Experiência possibilitou a um grupo de 20 estudantes comunicar via radioamador durante 10 minutos com a Estação Espacial Internacional
“Oscar Romeo 4 India Sierra Sierra. Aqui Charlie Sierra 5 Sierra Sierra. Over”. O código, proferido por Eduardo Dias, não teve resposta nas três primeiras tentativas, aumentando a ansiedade e o nervosismo de toda a plateia que assistia, no passado dia 22 de novembro, à iniciativa promovida na Escola Rafael Bordalo Pinheiro no âmbito do programa internacional ARISS. Mas, à quarta tentativa, surgiu a resposta “CS5SS H1SS”, confirmando que estava estabelecida a comunicação com a Estação Espacial Internacional (ISS) e que o astronauta Don Pettit estava pronto para interagir com 20 alunos da escola (ver perguntas e respostas na peça à direita), marcava o relógio 16 horas e 37 minutos.
Os alunos tinham-se alinhado, numa fila indiana, minutos antes e, na parede do auditório professor Paulo Vasques, uma projeção permitia acompanhar a aproximação da órbita e da largura de espetro da ISS aos céus de Portugal. Durante cerca de 10 minutos e meio a ligação esteve (praticamente sempre) estável e a comunicação fluiu com a ISS, que cruzava os céus a cerca de 422 km de altitude e cerca de 27.500 km/h.
“Foi uma experiência engraçada. Foi muito bem preparada por parte das professoras, em primeiro lugar, e foi muito enriquecedora”, disse Duarte Ramos, um dos alunos que teve oportunidade de fazer uma pergunta a Don Pettit.
O aluno destacou que a preparação da iniciativa possibilitou realizar muitas atividades “e falar com um astronauta é realmente uma experiência única, é uma coisa que não acontece todos os dias”, complementou.
O jovem de 16 anos estuda na área das Ciências e Tecnologias e diz que tem interesse por este tipo de temas. “A minha professora era uma das que estava a participar mais ativamente neste projeto e foi ela que nos chamou a participar, eu tive a sorte de ser um dos selecionados, juntamente com dois colegas de turma”, conta. A primeira pergunta que tinha em mente era sobre como a estadia no Espaço afetou o astronauta, mas por ser uma questão mais pessoal, alterou-a para como cuidam os ocupantes da ISS da saúde mental enquanto estão em missão. “É um sítio enclausurado, em que eles estão todos os dias, a ver as mesmas pessoas, o que despertou a minha curiosidade”, disse Duarte Ramos, que ficou satisfeito com a resposta de Don Pettit.
Lourenço Pereira, 16 anos, disse que sentiu algum nervosismo antes de colocar a sua pergunta, mas gostou de viver esta experiência que vai guardar para a vida. “No fim, é uma experiência muito boa e que nos dá uma boa história para depois contar”. O jovem estudante gosta de Física, em especial a Física Aeroespacial, o que foi um dos motivos que o levaram a aceitar o desafio de participar.
João Capinha, também de 16 anos, fez uma questão sobre o impacto das missões espaciais na saúde dos astronautas. “Também gosto muito de Física e gosto muito de perceber o funcionamento das ondas e da comunicação”, disse. O estudante da escola Rafael Bordalo Pinheiro disse que aprendeu não só com as respostas de Don Pettit, mas também com todo o processo desenvolvido neste projeto. “Aprendi coisas novas com as respostas, mas também já sabíamos muitas coisas pelas pesquisas que fizemos sobre este tema”, concluiu.
Maria Conceição Vidigal foi uma das professoras que, juntamente com Michele Pimenta e Ana Maria Guerra, coordenou este projeto e não escondia entusiasmo pela forma como o contacto decorreu. “Foi maravilhoso. Até à última da hora alguma coisa podia correr mal e não conseguirmos estabelecer a comunicação, mas assim que começámos a ouvir o astronauta a falar, para mim, foi uma sensação ótima e os alunos adoraram, acharam o projeto espetacular”, disse.
A professora de Físico-Química realça que se fala muito, atualmente, do desinteresse dos alunos pelas áreas das STEM (ciências, tecnologias, engenharias e matemática), pelo que projetos como este, que trazem para a prática estes temas, são uma mais-valia. “Estes projetos são altamente motivadores para eles. Se calhar há alguns que já queriam ser astronautas, ou queriam ir para a Engenharia Aeroespacial e, se calhar, agora ainda querem mais e isso é muito bom”, afirmou.
Esta foi uma iniciativa que partiu do radioamador caldense Eduardo Dias, no âmbito do programa Amateur Radio on the ISS (ARISS), desenvolvido com apoio da Associação Nacional de Radioamadores. Eduardo Dias explicou aos alunos a tecnologia que permite contactar a ISS via radioamador. E, no final da experiência, não escondeu também a emoção por ver o projeto concretizado.
Presente na iniciativa esteve o presidente da Câmara das Caldas da Rainha, Vítor Marques, que se dirigiu aos alunos para dizer que estavam a viver “uma oportunidade única”, que lhes permite “perceber que, no futuro, podem fazer parte destas dinâmicas”. “Estudem, trabalhem, sejam ambiciosos”, disse.
Jorge Pina, diretor do Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro, salientou o orgulho na comunidade escolar que dirige e na forma como professores e alunos agarraram esta oportunidade, acrescentando que nada melhor do que uma atividade deste género para assinalar a semana da ciência.
Toda a sessão, incluindo a comunicação com a ISS, está disponível no canal de Youtube do agrupamento. ■
As perguntas dos alunos e as respostas do astronauta Don Pettit
Qual foi o maior desafio para se tornar astronauta?
Miguel Oliveira (17 anos)
O maior desafio foi aprender a falar russo! ■
Como é que a sua família reagiu quando soube que ia para o Espaço?
Constança Prazeres (15 anos)
A minha família sabia que eu estava finalmente a cumprir um sonho de vida, por isso ficou feliz. ■
Como descreve o sentimento de ver a Terra do Espaço pela primeira vez
Rodrigo Madeira (17 anos)
[Perda de contacto]. ■
Qual é o momento mais memorável que experienciou durante uma missão espacial?
Inês Capão (17 anos)
Regressar a casa na Terra e rever a minha família! ■
Como pode a tecnologia utilizada na ISS beneficiar a vida na Terra?
João Capinha (16 anos)
Beneficia em muitas coisas. Uma delas são as ciências biológicas e a medicina, a outra é a parte física de estar no espaço. ■
O que é que se sente ao estar fora da ISS quando vão reparar alguma coisa?
Santiago Canas (17 anos)
[Perda de contacto].
A ISS é afetada por tempestades solares?
Rodrigo Campos (17 anos)
Sim, a ISS é afetada por tempestades solares, sobretudo ao nível das comunicações. ■
Quais sãos os perigos de ficar sem gravidade durante largos períodos de tempo?
Lourenço Pereira (16 anos)
Um dos problemas é que os ossos perdem densidade. O outro está relacionado com a visão, ao nível da retina. ■
Que atividades realiza durante o tempo livre na ISS?
Rita Santos (16 anos)
Durante o meu tempo livre na ISS, gosto de olhar para a Terra e tirar fotografias. ■
Como cuida da saúde mental no Espaço?
Duarte Ramos (16 anos)
Eu cuido da minha saúde mental no Espaço da mesma forma que cuido na Terra. Na Terra passo tempo com a minha família e os meus amigos. Quando se está no Espaço, convivemos com a tripulação. ■
Que experiências científicas são conduzidas a bordo da ISS?
Telmo Capitão (17 anos)
A minha experiência preferida tem a ver com a combustão e temos um conjunto de experiências fascinantes relacionadas com genética, em genomas para formas de vida microbiana. ■
Em que medida a falta de gravidade e as condições na ISS afetam as experiências científicas?
Constança Duarte (16 anos)
As descobertas científicas são algo que não sabemos até analisarmos os dados. ■
Que descobertas científicas foram possíveis pela sua estadia na ISS?
Martim Lopes (17 anos)
Algumas das descobertas estão relacionadas com forma de lidar com as bactérias, e também com a combustão. ■
O que espera das futuras missões à Lua e a Marte?
Filipe Marques (17 anos)
O que mais espero das missões à Lua e a Marte é ver os seres humanos chegar tanto à superfície da Lua, quanto à superfície de Marte e ficar lá em habitação permanente. ■
Como é que a radiação afeta o corpo humano?
Eva Raimundo (16 anos)
A radiação pode afetar os nossos corpos de várias formas. Uma deles é causar danos nos órgãos que tratam do sangue. Os níveis de radiação na estação espacial são baixos, pelo que não temos de nos preocupar com isso. ■
Em caso de doença, qual é o protocolo?
Letícia Contente (16 anos)
Temos uma capacidade médica muito substancial na estação e temos médicos em Terra. Então, se ficarmos doentes, chamamos um cirurgião de voo em Terra e ele encaminha-nos para os medicamentos e procedimentos que temos em órbita. ■
O que acontece em caso de perda de comunicações com a Terra?
Rafael Susano (17 anos)
Perdemos a comunicação com a Terra várias vezes ao dia, geralmente em intervalos curtos, por vezes de 20 minutos, por vezes de 40 minutos, e simplesmente continuamos as nossas operações sem comunicação a partir da Terra. ■
Como ajusta a rotina depois de passar vários meses no Espaço?
Maria Matias (15 anos)
Ao regressar à Terra, ajustar a rotina é habituarmo-nos à gravidade. Quando se vem da Terra para a estação espacial, ajustar a rotina é habituarmo-nos a lidar com todos os apetos de viver num ambiente sem peso. ■
O que sente mais falta da Terra?
Jaime Barata (17 anos)
O que mais sinto falta da Terra é, provavelmente, o vento na minha cara. ■
Foi um prazer comunicar e aprender consigo. Obrigado por partilhar a sua experiência. Desejamos tudo de bom na sua jornada na ISS!
Joana Santos (16 anos)
Muito obrigado e esperamos voltar um dia a realizar uma ligação via rádio amador. Foi muito agradável o contacto com os estudantes de Portugal. ■