários e é por eles, os vendedores, que passa inevitavelmente a aquisição de um automóvel. No passado eram vistos como alguém que tenta “impingir” um negócio, mas essa imagem do vendedor de automóvel está a mudar. Gazeta das Caldas apresenta seis profissionais de carreira em stands de referência nas Caldas. São unânimes em considerar que a honestidade, a empatia e a transparência são a melhor forma de conquistar os clientes. Acreditam que não há retorno nos avanços tecnológicos e que este até é o melhor caminho a seguir por um sector identificado como um dos mais problemáticos no que diz respeito à poluição. Revelaram-nos alguns dos episódios que mais os marcaram e também os seus carros de sonho.
1- Como chegou a esta actividade?
2- Quais são, para si, as três principais características de um automóvel?
3- Há uma “receita” para se vender um automóvel?
4- Quais foram os negócios que mais o marcaram, pela positiva e pela negativa?
5- Que opinião tem acerca das novas tecnologias no automóvel, nomeadamente os motores eléctricos e a condução autónoma?
6- Qual é o seu carro de sonho?
Idade: 45 anos
Tempo na actividade: 19 anos
Local de trabalho: Auto Júlio
“A opinião do director comercial era que não me aguentava seis meses”
1- Cheguei ao ramo automóvel por uma questão de oportunidade. Tinha acabado de sair da tropa, trabalhava na altura num café e um dos clientes comentou que a Auto Júlio estava a fazer recrutamento de comerciais e que era muito amigo do senhor António Júlio. Vim a uma entrevista da qual nunca mais me esqueço, com o então director comercial, António Ramalho, porque a opinião dele era que eu não me aguentava mais de seis meses. Tinha na altura 21 anos. Hoje tenho 45 e ainda cá estamos os dois!
2- Pessoalmente a robustez do automóvel é muito importante. Com os factores tecnológicos não há automóveis maus. O design do carro é importante, mas as garantias e o local onde é adquirido também são muito importantes. Costumo dizer aos clientes que devem olhar para o preço, mas também para o tipo de garantia que a viatura tem e o concessionário onde compra. Existem muitos concessionários, mas na nossa zona têm vindo a desaparecer muitos concessionários, apesar da qualidade das marcas. Tenho a sorte de estar num grupo forte.
3- A receita é ser sincero com as pessoas, essencialmente. Os clientes hoje têm a informação toda e não se pode esconder o que o carro traz, ou o que faz, porque mais cedo ou mais tarde as pessoas sabem e não nos voltam a procurar. É preciso gostar do que se faz, tenho visto passar muitas equipas de vendedores, que pensam que é só andar de gravata e de carro novo e não se corre atrás. Isso não funciona. É preciso ser simpático e conhecer o produto que se está a vender.
4- Ao longo destes anos há muitas boas notícias e outras menos boas, porque somos humanos. No ano passado tive uma situação em que entrou no stand um cliente com a filha e me disse: “como não há duas sem três César, agora tens que vender o carro à minha menina”. E lembrei-me que quando vendi o primeiro automóvel àquele senhor, aquela jovem estava na barriga da mãe. Depois vendi um carro aos pais do senhor e vendi à filha dele. É uma situação que me deixa orgulhoso.
Pontos maus, tive um senhor que comprou uma viatura que dizia que trazia dois aparelhos de ar condicionado e a viatura dele só trazia um. Foi uma situação complicada de gerir para quem estava a começar. E outra foi o vender quatro lotes de viaturas para o comércio a uma pessoa com quem contava como amigo, que na altura de pagar o quarto lote fechou a empresa e desapareceu.
5- Em relação aos motores eléctricos a minha opinião é que o futuro passa por aí, o caminho é que os carros sejam cada vez mais eléctricos. Quanto à condução autónoma, para mim deve ser a pessoa a comandar a máquina e não o inverso, apesar de os sistemas estarem cada vez mais aperfeiçoados e de haver uma vontade para que seja cada vez mais dessa forma.
6- O meu carro de sonho é qualquer um dos que tenho ao dispor nesta empresa. Costumo dizer que os nossos sonhos têm que ser coisas diferentes, que não o automóvel. Em Portugal há muito o culto das marcas premium, o meu sonho é que as pessoas vissem que há marcas tão boas ou melhores que essas, que podem ser carros de sonho com menos custo e o mesmo estatuto.
Idade: 43 anos
Tempo na actividade: 25 anos
Local de trabalho: Auto Leandro Santos
“Todos os três irmãos começámos a lavar carros”
1- Cheguei por descendência familiar. O meu pai comprou o stand em 1987, eu entrei a tempo inteiro talvez em 1998. Comecei por lavar carros e depois fui subindo na empresa. Todos os três irmãos começámos a lavar carros. Houve a saída de um vendedor e então passei para as vendas. O Cláudio estava nas limpezas, a pessoa que estava a tomar conta da oficina saiu e passou a ser ele. O Marco é que não entrou pelas limpezas, mas também as fez nas férias.
2- O automóvel tem que ter qualidade, é a principal porque é o que define a duração. Se não tiver qualidade ao fim de quatro ou cinco anos a pessoa está a trocá-lo e não pode, convinha que o carro andasse perto de oito anos senão fica pesado financeiramente. Outra coisa que é importante é, na manutenção, ter um ponto de referência onde a pessoa se possa dirigir. E a terceira, que as pessoas muitas vezes acham que é a primeira, é o preço. Tem que ser bom, mas não um milagre.
3- A receita é atender bem o cliente. Muitas vezes o cliente sabe o que quer, mas talvez mais de metade não tem uma ideia fixa, temos que ser nós a orientar o melhor produto para o serviço que o carro vai fazer. Comprar grandes carros para ir e vir para o emprego, ou um carro pequeno para grandes viagens, não resulta e é preciso explicar.
4- Pela positiva há muitos, ao fim de todos estes anos. Às vezes vamos na rua e as pessoas interpelam-me, perguntam se me lembro de lhe ter vendido um carro que ainda tem. Más situações há uma ou outra, mas tentamos satisfazer as pessoas ao máximo. Por norma derivam de escolhas que as pessoas fizeram e não foram as mais acertadas e tentam empurrar a má escolha para nós. Por exemplo há quem compre carros diesel, andam pouco com eles e acabam por ter problemas com o filtro de partículas.
5- O automóvel eléctrico acho que tem que ir evoluindo com passos firmes. Neste momento existem prós e contras. O quilómetro fica barato mas o investimento inicial é elevado. Para se ter uma solução familiar ainda fica mais caro. E a manutenção é algo que ainda não sabemos como vai funcionar. Parece que não é qualquer oficina que pode fazer manutenção, é preciso uma certificação para trabalhar com eles porque é alta tensão. O caminho é esse, mas para quem vive do ordenado ainda é cedo.
6- Porsche. É o carro que me levava a passar um cheque, pela forma como é desenhado, a construção, a condução por ser um carro para ter anos e anos. É o carro mais completo que já vi, que já experimentei. Está sempre actual. Quando sair do negócio o meu carro pessoal, se Deus quiser, há-de ser um Porsche.
Idade: 43 anos
Tempo na actividade: 18 anos
Local de trabalho: Caetano Auto
“As novas tecnologias criam sensações de qualidade e fiabilidade que queremos ter num carro”
1- Vi na Gazeta das Caldas um anúncio a pedir vendedor. Estava num sítio que ia fechar e consegui vir para a então Salvador Caetano. Fiz a entrevista e aceitaram-me acho que logo na hora, comecei a trabalhar passado uma semana. Os homens gostam sempre de carros, é algo que nos fascina. Não me estava a ver no ramo, mas concorri e fiquei, foi uma oportunidade que apareceu.
2- Um bocado influenciado pela marca é fácil responder a isso. Um carro deve ter qualidade, durabilidade e fiabilidade. É um bocado toyotista, eu sei, mas se por um lado gostas de ter o conforto, o equipamento, por outro também gostas de estar descansado.
3- Há várias receitas. Mas acho que tem muito a ver com a confiança que consegues transmitir às pessoas. É importante conquistares a pessoa quando entra pela porta do stand e será essa a receita principal, é a que consegues controlar. Pode não resolver o assunto, mas se se cria uma relação interessante entre vendedor e cliente é um caminho aberto haver empatia, porque há muita concorrência.
4- Tenho muitos episódios. Pela positiva é a confiança que se conquista a ponto de nos tornarmos amigos dos clientes e as pessoas ligam para ti quando acontece alguma coisa relacionada com o carro, seja bom ou seja mau.
Episódios negativos, tenho um engraçado. Vendi um carro a uma pessoa numa altura em que o financiamento da banca quase não existia e éramos nós que facilitávamos os pagamentos faseados. Isto foi no início da minha carreira. Fui entregar o carro a Leiria, a pessoa dava-me um valor inicial e passava 10 cheques para descontar mensalmente. Matriculámos o carro, fui para Leiria, não havia auto-estrada, e quando cheguei a pessoa disse-me para esperar. Quando chegou disse-me que estava com um problema no banco e não ia conseguir passar os cheques. As ordens eram voltar com o carro. A história repetiu-se outra vez passados uns dias e o negócio ficou sem efeito. Passado algum tempo soube que viram essa pessoa num carro de outra marca novinho em folha, ou seja, conseguiu fazer noutro lado o que não conseguiu aqui.
5- A minha opinião é que somos pouco preocupados com o ambiente mas vamos ter que ser. Comprar carros a diesel para fazer poucos quilómetros não faz sentido, com a agravante que nesse caso os filtros de partículas podem ser um problema. As novas tecnologias melhoram o ambiente em que vivemos e ajudam a criar as sensações de qualidade e fiabilidade que queremos ter num carro. As normas de poluição vão continuar a apertar o cerco à poluição, o diesel vai ter dificuldades para acompanhar e as alternativas passam pelo eléctrico.
6- Não posso dizer que tenho um preferido, mas já que é de sonho, olhando para o que tenho internamente, gosto muito de um Lexus GS450h, preto. Tem tecnologia híbrida mas potente, tem um desempenho espectacular, experimentei uma vez e nunca me esqueci. Quem sabe um dia!
Idade: 42 anos
Tempo na actividade: 19 anos
Local de trabalho: Primeiro Carro
“É preciso que não apareçam muitos Trumps”
1- Foi por acaso. Há 19 anos fui trabalhar para a extinta Assessor e estou por minha conta há cinco anos.
2- Se estamos a falar de usados, a principal é a conservação porque o que salta à vista é o aspecto. Mas mais importante é vermos a mecânica e saber o historial, se tem revisões feitas na marca, se foram feitas a tempo e horas, que óleos foram colocados, porque às vezes não se colocam os indicados e hoje, com os filtros de partículas, os motores têm que ter os óleos indicados e eles são diferentes de marca para marca e ainda há oficinas que têm um bidão de óleo que dá para todos os carros e não pode ser assim.
3- A receita é trabalhar com seriedade, honestidade e transparência. O nosso ramo é dado a negócios menos claros, temos que primar pela transparência. Por exemplo, dizer que um carro era de serviço só porque tem poucos quilómetros, quando era de uma rent-a-car, não faz sentido até porque as pessoas, se quiserem, podem saber isso tudo. Não é um negócio que tenha muitos segredos, qualquer pessoa compra e vende um carro, difícil é manter-se ao longo dos anos.
4- Pela positiva felizmente é a maioria. Desde que não haja problemas e que o cliente fique satisfeito já é positivo. Conquistar a confiança dos clientes é o melhor que levamos da profissão. Pela negativa há sempre alguma coisa, apesar de tentarmos que não aconteça. Tive uma vez um problema com um cliente que também era meu fornecedor. Quiseram comprar o carro sem garantia e eu fui na patetice de o fazer e no fim o carro deu problemas. Não se pode facilitar.
5- Acredito que o futuro vai passar por aí, pelo o eléctrico ou pela célula de hidrogénio. Mas é preciso vontade e que não apareçam muitos Trumps, porque o que ele defende é o petróleo. Mas acredito que dentro de 10 anos perto de metade dos automóveis já serão eléctricos.
6- O carro que mais gostei de conduzir e que adoro é o Audi A7. E vou ter um brevemente. Pela condução, pela segurança que transmite, é um carro espectacular.
Idade: 50 anos
Tempo na actividade: 18 anos
Local de trabalho: LPM
“O contacto com o cliente é o estimulante da actividade”
1- Costumo brincar um pouco com a minha situação. Acabei os meus estudos, o 12º ano, e fui profissional de futebol no Caldas Sport Clube. Boa ou má foi a minha opção na altura. Aos 31 anos as pernas começaram a faltar, terminei a carreira e fiquei a pensar o que podia fazer. Andei um ano a saltar de actividade em actividade, depois entrei no ramo automóvel, em 1999 na Auto Júlio, na Hyundai. Estive lá dois anos, depois mais dois na antiga STA em Torres Vedras e em 2003 entrei nesta empresa. Até 2008 fui vendedor, a partir daí passei a chefe de vendas da Peugeot.
2- É costume dizer-se que a estética, o primeiro impacto, é uma das principais razões para se comprar um automóvel. Depois existe a parte prática, a opção da motorização, se vai fazer menos quilómetros, escolhe-se gasolina, se se faz mais, diesel. E depois os níveis de equipamento dos carros. Mas há outros factores importantes. O agregado familiar é muito importante. Para uma empresa, o espaço de caixa é importante. Há muitos factores a ter em conta.
3- Não. É preciso profissionalismo, empatia com o cliente, que este veja não um negociante, mas alguém que o está a ajudar na escolha da viatura. Se nos ver como vendedor, e sabemos a fama que havia há uns anos atrás, vem desconfiado. A empatia, a honestidade e o cliente ver-nos como um parceiro são muito importantes.
4- As más são relativamente poucas. As boas há sempre histórias, é um processo com fidelização de clientes que são quase família em termos de trato. A área comercial é diferente todos os dias, não existe rotina. O contacto com o cliente é o estimulante da actividade, o proporcionar aos clientes a satisfação de usufruírem das nossas viaturas, é a melhor história que temos.
Pela negativa não estou a ver nada que me tenha marcado. Há negócios que se perdem, como em tudo.
5- Em todos os aspectos, os motores eléctricos e híbridos até às tecnologias, a evolução dos automóveis foi muito grande. Podemos ter todas as funções do telemóvel no carro, é a evolução dos tempos e é bom que assim seja. E a preocupação de fazer carros mais amigos do ambiente é fundamental. O futuro será com automóveis menos poluentes, o Estado já incide sobrre isso na carga fiscal e o futuro será esse.
6- O meu carro de sonho é Peugeot, sem dúvida! Gosto muito da marca que represento, são 14 anos de uma marca que tem evoluído muito, os modelos são cada vez mais bonitos, mais tecnológicos, mais ecológicos, somos das marcas com menos emissões.
Idade: 54 anos
Tempo na actividade: 31 anos
Local de trabalho: Lubrigaz
“Vendi vários automóveis à mesma família e em gerações diferentes”
1- Em Maio de 1986 respondi a um anúncio publicado na Gazeta das Caldas solicitando “vendedor de automóveis com ou sem experiência”. Fui admitido de imediato, apesar de não conhecer nem as Caldas da Rainha nem o concelho e de vir de uma actividade completamente diferente, pois trabalhava numa farmácia. Estou há 19 anos na Volkswagen.
2- Fiabilidade, segurança e a imagem de marca associada à credibilidade.
Quanto mais fiável, menor a probabilidade de ter problemas com avarias. Um bom automóvel deve ter bons índices de segurança activa, tudo o que tem o objetivo de evitar o acidente, e de segurança passiva, ou seja, tudo o que tem o objetivo de minimizar os danos e proteger os ocupantes no caso de um acidente.
E ter uma imagem de marca forte, credível. É o reflexo da personalidade da marca ou da essência do produto. É naquilo que as pessoas crêem e o que esperam da marca, desde a modernidade dos modelos, a qualidade dos veículos, o arrojo da tecnologia e, sem dúvida, a capacidade de entender o que o cliente deseja de tal forma que se cria uma relação para a vida.
3- A receita está em respeitar o cliente. Para ganhar credibilidade e a confiança do cliente tem de se conhecer muito bem aquilo que se está a vender, quais as vantagens e os benefícios. Caso contrário, para que serve o vendedor…?
Acreditar no que vende, ser fã da marca que vende e não apenas um consumidor. Se o vendedor não acredita no potencial do seu produto, como exigir que o cliente faça o mesmo? Normalmente ouve-se mais do que se fala até se perceber aquilo que o cliente quer e precisa.
4- Ao longo destes 31 anos de vendas tenho várias situações positivas. Não é fácil escolher uma, o positivo é um conjunto de situações que vão desde os laços de amizade criadas através da venda do automóvel, o vender vários automóveis à mesma família e em gerações diferentes, ou ter várias dezenas de automóveis vendidos ao mesmo cliente.
O episódio mais negativo que tive na actividade foi um cliente que me comprou um automóvel que demonstrou uma felicidade e emoção tão grandes, foi para casa chamou os filhos para verem o carro novo, felicíssimo da vida e, nessa noite, infelizmente, faleceu.
5- A mobilidade elétrica ainda não é um produto para todos. O preço não ajuda mas será o futuro a curto prazo. Na minha opinião, penso que a evolução será gradual, porque a nossa mentalidade ainda não está formatada para termos de carregar o carro como fazemos com o telemóvel e ainda não existe estrutura para os carregamentos.
A condução autónoma pode ser útil em determinadas situações. Por exemplo, quando vamos trabalhar de manhã e estamos no trânsito, haverá a possibilidade de lermos o jornal no carro. Ou quando vamos a um restaurante e não encontramos lugar de estacionamento, o próprio carro ficará responsável por encontrar um lugar e estacionar sozinho, e quando saímos do restaurante ele vai ter connosco.
6- O Volkswagen Golf GTI, pelas suas características e linhas desportivas. Foi até hoje o automóvel que me deu mais prazer conduzir.