Caldense viu o seu trabalho ser considerado o melhor do ano na área das Radiociências e Telecomunicações
A caldense Filipa Prudêncio recebeu o prémio para o melhor trabalho do ano na área das radiociências e telecomunicações com o prémio ANACOM-URSI (Autoridade Nacional de Comunicações e União Radiocientífica Internacional) de 2023.
“Confesso que não estava à espera, primeiro porque havia vários trabalhos altamente competitivos, faz-se muito boa investigação em Portugal, e depois porque trabalho com ideias teóricas e é sempre mais difícil ganhar um prémio com um trabalho teórico do que com um experimental”, frisa a investigadora do Instituto de Telecomunicações, onde trabalha desde que terminou o doutoramento, em 2014, em conversa com a Gazeta. No seu caso, nota, além de teórico, trata-se de um trabalho muito técnico. “Gosto muito de trabalhar em ideias téoricas, acho que é altamente importante e que em Portugal a investigação nestas áreas dos fundamentos tende a desaparecer porque há mais financiamento para ideias e projetos mais experimentais”, afirma, assumindo que “tem sido uma luta para continuar a fazer investigação nestas áreas”.
O prémio para o trabalho, realizado em co-autoria com Mário Silveirinha, trouxe maior divulgação, o sentimento de reconhecimento e “foi muito importante para o nosso grupo de trabalho”.
Nascida no Porto, filha de professores, Filipa Prudêncio veio para as Caldas a tempo de iniciar os seus estudos na cidade termal, onde ficou até aos 18 anos. Depois, foi para Lisboa. “Caldas tem escolas de excelência e professores excelentes”, salienta a antiga estudante da D. João II e Raul Proença, que recorda a professora Paula Gomes. Em Lisboa estudou no Instituto Superior Técnico, onde se licenciou, fez o mestrado e o doutoramento.
O seu trabalho centra-se na área do eletromagnetismo, numa área teórica que junta a engenharia eletrotécnica com física. “Dentro da área do eletromagnetismo eu trabalho na área dos metamateriais”, explica. São materiais que não existem na natureza, que são criados para obter funcionalidades que não existem. As aplicações passam, por exemplo, pela amplificação de um sinal de comunicação ou a capacidade de guardar energia num dispositivo. Diminuir as perdas de informação nas comunicações é outro dos objetivos. “Trabalho muito com materiais que permitem a propagação de novas formas de luz ou então de otimização e eficiência do transporte de energia ou de luz. “A aplicação concreta que apresentei é conseguir que eu propague informação numa direção, mas que na direção oposta não haja interferências indesejadas”, esclarece. “Criámos novas classes de materiais não recíprocos”.
Uma das técnicas que utilizou foi a do cristal fotónico, que é um tipo de metamaterial, que passa pela junção de vários elementos que terão, em conjunto, uma resposta diferente à soma dos elementos constituintes. Na sua teoria, os materiais constituintes são simples e recíprocos como na natureza, mas o cristal fotónico é não recíproco. Outra ideia chave é que os materiais variam no tempo, ou seja, podem assumir diferentes formas ao longo do tempo. Com o cristal fotónico a variar no tempo é possível “a propagação unidirecional”.
Além dos prémios que tem conquistado, Filipa Prudêncio foi notícia enquanto surfista. É que a caldense chegou ao mais alto nível do surf nacional, antes de deixar a modalidade (depois experimentou outras, destacando-se sempre). Enquanto surfista foi considerada a mais sexy do país, numa gala da revista Surf Portugal. “O desporto sempre fez parte das minhas rotinas” e continua a fazer parte do seu dia-a-dia. Ainda assim, nunca quis seguir o desporto numa via profissional. “Gostava de estar do lado do praticante”. A engenharia eletrotécnica e de computadores surgiu quando procurava um curso que se adequasse aos seus gostos e que tivesse uma boa empregabilidade. “Gostava muito de Matemática e de Física”. E, como tinha amigos neste curso no Técnico, foi uma escolha natural. “Quando tirei a licenciatura, rapidamente percebi que não queria trabalhar com uma empresa, nem ser consultora ou programadora, mas como gostava muito de estudar a investigação tornou-se muito natural”.
Além do seu trabalho no Instituto de Telecomunicações, em Lisboa, onde reside, também é professora convidada do ISCTE. É frequente passar temporadas no estrangeiro, em departamentos de cientistas e para participar em conferências. Para o futuro, notando que “não é fácil viver da investigação e fazer ciência em Portugal, não é fácil arranjar contratos como investigador ou contratos efetivos como professora nas universidades”, traça como objetivo um destes dois. Outro será encontrar financiamento para continuar a fazer investigação. ■