Estiveram no Cencal, durante os primeiros dias de Junho, um grupo de 11 norte-americanos que vieram às Caldas realizar uma acção de formação de pintura de azulejo. Estudam no Palm Beach State College, uma escola superior de ensino artístico que aceita reformados nos seus cursos de artes e foram convidados a participar nesta viagem – de aprendizagem técnica e cultural – pela docente de artes, a professora norte americana com origem portuguesa Nazaré Feliciano, originária de Torres Vedras, que planeava esta vinda há alguns anos. Todos gostaram imenso e prometeram regressar a Portugal e às Caldas da Rainha.
Natacha Narciso
nnarciso@gazetadascaldas.pt
Onze pessoas, com idades entres os 40 e os 80 anos, ligados às artes e que nunca tinham trabalhado em azulejaria, ficaram alojados no Cencal. Logo no primeiro dia, após a chegada, professores, arquitectos, artistas, fotógrafos e galeristas arregaçaram as mangas e começaram a trabalhar no azulejo. “Houve algum desânimo inicial, pois os participantes tinham receio de não conseguir trabalhar naquele suporte”, disse Nazaré Feliciano, a docente de Belas Artes, a grande responsável por esta vinda do grupo de norte-americanos.
O desânimo passou de imediato, a partir do momento em que começaram a ver os resultados dos seus trabalhos, a sairem do forno. Aprenderam sobretudo técnicas de pintura em azulejo que começavam a fazer logo a partir das nove horas. “Os dias são grandes por isso antes da aprendizagem, às sete da manhã vamos às compras à Praça da Fruta e depois à tarde fazemos visitas culturais nas Caldas e outras terras. Aqui é dia até às 21h00”, disse Nazaré Feliciano, comentando que tinham apreciado as visitas aos museus de Cerâmica, Malhoa e Fábrica e espaço museológico da Bordallo Pinheiro e Braz Gil Studio.
Nazaré Feliciano é de Torres Vedras e reside nos EUA desde os seus 19 anos. Tem 54 anos, lecciona há 20 e viveu muitos anos em Nova Iorque. Possui mestrado pela Universidade Instituto de Arte de Chicago e, no ano passado, doutorou-se em Belas Artes e Dança.
“Tenho família em Portugal e venho quase todos os verões”, disse a docente que gosta de regressar ao seu país natal e que há três anos tinha a intenção de trazer um grupo de alunos para lhes mostrar a cultura portuguesa.
Na sua escola, em Palm Beach, há os níveis de bacharelato e de cursos de dois anos que depois “tem continuidade nas universidades prosseguindo para licenciaturas e para mestrados”, disse a docente que também faz trabalhos de escultura.
Quando contactou o Cencal, foram pensadas várias áreas de aprendizagem mas chegou-se à conclusão que deveriam iniciar pela pintura em azulejo até porque seria mais fácil e leve para transportar os trabalhos finais de regresso aos EUA.
Os participantes – sobretudo entre os que nunca tinha viajado à Europa – ficaram surpreendidos pois “toda a gente é educada e fala inglês com eles e sentem-se seguros, algo que valorizam muito”. Também referem “a amizade das pessoas, a comida e o café”, disse a docente Da cidade salientaram os revestimentos azulejares dos prédios antigos, a Praça da Fruta “por causa dos produtos orgânicos e caseiros” e o parque D. Carlos I tendo referido “a qualidade da colecção do Museu Malhoa, as espécies de plantas e de árvores e também as máquinas de exercício físico”.
Satisfeitos igualmente com as visitas efectuadas – Óbidos, Nazaré, Batalha, Alcobaça (onde assistiram à “Viagem do Elefante”, uma peça de teatro comunitário baseada na obra de José Saramago) e também visitaram vários locais em Lisboa.
“Tem sido bestial”, disse Nazaré Feliciano que acrescentou que quer trazer os seus alunos mais jovens – que têm idades entre os 18 e os 30 anos – e ainda pretende creditar nos Estados Unidos esta acção.
Avós nas aulas de artes
A docente falou ainda sobre o facto, inédito para nós em Portugal, das vagas das suas turmas serem ocupadas por reformados em Palm Beach, ajudando a financiar as escolas e tornando as turmas viáveis. “Tem sido uma óptima experiência dado que os alunos gostam e têm mais respeito por terem adultos entre eles”, disse a docente.
Com os seniores, os jovens do Palm Beach State College dividem várias aulas tai como História de Arte, Design e várias disciplinas ligadas à cerâmica.
A formadora de pintura de azulejos do Cencal, Teresa Lima, que trabalhou com o grupo, contou que entre eles havia gente com formações distintas mas “como somos versáteis, ganhamos todos com estes intercâmbios de experiências”. A responsável ensinou aos norte-americanos as mais variadas técnicas de pintura e referiu que aquela era uma turma engraçada “com jovens e avós” e esperava que o grupo estivesse a gostar da cultura portuguesa. Teresa Lima referiu ainda que gostava que os convidados reconhecessem que os trabalhos manuais e artísticos “ainda têm uma grande componente humana”, rematou.
Para a directora do Cencal, Ana Bica, “estamos sempre receptivos a receber grupos de alunos estrangeiros que queiram aprender cerâmica”. É aliás uma prática do centro de formação caldense que ao longo da sua história já recebeu japoneses, africanos, argentinos, brasileiros e vários europeus. Sobre a vinda deste grupo da Florida, a responsável contou que numa primeira fase vieram apenas séniores e que agora chegou a vez de vir o grupo de alunos. Há perspectivas de dar continuação a esta ligação entre Palm Beach e o Cencal pois segundo Ana Bica, “estamos abertos à possibilidade daquela universidade colaborar connosco não só na área da cerâmica como também experimentar o trabalho em vidro”, rematou.
Testemunhos dos participantes
“Caldas da Rainha tem potencial turístico sobretudo cultural”
Karla Walter – Coordenadora da galeria do Palm Beach College
Está a ser uma experiência maravilhosa, está tudo a correr bem nesta visita! Somos sempre bem recebidos em todo o lado. Sou escultora e o que estamos a aprender é totalmente novo para muitos de nós.
Estamos ocupados e a adorar conhecer esta cidade, onde se chega a todo o lado a pé e que possui tanta História! Gostamos também do café e da comida.
Acredito que as Caldas da Rainha tem potencial turístico e de atrair quem gosta de apreciar da cultura.
Adorava trazer cá o meu marido numa visita que incluísse na mesma o workshop. Ele, que trabalha na área da construção civil iria gostar muito.
Sou escultora e coordeno a galeria da universidade. Fazemos seis exposições por ano e temos uma programação já planeada para os próximos dois anos.
“Quero aprender mais sobre azulejaria”
Isabel Gouveia – Artista Plástica/Restauradora de cerâmica
Vim participar nesta visita porque estou interessada na pintura de cerâmica. Sou brasileira e moro nos EUA há 13 anos e além do meu trabalho artístico, também me dedico ao restauro de azulejos.
Está a adorar esta visita e workshop! Está a ser muito bom! Vejo aqui em Portugal a influência da azulejaria que existe no Brasil pois aqui é o berço de tudo. Gostava de ver mais azulejos no meu país mas é um trabalho muito caro e como tal estou a aprender mais sobre esta arte.
É a primeira vez que estou em Portugal que é muito próximo do que eu conheço. É fácil de me adaptar a esta proposta, similar a uma residência artística. É uma experiência muito rica e sim, vou regressar. Até porque vou participar na Bienal do Douro e numa exposição que vai abrir em Agosto. Estou igualmente interessada no trabalho que fazem em volta de Bordalo Pinheiro pois sei que têm vindo artistas brasileiros produzir peças contemporâneas.
“Caldas é uma espécie de segredo escondido de Portugal”
Arlene Borow – Artista Plástica
Estamos a divertir-nos a sério! Estou a adorar e é muito interessante e agora preciso de mais azulejos para completar o meu trabalho! Estou a aprender um novo meio de expressão, o que é importante para qualquer artista.
Caldas da Rainha é uma terra muito simpática e muito interessante. É uma cidade pequena e fiquei espantada com os seus museus sobretudo com as esculturas que vi no Museu Malhoa. Creio que as Caldas é uma espécie de segredo escondido de Portugal pois ninguém vos conhece e é de facto uma pena, dado aquilo que têm para oferecer aos visitantes!
Sou artista plástica e considero-me uma aprendiz do mundo da cerâmica e estou surpreendida com a qualidade das vossas obras e também da aprendizagem.
Sim, gostava muitos de voltar sobretudo ao Cencal para fazer mais workshops.
Um painel de azulejo com a lenda da Rainha
Diane Chromik – Professora de História de Arte e de desenho no Palm Beach College
É maravilhoso! Eu não sabia o que esperar mas estou a achar tudo encantador. Gosto de aprender no Cencal e de poder desenvolver os nossos projectos em cerâmica. Eu quis fazer um painel sobre a história da chegada da Rainha às Caldas. Conheci a lenda e a sua cura através das águas termais e quis reproduzi-la nos azulejos.
Adorei o parque e também o Centro de Artes pois fiquei a saber que existe o Simpósio de Escultura em Pedra e estou muito interessada em conhecer este evento onde se dá primazia à escultura. Fábrica e o museu da Bordallo Pinheiro é também um espanto!
Acho que os países se deveriam conhecer melhor através da sua cultura. Já tinha visitado França, Alemanha e Itália e esta foi a minha primeira vez em Portugal. Gostava de regressar e toda a gente que eu conheço vai ouvir falar de Portugal.
“Adorei fotografar o parque os prédios revestidos a azulejo”
Geórgia Novotny –Contabilista e fotógrafa
É a primeira vez que estou em Portugal e a aproveitar cada minuto! Já tinha experimentado trabalhar em azulejo nas aulas da Nazaré Feliciano e agora estou a aprender mais sobre esta arte.
As pessoas são muito simpáticas e adorei a cidade. Vou para casa com muitas memórias boas. O que mais me encantou foi o caminhar à noite nas ruas e não tive nenhum receio. Senti-me muito segura.
Fiquei espantada com o número de museus que a cidade tem. Estão bem preservados e por isso as pessoas devem orgulhar-se deles.
O vosso parque é espantoso e como trabalho em fotografia, gostei de o fotografar, assim como também me atraíram os edifícios antigos por causa dos azulejos.
Adoro o vinho português e hoje vou provar sardinhas! Sim gostava de poder regressar de férias. N.N.