Um roteiro imersivo pelas Caldas da Rainha

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O roteiro da Rede Cultura 20-27 aconteceu, no passado sábado, nas Caldas com uma visita guiada pelo património ligado à fundação da localidade. À tarde, após almoço de sabores locais, visitou-se ateliê de jovens autores e a loja da Bordallo Pinheiro

Foi do Largo D. Manuel I, próximo do Hospital Termal, que o grupo de dez pessoas (a pandemia não permitiu que fossem mais) iniciou o roteiro imersivo pelas Caldas, uma iniciativa da Rede Cultura 20-27 com o apoio do Município das Caldas da Rainha.
Feitas as devidas apresentações, a guia Margarida Varela, responsável pela Rota da Raynha, conduziu o grupo até à Mata para dar a conhecer ao grupo as particularidades desta cidade, fundada por uma Rainha nascida em 1458, em Beja.
D. Leonor era oriunda de uma família abastada e foi sempre criada para ser monarca. “Era rica e culta e dava-se com as cortes europeias. Mais tarde, já coroada, até vai encomendar peças a Leonardo Da Vinci”, disse a caldense Margarida Varela.
Esta visita que teve duas horas de duração, percorre a história da fundação das Caldas, com paragem em vários pontos. A cada paragem conhecem-se novas particularidades sobre a monarca que mandou construir “este hospital que vai servir de tampão à expansão dos monges de Cister que queriam estender o seu domínio”.
A ela se deve também mandar plantar a Mata que possui 17 hectares “de enorme biodiversidade de plantas e árvores e que é o pulmão da cidade”. Além do mais, tem também a função de proteção aos olhos de água termal que chega às Caldas a partir da Serra dos Candeeiros. A profundidade da água ultrapassa um quilómetro de profundidade.
As águas que curavam e tratavam do físico dos doentes, a rainha mandou também erguer a Igreja de Nossa Senhora do Pópulo, que não foi possível visitar por se encontrar em obras.
D. Leonor era aconselhada pelo cardeal Alpedrinha que tinha grande influência também em Roma.
Margarida Varela deu a conhecer que entre as regalias que eram dadas aos utentes do hospital termal – desde o máximo asseio até tratamento e alimentação cuidada individualmente – há uma norma imposta no tempo da Rainha e que ainda se encontra em vigor: quem morre no Hospital das Caldas vai diretamente para o céu. “A absolvição dos pecados ainda permanece em vigor mas outras foram revogadas pois já ninguém dá 15 arrobas de açúcar àquela unidade hospitalar tal como D. Leonor fazia”, recordou.
A visita prosseguiu com uma ida à piscina da Rainha, com a guia a partilhar que os doentes, que ficavam por norma 20 dias, tinham todos os cuidados médicos, de asseio e alimentação. “E quando saíam era-lhes dada uma ajuda financeira, importante para chegar a casa”, sublinhou a guia, que também salientou o papel de mecenas e protetora das artes.
Após uma paragem junto à fachada da Igreja do Pópulo é momento para conhecer que o corpo de Marquês de Pombal esteve nas Caldas antes de seguir para as cerimónias fúnebres na sua localidade, Pombal. Corria o ano de 1782. As cerimónias tiveram aparato nas Caldas, tendo, incluindo uma procissão nocturna.

O roteiro Águas da Raynha vai ser alargado e incluir uma proposta que inclui visita a Óbidos e que será ligada ao turismo religioso da região de Fátima

No turismo religioso de Fátima
A Rota da Raynha e das Águas já se estendeu a Óbidos, onde Margarida Varela se dedica a falar sobre a Casa das Senhoras Rainhas incidindo na Rainha D. Leonor e também salienta o percurso de Josefa de Óbidos.
Depois, a visita segue para as Caldas da Rainha para a visita histórica. “O Santuário de Fátima mostrou interesse em divulgar a nossa rota, que não se foca apenas na espiritualidade, mas também na história das localidades”, disse a responsável, contando que o contacto com Fátima ocorreu antes da pandemia e, por isso, em breve serão retomadas estas visitas que ligam Caldas e Óbidos ao turismo religioso.
Já no Museu do Hospital e das Caldas, Margarida Varela salientou a pintura de Nossa Senhora do Pópulo de Josefa de Óbidos e que tem grande importância religiosa.
A guia salientou que, dada a sua relevância e com a aproximação da realização das Jornadas Mundiais da Juventude, que contam com o apoio do Papa Francisco, “as Caldas poderiam salientar a posse desta pintura e assim atrair este turismo religioso que também se interessa pelas artes.
Margarida Varela recordou que Josefa de Óbidos”é uma pintora extraordinária que é uma das mais importantes representante do barroco português no mundo inteiro”, rematou.
Segundo a vereadora da Cultura da Câmara das Caldas da Rainha, Maria da Conceição Pereira, a autarquia colaborou com a Rede Nacional de Cultura na organização desta visita.
“Quisémos que os participantes conhecessem a nossa história, o núcleo histórico e, ainda, um pouco da cerâmica e do trabalho de autores de outras áreas”, referiu a autarca sobre a visita ao armazém, onde vários artistas e designers caldenses desenvolvem os seus trabalhos nas áreas da cutelaria, das madeiras e da cerâmica.
“Queremos aguçar o apetite dos visitantes para que possam voltar às Caldas e ter vontade de visitar esses espaços e que se interessem também pelos nossos produtos”, referiu a vereadora.
A Câmara ofereceu o almoço aos participantes, preparado pela Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste. E ao qual, apesar de ter sido tomado em jeito de piquenique, não faltaram os sabores da região. Na caixa da refeição foi possível conhecer uma sopa de pera rocha com queijo gorgonzola feito na região) e pastéis de massa folhada recheados com marisco e molho de pimentos assados.
Foram incluídas no menu perninhas de codorniz com molho especial. A fruta – abacaxi – foi acompanhada por uma redução de vinho tinto da região e a sobremesa ficou completa com uma típica trouxa de ovos e bolachas húngaras. Um pitéu de sabores oestinos.
Entre outras curiosidades, Margarida Varela partilhou com os convivas que só se faziam duas refeições nos tempos quinhentistas. O jantar por volta das 11h00 e a ceia que era servida às 18h00. “As aves eram muito apreciadas por voarem no céu e estarem mais perto de Deus”, revelou aquela apaixonada pela história local.

Sabores quinhentistas

A Rota da Raynha pode incluir uma sessão de degustação inspirada em pratos e iguarias que se comiam nesta região em 1500

Sardinhas em conserva

Sardinhas de escabeche
Sardinhas em cebolada e com vinagre. Este último ajudava a conservar o peixe

Bivalves da Lagoa

Berbigão, ameijoas e ostras
Estas últimas serviam-se no Hospital Termal nas estadias da corte

Porco Dourado

Temperado com açafrão
Dava tonalidade amarelada aos pedaços de carne

Favas com enchidos cristãos

Leguminosas eram produzidas na região
As favas eram acompanhados com chouriço feito com sangue

Pão de Lot

Feitos nos conventos tinham nomes de personagens bíblicas
Feito com maçãs, nozes, uvas passas, azeite, mel e canela

Vinho cozido

Vinho da região servia-se diluído em água
Bebida era cozida com coentros, picante, gengibre e canela

Queijo Velho

Abria ou fechava a refeição
Podia ser consumido como aperitivo ou ainda poderia fechar a refeição. Por norma era consumido queijo curado de forte sabor

Divulgar novas e antigas artes locais

Após a degustação dos sabores quinhentistas, a jovem Inês Silva fez uma apresentação sobre os Bordados das Caldas que a maioria nunca tinha ouvido falar. “Foi uma oportunidade de dar a conhecer esta arte”, disse a investigadora, premiada pelo IEFP pelo seu trabalho académico sobre os Bordados das Caldas e que continua a apostar na sua divulgação.
Também a designer caldense Joana Sousa marcou presença na iniciativa e trouxe os vários produtos da nova coleção de produtos da marca Quinze que tem por base a história e a identidade das caldense. Deu a conhecer t-shirts, sacos, almofadas e fitas únicas para o cabelo, adornadas com os pontos e formas do bordado local e que chamaram a atenção de alguns participantes da visita .

Jovens locais deram a conhecer novas aplicações do bordado local

Sónia Jorge Costa veio da Lourinhã para conhecer melhor as Caldas da Rainha. Apreciou o roteiro imersivo e considera que é importante que os municípios deste território “se possam unir e partilhar os ícones que fazem parte de cada concelho”. A participante gostou de conhecer a gastronomia de inspiração quinhentista e diz que quer regressar às Caldas “agora com um novo olhar”, rematou a visitante, que vai partilhar o que viveu com familiares e amigos.
Por seu lado Celestino Mota, de Pombal, salientou a visita ao interior do hospital termal e ao Museu do Hospital e das Caldas. Aquele participante conheceu as Caldas de outros tempos, pois foi aqui que cumpriu o serviço militar, no Regimento de Infantaria 5. Lamentou não ter visitado o interior da Igreja do Pópulo por causa da intervenção e comentou que foi surpreendido pelo valor patrimonial caldense, Celestino Mota já tinha feito o roteiro imersivo de Peniche. Marina Lopes, que vive entre Lisboa e Peniche, adorou conhecer a zona histórica caldense e destacou o facto de ter um parque “tão frondoso mesmo no centro da cidade”.
Depois das Caldas, Marina Lopes fará em breve o roteiro imersivo de Óbidos, tendo salientado como esta iniciativa da Rede de Cultura 20-27 está a permitir conhecer melhor os vários municípios que fazem parte desta região.