Alberto Gaspar tem 83 anos e nasceu no Bairro da Ponte. Toda a sua vida foi vivida de forma social e politicamente empenhada. Era oposicionista ao regime, teve ficha na Pide e passou a ser militante do PCP logo após o 25 de Abril. É também um dos responsáveis pela participação caldense na Festa do Avante.
Alberto Gaspar viveu intensamente o 16 de Março e o 25 de Abril e conta à Gazeta as Caldas como foram aqueles dias intensos do derrube da ditadura.
O 25 de Abril foi um dos dias mais felizes da vida de Alberto Gaspar. Ter tido a oportunidade de vivenciar os acontecimentos relacionados com a revolução dos Cravos “foi uma imensa alegria, uma sensação de libertação que é difícil de descrever”, contou o octogenário que, no dia 26 de Abril, se dirigiu ao Forte de Peniche, onde se juntaram milhares de pessoas. “Fomos lá exigir que toda a gente fosse libertada!”. Alberto Gaspar, acompanhado por Custódio Freitas – também ele um conhecido oposicionista ao regime – entrou no forte enquanto ainda não se sabia se haveria ordem de Lisboa para libertar todos os presos. Quando chega a mensagem de libertação total, Gaspar está na entrada da fortaleza. Abre os braços, faz o sinal de vitória e grita: “Conseguimos!”. E houve um fotógrafo, de Peniche, que captou aquele momento. Naquela fotografia, que se tornou iconográfica e tem estado exposta na Fortaleza de Peniche, António Gaspar está rodeado por “malta nova das Caldas pois estávamos juntos a celebrar o 25 de Abril”.
O 16 de Março ao vivo
Em relação ao 16 de Março, conta que assistiu aos acontecimentos de longe. Primeiro viu os carros de combate (que pensa que vinham de Tomar) na cidade. E toca de seguir os Unimogs. “Pendurei-me num dos tanques e vim até à Rainha”, contou, acrescentando que pretendia saber de que lado estavam aqueles soldados: “se eram pelos revoltosos ou pelos situacionistas”. Não conseguiu averiguar grande coisa pois o condutor, um jovem de 20 anos, não abriu a boca. Limitava-se a cumprir ordens. “Na altura tememos que as tropas do cerco bombardeassem o RI5 se eles não se rendessem”, recordou o caldense, explicando que estava muita gente na rua. De qualquer modo, os militares tinham mandado retirar toda a gente das imediações do quartel e por isso o octagenário só conseguiu assistir aos acontecimentos a partir do Avenal. “A revolta do 16 de Março foi um prenúncio do que se iria passar. Estávamos naquela ânsia que resultasse, mas não foi possível naquele dia…”, recordou.
Antifascista desde cedo
Alberto Gaspar despertou para a vida política quando ainda era adolescente. Tinha 15 anos quando começou a ler A República, um jornal que fazia oposição ao regime. Fazia-o publicamente, sem medos, no café do Diamantino, no Bairro da Ponte.
Rapidamente fez-se amigo de Custódio Freitas e foi convidado a fazer parte do MDP/CDE (Movimento Democrático Português/ Comissão Democrática Eleitoral), tendo chegado a ir aos congressos de Aveiro.
Era, pois, um oposicionista conhecido da polícia política. Só no ano de 1973 foi identificado 12 vezes nas Caldas, em Leiria e em Lisboa, após ter assistido a espectáculos e actividades culturais que eram conotados com a oposição. No final, os agentes da Pide pediam-lhe para se identificar. Se não se dá a Revolução dos Cravos, “alguns de nós seriamos engavetados”, contou acrescentando que deve ter “uma bela ficha” na Torre do Tombo, onde se encontram os arquivos da Pide.
Após o 25 de Abril, foi convidado a integrar o Partido Comunista e ainda hoje é militante. Em 1974, a sede do PCP era na Avenida 1º de Maio e o convite chegou em Maio de 1974, através de José Romão, que era funcionário dos escritórios da família Freitas. Os militantes podiam agora marcar e fazer reuniões, distribuir propaganda, entre outros afazeres políticos, até então proibidos pelo regime. Alberto Gaspar fez segurança à sede do partido nas Caldas e também escoltou o secretário-geral, Álvaro Cunhal sempre que este se deslocava ao Oeste.
Alberto Gaspar foi também o responsável, durante 35 anos, pelo Bar das Caldas na Festa do Avante. Trabalhou ainda nas campanhas de angariação de fundos para a aquisição da Quinta da Atalaia onde se realiza a festa que marca a rentrée política do PCP. “Vamos para lá trabalhar nos meses de Junho, Julho e Agosto, até à realização da festa anual”, especificou.
Alberto Gaspar hoje olha para trás e de nada se arrepende politicamente. Considera que em Portugal ainda há algum espirito anti-comunista e que este se mantém estimulado pela Igreja. Acha, no entanto, que foi um homem que nunca se recusou a enfrentar batalhas. “E quem luta, nem sempre consegue ganhar. Mas quem não luta, perde sempre. E eu consegui ganhar!”, referiu o octogenário que se orgulha da sua vida repleta, muitas vezes na primeira linha dos acontecimentos que marcaram as últimas décadas no seu país.


