Dirigentes associativos querem mais formação e apoio

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notícias das Caldas
Augusto Fernandes diz que só 11% das colectividades têm mais subsídios do que receitas próprias

Ter dirigentes com melhor formação nas colectividades, bem como apoios jurídicos e económicos, foram as principais necessidades identificadas no primeiro simpósio das associações, organizado pela Assembleia da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro e que se inseriu nas comemorações do 25 de Abril.
A mudança de paradigma do individualismo e da rivalidade para a partilha e o trabalho em rede, é outra das necessidades no associativismo caldense.

Apenas oito colectividades marcaram oficialmente presença no primeiro simpósio das associações organizado pela Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, que se realizou na tarde de sábado, 22 de Abril, no auditório da Expoeste. Um número que fica aquém das 17 que prepararam os trabalhos, numa reunião anterior e que representa praticamente um quarto das 31 que estão sedeadas na União de Freguesias.

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A.C.D.R. Arneirense, S.I.R. Os Pimpões, Associação de Escola de Ciclismo do Oeste, Nova Versão Associação de Actividade Desportiva e Lazer, Associação do Bordado das Caldas da Rainha, Nostrum Associação de Defesa do Património Ambiental e Ordem do Trevo foram as sete sedeadas na união de freguesias que marcaram oficialmente presença. Da união de freguesias vizinha (Nossa Senhora do Pópulo, Coto e São Gregório) veio o Grupo Desportivo da Fanadia.
Augusto Figueiredo, representante da Confederação das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto, defendeu que “o tempo da folha de couve no associativismo acabou” e fez notar que “hoje ninguém é dirigente com os conhecimentos de há 30, 20 ou 10 anos”.
A formação evita males maiores. Por exemplo, há hoje dirigentes associativos com as casas hipotecadas, com direitos de autor ou impostos de dezenas de milhares de euros por pagar e há o caso de uma colectividade que alugou o bar, mas os arrendatários usaram o contribuinte da associação para fazer compras.
Augusto Figueiredo afirmou também o poder do movimento associativo. Tanto assim é que, “na constituição das listas para concorrer a cargos públicos, [os partidos] procuram sempre os dirigentes associativos”.
Em sua opinião, o papel das colectividades tem sido desvalorizado porque “quanto maior for o movimento associativo mais o Estado tem que lhe dar”. Ainda sobre a relação com o Estado exclamou que “é mentira quando se diz que as colectividades são subsídio-dependentes” e esclareceu que “só 11% é que tem uma fatia maior de subsídio do que de receitas internas”.
Para comprovar a importância do associativismo em números, explicou que em 2011 existiam 26 mil colectividades que representavam um volume de negócio anual entre os 2,6 e os 4,3 mil milhões de euros e que empregavam mais de 350 mil pessoas (6% dos postos de trabalho em Portugal). “É o único sector que desde 2005 cria emprego estável”, afirmou, contando que por dia abrem quatro novas associações em Portugal.
O orador apresentou um livro que define como deve ser a relação entre o associativismo e os vários poderes (autárquico, religioso, económico e outros). Notou que “não há favores, há corresponsabilidade assumida” pois quando uma associação perde a capacidade de ser autónoma, acaba por morrer.
Nessa relação com as autarquias, disse que os dirigentes não podem pedir, mas sim reivindicar, entre iguais, porque caso contrário nunca irão ter o respeito que precisam.
Augusto Figueiredo mostrou-se disponível para realizar uma acção de oito horas com os dirigentes caldenses cujo objectivo seria a apresentação de candidaturas a fundos comunitários. Sugeriu também a possibilidade de sentar à mesma mesa dirigentes e empresas para perceber as exigências dos espresários para conceder apoios. “Em Portugal existem 4,3 mil milhões de euros que as empresas preferem dar à economia social do que ao Estado” e que as colectividades podem ‘aproveitar’.
Ainda assim, sobre fundos comunitários esclareceu: “o Portugal 2020 não é panaceia para os nossos males” e foi feito para os grandes da inovação social, pelas exigências requeridas para apresentar candidaturas. Em relação a fundos europeus informou também que há apoios, por exemplo, para substituir telhados de amianto.

Quanto custava ao Estado fazer o que as associações fazem?

A ideia da necessidade de formação foi também defendida por Manuel Nunes, presidente da A. F. Leiria, que a corroborou na área que melhor conhece: o desporto. É que a responsabilidade aumentou consideravelmente para os dirigentes e os problemas na bancada, por exemplo, entram nela.
Manuel Nunes salientou o peso que tem o futebol no distrito. Na época 2012/13 a associação a que preside fez um estudo para saber quanto custava prestar este serviço usando o salário mínimo como referência. O resultado foi de 1,3 milhões por época.
E se custa 1,3 milhões de euros proporcionar a prática do futebol no distrito, qual é o impacto económico dessa actividade? As 688 equipas que existem representam um impacto de oito milhões de euros (dos quais 1,6 milhões são impostos directos). Este estudo teve por base as deslocações, apoios, ordenados, refeições, entre outras.
“Recebemos do Estado 25 mil euros”, acusou Manuel Nunes, que não percebe porque é que a aquisição de equipamentos desportivos paga 23% de IVA.
O presidente da A.F. Leiria revelou também que os dirigentes começam “a sentir um estrangulamento jurídico e fiscal” e que a renovação nos cargos se tem feito, sobretudo, pela entrada de mulheres.
Ainda sobre a participação dos portugueses na vida pública, salientou que “apenas 5% dos estabelecimentos empresariais tem associação sindical ou comissão de trabalhadores, quando a média europeia é de 30%”. A terminar recordou que nas Caldas houve, em tempos, um Movimento Associativo Caldense.

Os mesmos problemas há 14 anos

O etnógrafo Sérgio Pereira falou das “circunstâncias difíceis” que conheceu nos 40 anos de associativismo nas Caldas. Elogiou a coragem daqueles que, como ele, são dirigentes e traçou um paralelismo entre estes e os candidatos às autarquias, porque, em muitos casos, ambos sobem aos cargos sem formação.
Mas também encontrou diferenças, como as remunerações e as senhas de presença, reconhecendo no entanto que nada disso paga o trabalho que os cargos públicos exigem.
Apontou o dedo à autarquia por nunca ter incentivado a formação e por “nunca se ter preocupado com a defesa da etnografia da região”. Isto apesar de admitir que tal não compete só à Câmara e que os grupos também nunca fizeram uma proposta.
Lembrou o Encontro das Colectividades de Cultura e Recreio das Freguesias Rurais, em 2004, na Fanadia, com 55 colectividades. “Os problemas que aqui falámos são os mesmos de há 14 anos, que era criar um gabinete que prestasse apoio jurídico” e ao nível das candidaturas a fundos nacionais e comunitários. “Era fundamental termos esse tipo de apoios que não existe e que esperamos que possa vir a existir”, argumentou.
Sérgio Pereira expôs ainda a demora no atendimento camarário e disse que quando escrevem uma carta à autarquia a pedir apoio “a resposta nunca chega por escrito, temos de ir lá buscá-la e isto são coisas que desmotivam”.
Comparou a existência do jantar dos autarcas com a inexistência do jantar dos dirigentes associativos, num tema que mereceu o reparo de Teresa Marques (antiga presidente da S.I.R. Os Pimpões) que estava na plateia: não é a Câmara que tem que organizar o jantar, mas sim os próprios dirigentes associativos.
A terminar Sérgio Pereira defendeu que deveriam existir privilégios para os dirigentes associativos no acesso à universidade ou a cargos públicos.

Geminações podiam traduzir-se em dinâmica

O actor José Ramalho tornou-se dirigente associativo com 15 anos e neste simpósio traçou o quadro do associativismo na cultura. Notando que Caldas é geminada com sete cidades, entre as quais Dinant, na Bélgica (onde nasceu Adolphe Sax, que criou o saxofone), disse que não tem visto “que a cidade tenha criado pontes”.
Destacou a importância das Sociedades de Instrução e Recreio na alfabetização e defendeu que “o primeiro handicap das estruturas associativas é que as pessoas quando entram são naifes”.
Disse que nos 43 anos de democracia os valores não tangíveis não foram tão bem trabalhados e que isso tem consequências. “Dizem muitas vezes que a sociedade portuguesa não é participativa, mas não é porque não tem noção de sentido público”, esclareceu.
Sobre as colectividades, caracterizou-as como “a rede mais primária de afectos”.

Partilhar para poupar e para melhor servir

Na plateia estava Vítor Marques, presidente da União de Freguesias de N. Sra. Pópulo, Coto e São Gregório, que conta já 40 anos de associativismo. O autarca disse que, pela pertinência, esta iniciativa se deveria estender ao resto do concelho e chamou a atenção para o facto de na associação de municípios estarem inscritos 100% das autarquias, mas na das freguesias a participação ser reduzida para os 58,5%.
Outra ideia que deixou foi a da partilha de equipamentos porque todas as associações têm falta de recursos, mas a maioria tem espaços, viaturas ou materiais que não estão a ser usados 24 horas por dia e que podem ser partilhados.
Já João Patacho, da A.C.D.R. Arneirense, queixou-se de no simpósio se ter abordado “tudo menos o que as associações queriam”, que eram as preocupações comuns a todos que haviam sido identificadas na reunião preparatória: um gabinete de apoio jurídico, os transportes e o financiamento. O dirigente referiu que este “foi um simpósio político” e criticou Sérgio Pereira por ter falado sobre a Câmara sem esta estar presente.
Por sua vez, Teresa Marques, antiga presidente da S.I.R. Os Pimpões, focou-se na “necessidade de as associações se unirem” e de se acabar com as rivalidades que existem e que não fazem sentido. Na sua óptica, o maior problema não está no poder local, mas sim na falta de união dos dirigentes associativos.
Teresa Marques não refuta que na composição das listas para cargos públicos sejam escolhidos dirigentes associativos, mas alerta que também há quem entre na vida associativa para a usar como alavanca para cargos públicos.
A terminar reivindicou o não pagamento do IVA nos serviços e nos equipamentos fundamentais à actividade das associações. “Se não podemos cobrar o IVA porque é que o pagamos como as empresas que pagam e recebem?”, questionou.

Um gabinete municipal de apoio às associações?

Alberto Gonçalves, presidente da Assembleia de Freguesia que organizou esta iniciativa, informou que praticamente todas as associações que estiveram na reunião preparatória “referiram a necessidade da existência no município de um gabinete de apoio às associações, nomeadamente nas matérias, jurídica, gestão de projectos e candidaturas e partilha de meios de uso comum”.
Na abertura dos trabalhos descreveu que “ainda hoje o movimento associativo não viu suficientemente reconhecido o contributo que oferece a toda a sociedade”.
Já o presidente da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, Abílio Camacho, encerrou os trabalhos notando que “o mais importante não foi feito, que era as associações falarem e ninguém falou”.
Criticou a intervenção de Sérgio Pereira e disse que a autarquia e as Juntas sempre apoiaram as associações. Para tal acontecer, estas têm de apresentar um plano anual de actividades, “que nunca foi apresentado pela maioria das colectividades”.

Regras importantes para dirigentes associativos

Segundo as normas nacionais e europeias, as associações só existem para responder às necessidades dos associados, porque caso contrário entram em concorrência com as empresas. Quer isto dizer que para usufruir dos serviços de uma colectividade é necessário ser sócio da mesma. “Podem ser sócios sem pagar, mas têm de ser sócios”, alertou Augusto Figueiredo, representante da Confederação das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto.
É que, além das questões da legalidade e da concorrência, a necessidade de servir apenas os sócios prende-se também com os seguros em caso de acidente. Os associados têm, quando comparados com a relação empresa-cliente, alguns benefícios: podem eleger, podem ser eleitos, propor alterações estatutárias, entre outras.
Outra questão fundamental é que “não há mensalidades”, porque essas estão sujeitas a IVA. “O que existe são quotas suplementares”.
A importância de abrir actividade nas finanças e na Segurança Social e o facto de já não se passarem recibos, mas sim facturas (autorizadas e impressas por empresas devidamente certificadas), também foram falados. Nos dias que correm, “todas as entidades têm que prestar contas às finanças”, notou o representante da Confederação.

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