O centenário moinho das Boisias, em Alvorninha, vai ser restaurado pela Câmara para dar a conhecer os processos das antigas moagens. Este moinho é único na região porque tem a particularidade de ter uma torre toda em madeira, que ainda está relativamente bem conservada. Deverá estar pronto em Julho, orçando-se a sua recuperação em 15 mil euros.
Quem hoje passa pelo moinho das Boisias (Alvorninha) até pode nem reparar no que o torna único na região, mas trata-se de um exemplar centenário construído em madeira (mas com velas de pano), que ainda se mantém relativamente bem conservado.
Tem uma base de betão e oito pilares de madeira que sustentam a estrutura. Com duas mós (uma para o trigo e outra para o milho), o moinho tem cerca de sete metros e meio de altura (5,20 metros de tábuas e 2,10 metros do capelo, que é o tecto). A torre é uma circunferência de 18 metros.
O edifício tem três pisos: o mais alto é usado para girar as velas consoante o vento; o segundo é onde estão as mós e no primeiro ficam as tulhas para onde cai a farinha.
Crê-se que esta peça integre o lote dos cerca de 500 moinhos de Lisboa do tempo do Marquês de Pombal. Isto porque, com a chegada das moagens industriais, em menos de 50 anos todos os moinhos foram substituídos e a maquinaria vendida para o Sul e para o Oeste, onde foram reproduzidas as torres.
No caso do moinho das Boisias, a torre não terá sido replicada, mas o engenho será proveniente de um dos moinhos pombalinos da zona de Lisboa.
A construção do moinho em Alvorninha terá sido de Joaquim Caetano, de alcunha Alhalhu. Inicialmente foi erguido 50 metros mais ao lado, mas 20 anos depois foi mudado para o local onde se encontra porque tinha melhores condições de vento.
Era uma máquina comercial, moía trigo e milho nas suas mós e vendia a farinha. O moleiro cobrava a moagem, e muita gente pagava-a com a maquia (em farinha). Depois o moleiro vendia essa farinha. Além disso, o moleiro era também um comprador de trigo, que moía para poder vender mais farinha.
É o actual presidente da Junta, Avelino Custódio, que nos conta um pouco da história, porque era amigo de caça do último moleiro. “Íamos muitas vezes ao moinho comer petiscos”, recordou.
“Lembro-me bem de ser jovem e de a minha mãe me dizer a mim e ao meu irmão: levem um alqueire de trigo e tragam a farinha que tenho de cozer amanhã”, contou Avelino Custódio. “Levávamos uma bola e encontrávamo-nos todos lá para jogar enquanto os cereais estavam a ser moídos”.
O moinho era único na zona, pelo que moía todo o cereal que havia. “Era um símbolo da freguesia”, disse Avelino Custódio, acrescentando que quando deixou de laborar, há 14 anos, já havia perdido alguma importância comercial pois apenas algumas pessoas da freguesia lá iam moer os cereais.
O último moleiro foi António Camacho, que o deixou devido a um acidente quando ia entregar farinha. Actualmente pertence a seis herdeiros. Desde que parou o moinho foi-se, obviamente degradando.
UMA IDEIA COM DEZ ANOS
Em 2007 o anterior presidente de Junta de Alvorninha, Virgílio Santos, divulgou na Assembleia Municipal que existia uma proposta na Câmara para entrar em contacto com os proprietários no sentido de perceber se estes queriam vender o moinho das Boisias.
Nove anos depois, em Fevereiro de 2016, foi a reunião de Câmara uma carta dos herdeiros (datada de Outubro de 2015) a propôr uma de duas soluções: a venda ou a recuperação. A autarquia decidiu então fazer uma proposta de 10 mil euros para comprar o moinho ou recuperá-lo através de uma cedência de 10 anos.
No mês seguinte chegou ao município um e-mail de Carlos Barros mandatado por cinco herdeiros e outro de Álvaro Baltazar Jerónimo mandatado pelo sexto herdeiro em que a cedência era aceite.
Nessa data a Câmara delegou na Junta de Freguesia as obras, mediante um contrato de delegação de competências a ser apresentado à Assembleia Municipal, onde deveria ser celebrado o protocolo de utilização. Até Novembro o protocolo de cedência de utilização esteve a ser formalizado até ser aprovado por unanimidade.
A recuperação irá custar cerca de 15 mil euros que serão financiados pela autarquia. Será preciso substituir alguns pilares e praticamente todas as tábuas. O engenho, o capelo (tecto) e o mastro estão em boas condições.
“É um trabalho minucioso, porque as mós têm que ser niveladas e picadas”, fez notar Avelino Custódio.
O actual presidente da Junta de Freguesia diz que as obras até já deveriam ter começado e que pensava tê-las prontas a tempo do 15 de Maio deste ano, mas prevê que “em Junho ou Julho estará concluída e na inauguração vamos comer pão com chouriço ou sardinha feito no moinho”.
A autarquia quer, depois de o recuperar, usá-lo para dar a conhecer os processos usados na moagem. Visitas guiadas por alguém que saiba como funcionava o moinho e que o explique a alunos de escolas e outras visitas de fins culturais será o futuro do moinho das Boisias.
Avelino Custódio revelou ainda que gostaria de criar um museu do moinho, com fotografias antigas e objectos do quotidiano da moagem para dar a conhecer a antiga técnica. Um projecto que poderá ocupar a antiga escola do Zambujal, que está desactivada.
UMA REFERÊNCIA NA MOINHOLOGIA
Jorge Miranda, presidente da Rede Portuguesa de Moinhos, disse à Gazeta das Caldas que este moinho é conhecido por toda a gente que se interessa por moinhologia e que “é uma referência como boa peça”.
“A freguesia, o concelho e a região terão muito a ganhar com a recuperação de uma peça que é diferente, mas depois vai ser preciso mantê-la”, alertou.
Salientou que tem de ser feita “uma recuperação com critério, rigor etmológico e de ofício, feita por profissionais”. Além disso é preciso que haja “uma reposição de acordo com técnicas e materiais originais”.
O dia dos moinhos
No próximo fim-de-semana, em que se comemora o Dia Nacional dos Moinhos (7 de Abril), dezenas de moinhos espalhados pelo país abrem as suas portas com programas de actividades que incluem visitas guiadas, animações, demonstrações, palestras e outras acções.
No Cadaval realiza-se no domingo uma caminhada a partir das 10h00. Começa com uma visita ao Núcleo Museológico do Moinho das Castanholas e passará por quatro moinhos até Adão Lobo. Deve durar cerca de duas horas, num percurso de oito quilómetros. A inscrição é gratuita e inclui água e fruta, bem como seguro de acidentes pessoais. Mais informações através do tel. 262690166.
Antes, a 2 de Abril, a Associação Cultural e Recreativa de Laranjeira e Vale Serrão realiza a 3ª caminhada da “Rota dos Moinhos” entre os dois lugares. O percurso, circular, tem uma distância total de 12 quilómetros e dificuldade média. Os interessados em participar devem estar às 9h00 na associação munidos de calçado confortável. A caminhada, com reforço e almoço (porco no espeto), custa 10 euros. Mais informações através do tel. 966249202.
Na Amoreira (Óbidos) durante os três dias ( 7 a 9 de Abril) será possível visitar o Moinho dos Hipólitos com um guia e perceber o funcionamento. Mais informações junto do tel. 262969999.