A Quinta do Gradil (Vilar, Cadaval) organizou, no dia 10 de Setembro, a sétima edição da Festa das Vindimas, convidando clientes e empresas parceiras, num total de 400 convidados, a serem vindimadores por um dia. Da apanha dos cachos ao pisar da uva, a experiência terminou com um jantar acompanhado da “prata da casa”: os vinhos produzidos naquela adega.
Foram apanhados 2800 quilos da casta nacional Fernão Pires, que vão dar origem a um vinho especial cujas garrafas serão embelezadas com os rótulos elaborados pelas crianças presentes no evento.
Setembro é o mês das vindimas. Nos 120 hectares da Quinta do Gradil a agitação é grande e os ânimos só acalmam quando, como dizem os trabalhadores, a uva se encontra debaixo de telha (na adega). Em 2015 foram produzidos 1,5 milhões de quilos de uva; este ano esperam-se menos 100 mil quilos, mas o bago é mais cheio, o que poderá compensar a diferença.
Em 2016 a vindima também começou mais tarde porque a uva levou mais tempo a maturar devido aos dias chuvosos que se prolongaram até Maio.
Na verdade a chuva é a grande inimiga de uma boa colheita, explica-nos o engenheiro Bento Rogado, enquanto guia os 400 convidados desta 7ª Festa das Vindimas até às vinhas. “A humidade provoca o rebentamento dos bagos, o que depois origina podridões. O tempo ideal é algum calor e nenhuma chuva”, afirma, acrescentando que nos dias em que S. Pedro está de mau humor nem se vindima.
Já os convidados estão espalhados pelos corredores das vinhas, de tesoura na mão, empenhados em cortar os cachos e em encher os baldes, que Bento Rogado faz uma pausa e recorda os tempos em que, há 25 anos, a vindima era feita por mais de 50 pessoas.
MÁQUINAS DE VINDIMAR SÃO MAIS RÁPIDAS
Actualmente já não compensa contratar trabalhadores para o serviço – além que há pouca mão de obra disponível na região – e o trabalho é assegurado por 14 trabalhadores que estão na Quinta do Gradil a tempo inteiro. Não compensa ainda porque a mão humana foi sendo substituída por máquinas de vindimar que são mais rápidas: se numa hora estas colhem três a cinco toneladas de uva, uma pessoa (já com alguma experiência na tarefa) apanha em média 1000 quilos por dia.
Enquanto o vindimador corta as uvas pelo pé do cacho, um por um, a máquina sacode as videiras, fazendo com que os bagos e os cachos se soltem para uma passadeira. Este processo, embora mais rápido, acarreta um senão: é que o ideal é que a uva chegue intacta à adega mas, devido ao abanão da máquina – menos delicado e cuidadoso do que as mãos humanas – rompem-se algumas películas do fruto, que entra imediatamente em fermentação.
“É por isso que nas produções de vinhos mais especiais e de maior valor, ainda vindimamos à mão”, conta Bento Rogado, dando como exemplo as castas Viognier, Viosinho, Chardonnay, Touriga Nacional e Petit Verdot. Já no caso da Fernão Pires (a casta eleita para esta Festa de Vindimas), a máquina acaba por ser mais eficiente porque o bago cai facilmente, havendo, na apanha à mão, maior desperdício.
Hoje, sábado à tarde, a vindima é pretexto para o convívio, motivo de brincadeira entre pais e filhos, amigos e colegas de trabalho. Muitas destas pessoas nunca vindimaram, embora estejam ligadas ao sector do vinho, e há até quem passe mais tempo a tirar fotografias do que a apanhar uvas. Ninguém leva a mal e a música da fanfarra ainda anima mais a festa.
No entanto, no dia-a-dia da Quinta do Gradil, a vindima é um período chave que normalmente dura um mês e exige muito trabalho. “Costumam dizer-me para não me preocupar, que todos os anos é a mesma coisa, mas as rotinas são sempre diferentes. Não temos horários: se num dia o tempo está bom, vindimamos até mais tarde, trabalhamos mais de 14 horas, mas se chove, nem vamos para o campo”, explica o engenheiro responsável pela viticultura.
Os prazos são apertados e, no final da vindima, a maior parte do pessoal vai uns dias de férias. Quando o sumo da uva já se encontra nas cubas de fermentação (para ser transformado em vinho), o trabalho passa para as mãos dos enólogos.
Em Outubro, as folhas da videira começam a cair e inicia-se novamente a poda. Um ciclo que se repete, mas, assegura Bento Rogado, é sempre diferente.
NO LAGAR É BOM SUJAR-SE
Os baldes já estão todos cheios e é hora de arrancar para as adegas. Foram apanhados 2900 quilos de uva que darão origem, no próximo ano, a um vinho especial cujas garrafas terão como rótulos os desenhos que as crianças aqui presentes fizeram.
É precisamente a pensar nas crianças que se despejam 60 baldes num lagar em pedra: os mais novos são desafiados a subir e experimentar o pisa a pé das uvas. O entusiasmo instala-se e os miúdos descalçam-se o mais depressa possível, arregaçando as calças até ao joelho.
A sensação inicial é de aspereza e sujidade, até se romperem as películas dos bagos e o sumo começar a libertar-se. Depois sente-se frescura e alguma comichão. “Tenho as pernas peganhentas, mas foi muito divertido, vale a pena”, conta Maria Inês, filha de Maria Miguel, vinda de Arruda dos Vinhos.
“Foi uma ideia muito interessante, porque permitiu que eles aprendessem as lides da terra e tivessem contacto com a tradição das vindimas”, realça Maria Miguel, acrescentando que “cada vez mais as crianças ficam isoladas em casa, sedentárias, e aqui estiveram ligadas à natureza e a trabalhar em grupo”.
A paciência das crianças dura meia hora, não chega para pisar todas as uvas. Já antigamente, os lagares enchiam-se de homens que durante o serão esmagavam todos os bagos até não sobrar nenhum. Faziam-no ao som de cantares tradicionais: a música deixava-os animados e acertava-lhes o ritmo dos passos.
No caso dos vinhos brancos, o mosto (sumo da uva) pode ser imediatamente retirado do lagar. Designa-se de mosto lágrima. A massa que sobra é prensada (faz-se a separação do líquido e do sólido) extraindo-se mais mosto que depois segue para fermentação. No final, as películas são novamente exprimidas para fazer aguardente e os cachos servem de fertilizante.
Já para fazer vinho tinto, é necessário que a fermentação ocorra com as películas da uva, pois são estas que conferem a cor ao líquido.
O lagar em pedra faz-nos recuar ao passado, mas é na adega industrial da Quinta do Gradil que normalmente se desengaçam, esmagam e comprimem as uvas. O material é todo feito de aço inoxidável.
Nas cubas de fermentação os açucares do sumo da uva vão-se transformando em álcool, sendo que os depósitos são regulados por cintas refrigeradoras que controlam a temperatura da fermentação. Isto porque as cubas não podem atingir temperaturas muito elevadas (acima dos 18 graus), caso contrário o vinho fica pouco aromatizado e excessivamente alcoólico.
Investimentos de milhões no Alentejo e Alcobaça
Um dos grandes sonhos de Luís Vieira, proprietário da Quinta do Gradil, é restaurar o palácio que pertenceu a Marquês de Pombal de 1760 até ao século passado. Um projecto que custa 2,5 milhões de euros mas foi adiado para dar prioridade ao investimento de oito milhões de euros no Alentejo.
O grupo Parras (que detém a Quinta do Gradil) comprou recentemente as herdades da Candeeira e da Vigia e já iniciou a plantação de mais de 200 hectares de vinha. “Estamos a aguardar que abram as candidaturas ao PRODER para apresentar o projecto da adega, pois actualmente só temos uma provisória que não tem capacidade para dar resposta a todos os hectares”, revela Luís Vieira, acrescentando que dentro de três a quatro anos as quintas já estarão a produzir vinho.
Em Alcobaça, onde o grupo possui uma unidade de engarrafamento, está previsto um projecto de turismo industrial em que os visitantes poderão desenhar o seu próprio rótulo e assistir ao processo de produção, num investimento que ronda os 20 milhões de euros.
Em particular, a aposta no enoturismo tem sido uma constante da Quinta do Gradil, que organiza passeios de BTT, provas de vinhos e experiências de vindimas. Só este mês estão previstos 15 eventos na quinta.