Rosária Cruz, à esquerda, é a mais antiga vendedora da Praça da Fruta, onde se desloca há 60 anos

Caldas da Rainha pode orgulhar-se de ter o mais antigo mercado ao ar livre do país. É uma imagem de marca da cidade, mas também da região, que luta por manter uma tradição ancestral

Em março deste ano, Rosária Cruz completou seis décadas de presença na Praça da Fruta. Muita coisa mudou desde que, aos 14 anos, na companhia de uma tia, começou a fazer a viagem de duas horas, de burra, entre as Boisias e o centro da cidade das Caldas para vender a fruta que a família produz na freguesia de Alvorninha. Com grande esforço, continua a manter viva a tradição no mercado ao ar livre mais antigo do país, mas a dureza da vida leva-a a ser agreste nas palavras, porque o negócio vai mal: “No tempo da burra era melhor do que agora. A gente agora não vende nada!”
O lamento desta mulher, que antigamente acordava às 2h00 da manhã para vir para as Caldas, é sentido, mas não tem destinatário concreto. Porque, afinal, mudam-se os tempos e diminuem-se os clientes.
“Os meus avós já vinham aqui, mas isto está muito mal e tem tendência para acabar”, adverte a mais antiga vencedora da Praça da Fruta, que há cerca de 15 anos passou a ser acompanhada pela filha, Sílvia, quando deixou de poder conduzir. Como é diabética, assume que hoje vem à cidade apenas para se “distrair” e manter o contacto com os colegas e alguns clientes mais regulares.
Durante a pandemia, Rosária Cruz ainda ganhou esperança no negócio, agradada, sobretudo, com as condições da Expoeste. “Vendíamos melhor lá em baixo do que aqui e podíamos deixar a fruta de um dia para o outro, tínhamos sanitários e tudo limpinho”, sustenta a vendedora, que, bem perto da banca que possui, tem a companhia de outra cara conhecida da Praça da Fruta, onde vende “há mais de 50 anos”.
Cumprindo a rigorosa tradição familiar, Maria Cremilde Costa chega manhã cedo com o filho e parte, à tarde, com o marido. De preferência depois de vender as cebolas, favas e ervilhas que traz dos terrenos que planta no Bairro Senhora da Luz.
“Só vendo o que produzo”, garante a vendedora, de 68 anos, que no verão alarga a oferta aos clientes a produtos como o tomate, a meloa, os pimentos ou os pêssegos. Apesar da quebra do negócio, continua a deslocar-se de Óbidos “duas a três vezes por semana”. E, tal como a maioria dos comerciantes, aprecia mais a venda em determinados dias: “Às sextas e aos sábados só não venho se não puder”, assevera a obidense, que começou a vender nas Caldas com a mãe, ainda solteira. “Depois, casei e continuei a vender aqui. Toda a minha vida fiz isto”, explica a vendedora, que também vinha de burra, porque só mais tarde conseguiu ter recursos para ter transporte próprio.
A profusão de cores, cheiros e sabores da Praça da Fruta é gerada pelos vendedores de vários concelhos da região, que ali acorrem diariamente para abastecer quem vem de fora, mas sobretudo para quem vive na cidade. Como é o caso de António Maria do Rosário, que não troca o mercado por qualquer outra superfície comercial.
“Venho aqui três ou quatro vezes por semana, pois é mais em conta, os produtos são mais frescos e conhecemos as pessoas há muitos anos. Isso conta muito!”, frisa o caldense, de 78 anos, que trabalhou toda a vida na Thomaz dos Santos, “desde os 14 anos”.
Assumindo-se um orgulhoso “sócio da Gazeta, há muitos anos”, o freguês lamenta que, hoje em dia, “muitas pessoas deixem de ir ao mercado” e optem por comprar “nos supermercados”. “Não tenho nada contra, mas a Praça da Fruta é outra coisa”, completa.

Edição oferecida aos fregueses
A Praça da Fruta é uma verdadeira imagem de marca da cidade, mas luta para manter viva a tradição que a torna tão característica. Esta edição que o leitor tem nas mãos será oferecida aos clientes mais fiéis pelos vendedores, numa ação de promoção da Gazeta e da Câmara das Caldas agendada para a manhã do próximo sábado. Caro freguês, esperemos que des… frute o jornal e que continue a fazer compras neste espaço único da cidade. ■